O brasileiro precisa ficar mais atento antes de fazer dívidas. Créditos para compras de carro e financiamento da casa própria a longo prazo ou ainda empréstimos com prestações e taxas de juros a perder de vista terão que ser muito bem avaliados antes de saírem do papel. O alerta é do economista Roberto Piscitelli, ex-presidente do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF). Ele acredita o momento exige "muito cuidado".
Sob reflexo da crise que assola a economia americana, Piscitelli acredita que o Brasil não está imune às conseqüências de um possível colapso do mercado mundial. "É preciso ter cuidado. Evitar dívidas em longos prazos e ter mais rigor nas compras, sendo mais seletivo e utilizando mais o poder de barganha", alerta. "E para os que estão endividados, o melhor é quitar logo as dívidas. Serão tempos de mais austeridade", enfatiza.
Piscitelli explica que, com a instabilidade do mercado econômico mundial, os recursos financeiros vindos do exterior, responsáveis por financiar boa parte dos empréstimos no Brasil, devem diminuir, restringindo o acesso aos créditos.
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"Há um fechamento da torneira de fluxos externos de recursos que alimentam os bancos que fazem os créditos. E isso vai ficar muito claro para a pessoa física, especialmente classe média e média-baixa", avalia. "Essas pessoas melhoraram de vida por conta desses créditos e agora serão exigidas garantias mais rígidas para concessão de empréstimos", explica.
Aumento de preços
O aumento no preço dos produtos importados e a baixa nas exportações serão outras duas conseqüências trazidas pelos reflexos da crise americana. Essa é a avaliação do economista Newton Marques, doutor em Economia pela Universidade Federal de Pernambuco.
Para ele, o atual cenário é incerto e os resultados dessa crise – considerada por ele a mais grave desde a Quebra da Bolsa de Nova Iorque em 1929, o pior e mais longo período de recessão econômica do século XX – devem trazer impactos negativos e positivos.
"Como atravessamos um ciclo longo de crescimento, vamos ter uma recessão. A tendência é diminuir a atividade econômica e aumentar o desemprego. Mas, como falei, o resultado é incerto, porque vai depender do que vai acontecer com os outros países", analisa.
Em relação à crise de alimentos, Marques acredita que, se o período for de recessão na economia mundial, poderá haver a frustração de safras agrícolas. "Se a Europa entra em recessão, por exemplo, os produtores vão vender para quem?", questiona.
Com os dias contados
Apesar de uma onda de pessimismo – ou realismo, como alguns preferem tratar – entre os economistas, o governo brasileiro tem tratado a crise na economia mundial com otimismo. Na semana passada, o ministro da Fazenda Guido Mantega anunciou que o Brasil deverá crescer 4,5% em 2009, índice que superará a média de crescimento médio mundial, estimado entre 2,5% e 3%.
Segundo Mantega, no próximo ano, o mundo estará dividido em dois grupos. "Um, dos países que deram uma forte resposta à crise no crédito e outro, com uma resposta fraca." O Brasil, de acordo com o ministro, estará entre os mais fortes.
"Não teria como o governo agir diferente. Se você for comerciante e seu negócio não vai bem, você não vai sair dizendo que seu comércio está mal. Isso vai espantar as pessoas. O governo tem que fazer isso mesmo, ser otimista", avalia Marques.
"Só que o presidente Lula está sendo mal assessorado, pois ele fala como se a gente não dependesse do exterior. A gente depende do exterior", pondera.
O forte crescimento econômico brasileiro, que tem puxado para cima os índices de popularidade do presidente Lula, pode, no entanto, estar com os dias contados na visão dos economistas entrevistados pelo site. Eles prevêem uma desaceleração no crescimento e uma possível recessão (taxa negativa de crescimento).
Para Piscitelli, o Brasil vai exportar menos, o que irá refletir na queda do nível de emprego. "Não vamos ter mais essa geração líquida de empregos. Não é plausível supor que a economia vai crescer como vem crescendo. A fase da bonança se sucederá à fase de dificuldades", concluiu. (Renata Camargo)