Bezerra Couto |
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Dos outros dois irmãos, um – neoliberal até dizer chega – é economista de uma famosa consultoria de São Paulo e o outro, técnico em telecomunicações e petista de carteirinha. Os dois não se bicam. Eu poderia me apresentar como, sei lá, um empreendedor simpático ao ideário anarquista. Quero as benesses do capitalismo, mas ao mesmo tempo me incomoda ver de dentro de um restaurante caro gente do lado de fora pedindo esmola ou comida. Quero ter a liberdade que o capitalismo proporciona aos fuçadores de oportunidades, mas também quero um BC menos monetarista, banqueiros menos ricos, trabalhadores mais felizes e endinheirados. Minha família, amiga e amigo, é um saco de gatos. Um depositário imenso de estranhezas, ressentimentos, gritos reprimidos, dificuldades para falar a mesma língua. Sob a batuta de mamãe, no entanto, a gente parece se dar bem pra caramba. Natal na casa da velha é mais divertido que em qualquer outro canto onde festejei o aniversário de Cristo – e olha que sou rodado nisso, hein! Tantas ex-namoradas e ex-sogros que acompanhei, na referida data santa. Tantas cidades por onde andei. Tantos presépios que conheci… No presépio da Câmara, abusam demais da vaca. Veja a lista dos deputados processados, aqui mesmo neste Congresso em Foco, pra ter uma noção da ficha dos camaradas que circulam por ali. E como brigam! Por cargos, por verbas, por espaço na imprensa, por mais cargos e verbas… Na chamada Casa do Povo, mantido o jogo como é jogado hoje, vencerá a eleição quem for mais eficiente na batalha do fisiologismo e da cooptação. Em resumo, o mais malandro. Corte rápido de tonalidades glauberianas. Dois colunistas merecem ser citados aqui: o antropólogo Roberto da Matta, especialista-mor na malandragem pátria, que acaba de ganhar espaço fixo no Globo (salve, salve!); o outro, o saudoso Zózimo, de cuja pena saiu uma das melhores e mais concisas definições de Fernando Henrique Cardoso – “é um malandro carioca com pinta de professor da Sorbonne”. Voltando à Câmara. Fosse lá em casa, mamãe já teria dado graça e racionalidade àquela indecente bagunça. Ela faz a torre de Babel funcionar. Uma musiquinha pra tocar ali, uma cervejinha na mão aqui, e sem mais nem menos estão todos dançando, compartilhando beijos e abraços, dominados pela silenciosa convicção de que vida não é algo pra ser levado tão a sério. É coisa pra se desfrutar, sempre que possível, que no mais das vezes a gente tá mesmo é fazendo o que não quer, mas precisa ser feito (trabalhar em dias de sol, cuidar do licenciamento do carro, cumprir obrigações burocráticas…), e domando frustrações por horas perdidas, sonhos desfeitos, projetos naufragados. Com sua habilidade e vocação para impor a ordem com suavidade, Dona Rosa botaria pra quebrar. Aquela engrenagem, com certeza, andaria pra frente. Não tenho dúvidas de que ela também contribuiria para deixar mais nítidas as qualidades dos (poucos) deputados do bem e pra tirar delicadamente a máscara dos (muitos) parlamentares parasitas. Tem um problema. Aliás, dois. Já citei o primeiro: ela não é deputada. Relato agora o segundo. Pensei, seriamente, em propor a Dona Rosa uma candidatura para a Câmara em 2006. Ela é super conhecida. Trabalhou no Ministério da Educação 38 anos, até se aposentar. Depois advogou cobrando pouco ou nada de muita gente que lhe é imensamente grata. Dirige uma ONG voltada para o que ela chama de “melhor idade”, atividade que amplia consideravelmente sua rede de relacionamentos. Como atestam ministros, ex-chefes e ex-subordinados, tem um passado marcado pela honestidade pessoal e pela competência profissional. Com isso na cabeça e um vidro de doce de abóbora em calda na mão, fui visitá-la para conversar a respeito. Minha tentativa durou exatamente dois minutos. Aí tive de atender ao pedido dela para me calar e acompanhar o objeto maior das suas atenções naquele momento: a definição do novo eliminado do Big Brother Brasil, se Jean ou Marcos. Entrei na onda. Quando o Pedro Bial anunciou o fim do programa, eu e Dona Rosa comemorávamos mais uma emocionante vitória do baiano Jean no mortal “paredão”. Saí da casa dela sem nenhum nome para a presidência da Câmara, mas fechadíssimo com um candidato para ganhar aquele milhão do BBB. |