Um dia após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de afastar o senador Aécio Neves (PSDB-MG) do mandato e determinar que ele fique recolhido em casa no período da noite, o Senado, que ainda não foi notificado, discute a possibilidade de rever a imposição da Corte sob a alegação de que a Constituição prevê que a palavra final sobre prisão de senadores seja dada pelo plenário da Casa. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Edison Lobão (PMDB-AL), disse que foi informado de que o presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-AL), vai pedir ajuda do colegiado para decidir o caso.
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“A notícia que me chegou é que o presidente [Eunício] não pretende decidir sozinho e nem mesmo com o plenário. Ele pretende ouvir as ponderações jurídicas da CCJ. Se o fizer, eu distribuirei a um relator e nós vamos debater na comissão devolvendo em segui da o que for decidido ao plenário do Senado”, afirmou. De acordo com ele, a situação exigirá a convocação de uma sessão extra para debater o tema.
Questionado sobre sua posição sobre a interferência do Senado no assunto, Lobão preferiu não se manifestar, já que com sua posição de presidente na CCJ, poderá desempatar possível votação. “Quando dá empate eu tenho que desempatar. Poderia opinar como senador, mas sucede que eu não me desvinculo ainda assim da posição de presidente”, ressaltou.
Mais cedo, Eunício disse que o Senado tomaria providências. “Se a Constituição foi ferida pela decisão e cabe ao Senado tomar a decisão, baseado na Constituição, obviamente que o Senado vai tomar as providências. Agora, sobre hipóteses, eu não tenho como me manifestar”, declarou.
Na mira do Supremo, respondendo a três inquéritos na Corte, o senador Benedito de Lira (PP-AL) defendeu que o Senado decida o futuro do senador tucano. “Precisa [interferir] sim, porque ele tem a determinação de prisão domiciliar. Se está preso domiciliarmente não pode sair para lugar nenhum. O plenário deve sim se manifestar sobre o assunto”, disse o senador ao Congresso em Foco.
PublicidadeSobre o trâmite, ele acredita que pode ser diferente de quando a Casa decidiu referendar a decisão do Supremo no caso do ex-senador Delcídio do Amaral, preso por obstrução de Justiça em novembro de 2015 por decisão da Corte. “O Delcídio foi preso devido sua liberdade de locomoção. O Aécio é um afastamento com prisão noturna. Vamos ver o que a área jurídica do Senado vai decidir”, acrescentou.
Um dos integrantes da CCJ, Magno Malta (PR-ES) criticou a decisão da STF e afirmou que o ministro Luiz Fux inovou ao utilizar o termo “recolhimento noturna”. “Não sou advogado do Aécio. Até fiz um vídeo quando saiu a gravação dele. Mas precisamos ter senso de justiça. Aquela gravação (do Joesley) valeu para trazer ele do exílio novaiorquino. Não há crime continuado. O ministro Fux inventou termo (recolhimento noturno) para não falar de prisão domiciliar. O que adianta fazer lei se o Judiciário não cumpre, não respeita. Adianta fazer lei forte?”
Senado constrangido
Ao contrário do que tem defendido muitos petistas, o senador Paulo Paim (RS) criticou interferência do Senado na decisão do Supremo. “Eu acho que é um tema polêmico e delicado. Eu tinha aprendido ao longo da minha vida que decisão do Supremo a gente cumpre. Agora. Se levarem essa questão para o plenários erá uma situação de constrangimento para os senadores”. De acordo com ele, caso o Senado decida contrário à Corte, a Casa ficará em maus lençóis.
“Não é uma prisão no cárcere. Como que você faz? Antes, uma pena muito mais dura, você referendou a decisão do Supremo. Agora, uma pena mais leve, você vai revogar? Eu estou apenas dizendo porque é uma situação de enorme constrangimento, pelo menos para mim. Desnecessária. Se o senado resolver rever, deveria então olhar e mandar rever a questão do Delcídio. É questão de coerência”, ponderou.
“Eu me dou muito bem com todos os senadores. Me dava muito bem com Delcídio e me dou muito bem com Aécio. Só que acho que é uma decisão que vai embolar o meio de campo”, declarou Paim ao Congresso em Foco.
Entenda o caso
Ontem (terça-feira, 26), a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por três votos a dois, o afastamento do senador Aécio Neves (PSDB-MG) de suas atividades parlamentares. O colegiado também negou, por unanimidade, a prisão do parlamentar mineiro, gravado pedindo R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, dono da Holding J&F. Mesmo tendo negado a reclusão, os ministros impuseram recolhimento noturno a Aécio.
Com a decisão, foram restabelecidas as medidas cautelares que haviam sido impostas, em maio deste ano, pelo relator original da ação, ministro Edson Fachin. Na ocasião, ele considerou presentes indícios da prática dos crimes decorrentes do acordo de delação premiada firmado entre pessoas ligadas ao Grupo J&F e o Ministério Público Federal.
Em junho, no entanto, após agravos regimentais apresentados pelo senador, o ministro Marco Aurélio, novo relator do processo, reconsiderou a decisão e restabeleceu o mandato do senador. Na decisão de ontem, Marco Aurélio votou pelo indeferimento do pedido de reconsideração apresentado em agravo pela PGR e foi acompanhado pelo ministro Alexandre de Moraes.
O ministro Luís Roberto Barroso, seguido pela ministra Rosa Weber e pelo ministro Luiz Fux, votaram no sentido de acolher parcialmente o pedido da PGR para restabelecer as cautelares determinadas pelo relator original do processo: suspensão do exercício das funções parlamentares, proibição de contatar outros investigados por qualquer meio, além da proibição de se ausentar do país, com entrega de passaporte.
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