Por meio de uma carta intitulada “Recurso ao papa”, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) saiu em ofensiva contra o ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). No texto escrito direto do Complexo Médico-Penal em Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, onde está preso desde o dia 19 de outubro do ano passado, o ex-parlamentar diz estar sendo vítima de obstrução ao seu direito de Justiça por parte do magistrado.
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Cunha justifica que Fachin deixou de levar a julgamento pela Segunda Turma da Corte, responsável por casos da Lava Jato, pedidos de habeas corpus desde que, contra a vontade e o voto de Fachin, a turma liberou o ex-ministro chefe da Casa Civil José Dirceu, em 2 de maio deste ano. O ex-deputado afirma que, ao não pautar nenhum HC na turma, Fachin age “como uma criança que perde e leva a sua bola para casa acabando com o jogo”.
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Para ele, assim como foram concedidas liberdade a Dirceu, a irmã do senador Aécio Neves, Andrea Neves, ao ex-deputado Rocha Loures (PMDB-PR), bem como outros envolvidos, como o primo de Aécio, Frederico Pacheco, além de Mendherson Souza, assessor do senador Zezé Perrella (PMDB-MG), ele também deveria estar em liberdade. No final de junho, Fachin negou recurso no habeas corpus de Cunha, em pedido de liminar da defesa para libertar o ex-deputado.
Cunha também faz insinuações de que há ligações entre Fachin e os empresários Joesley Batista, um dos donos da JBS, e Ricardo Saud, executivo da empresa. “Quando os senhores Joesley Batista e Ricardo Saud me procuraram para ajudar na aprovação do então candidato ao STF Edson Fachin, além da relação de amizade que declararam ter com ele, me passaram a convicção de que o país iria ganhar com a atuação de um ministro que daria a assistência jurisdicional de que a sociedade necessitava”, diz o ex-deputado em trecho da nota.
Fachin, no entanto, em declarações passadas, já afirmou que sua aprovação em Sabatina no Senado não contou “com o auxílio de qualquer empresa ou grupo em seu processo de indicação”. De acordo com o magistrado, qualquer insinuação neste sentido “é inaceitável”. No documento, Cunha acusa o magistrado de favorecer os delatores da JBS. “Hoje estamos vendo que a assistência célere e eficiente foi a obtida pela JBS e seus donos, onde em apenas três dias conseguiram homologar um acordo vergonhoso, onde ficaram livres, impunes e ricos”, diz.
PublicidadeEduardo Cunha começou a negociar acordo de delação com a Procuradoria-Geral da República (PGR), mas tem tido dificuldades nas tratativas do acordo. Para os procuradores, existe falta de consistência nos relatos do ex-congressista. Por este motivo, o acordo foi suspenso. O ex-parlamentar já foi condenado a 15 anos e quatro meses de reclusão pelo juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato em Curitiba.
Leia íntegra da carta escrita por Cunha:
“Recurso ao papa
Apesar de ser evangélico e não acreditar que o papa é o representante de Deus na Terra, tenho de me render ao ditado popular e, quando não se tem mais a quem recorrer, recorra ao bispo ou ao papa. Como o papa é mais graduado, ficarei com ele.
No último dia 2 de maio, foi julgado o habeas corpus de Jose Dirceu na segunda turma do STF e contra a vontade e o voto do relator, ministro Edson Fachin, foi libertado Dirceu.
A partir desse momento, como uma criança que perde e leva a sua bola para casa acabando com o jogo, o ministro não pautou mais nenhum HC [habeas corpus] na turma. Ainda levou o HC de Palocci para o pleno do STF, sem pautá-lo, levando inclusive Palocci a impetrar um HC contra o próprio ministro Fachin pedindo julgamento.
No meu caso, houve retardamento da instrução necessária onde até o pedido de informações ao juiz de Curitiba foi feito pelo correio, ao invés do pedido eletrônico. Após essa demora, o relator ainda demorou um mês para enviar ao Ministério Público, apesar de reiteradas petições de cobrança. Mesmo após tudo isso, o HC está pronto para a pauta desde junho, a exemplo de vários outros HCs de presos da Lava Jato.
No meio do caminho, me impôs nova prisão, em decorrência da delação da JBS, sem qualquer prova da acusação feita contra mim, prisão aliás que já recorri e o relator também não pauta para deliberar.
Aliás, a acusação contra mim é de receber para ficar em silêncio para não delatar, como se delatar fosse obrigação e não delatar fosse crime.
Aliás, todos dessa operação foram soltos, incluindo a família de Aécio Neves e o ex-deputado Rocha Loures. Só eu continuo com a prisão decretada nessa operação de 18 de maio.
Só como exemplo da falta de prova, alguém ligado a mim saiu carregando alguma mala monitorada? Se até quem carregou a mala foi solto, por que continuo preso?
Quando os senhores Joesley Batista e Ricardo Saud me procuraram para ajudar na aprovação do então candidato ao STF Edson Fachin, além da relação de amizade que declararam ter com ele, me passaram a convicção de que o país iria ganhar com a atuação de um ministro que daria a assistência jurisdicional de que a sociedade necessitava.
Hoje estamos vendo que a assistência célere e eficiente foi a obtida pela JBS e seus donos, onde em apenas três dias conseguiram homologar um acordo vergonhoso, onde ficaram livres, impunes e ricos.
O que eu gostaria, assim como os demais presos preventivos de forma alongada, é ter o direito ao julgamento e não ser vítima de uma obstrução da Justiça a que todos os brasileiros têm direito. Não podemos ficar reféns de uma ditadura da República de Curitiba, do estado do ministro.
Por isso, para além de uma dúvida razoável e em cognição sumária, recorro ao papa para ser julgado.”
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