Em artigo publicado em seu blog, Pomar criticou a postura os senadores petistas que votaram pelo relaxamento da prisão de Delcídio e apoiou a nota assinada pelo presidente do partido, Rui Falcão, que negou solidariedade ao ex-líder do governo. O dirigente, porém, fez apenas uma ressalva em relação ao texto de Falcão: ao contrário do colega, não ficou “perplexo” com os fatos que levaram à prisão do sul-mato-grossense.
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“Nós sabíamos quem ele era, acompanhamos sua trajetória pública desde então e por isto não estamos perplexos”, escreveu Pomar. Segundo ele, a Articulação de Esquerda recorreu no diretório municipal, de Campo Grande, contra a filiação de Delcídio, egresso então do PSDB. Sem sucesso, o grupo contestou o processo no diretório estadual. Novamente derrotado, apelou ao diretório nacional – mais uma vez sem êxito. Em 2002, Delcídio acabou se elegendo senador pelo PT.
Embora não fosse um petista histórico, acabou se destacando logo de início. Já em seus primeiros anos de mandato, tornou-se líder da bancada. Em 2005 presidiu a CPI dos Correios, que investigou o mensalão. Desde abril era o líder do governo no Senado. O senador era conhecido pelo ótimo trânsito que tinha em todos os partidos.
No texto, que será apresentado este fim de semana à direção nacional da tendência petista, Valter Pomar diz que a maioria da bancada do PT errou ao tentar libertar Delcídio porque o senador “traiu” a confiança do governo, do partido e do eleitorado.
“Somos de opinião que a maioria da bancada do PT no Senado Federal errou. Ao Partido dos Trabalhadores e ao governo Dilma interessa separar o joio do trigo. E o fato é que o Senador Delcídio Amaral traiu a confiança do governo, traiu a confiança do PT, traiu a confiança do eleitorado popular”, ressaltou.
PublicidadePara ele, não há como Delcídio se defender das acusações de tentar obstruir as investigações da Operação Lava Jato. “Está provado que o senador usava o cargo para tentar cometer um crime, em benefício próprio e em prejuízo dos interesses do Brasil, do governo e do próprio PT, que seriam inevitavelmente acusados de estarem por trás da eventual fuga do criminoso que Delcídio Amaral queria impedir de colaborar com a Justiça.”
Segundo o dirigente, setores do partido se renderam ao “pragmatismo” e ao “oportunismo”. “O caso de Delcídio Amaral, assim como os de André Vargas e Candido Vaccarezza, são sintomáticos da falta de critério, da falta de vigilância, da falta de limites, do oportunismo e do pragmatismo que predominam em certos setores do partido”, afirmou, referindo-se aos dois ex-deputados petistas. Vargas, que está preso e foi expulso do PT, e Vaccarezza também são investigados na Lava Jato.
Valter Pomar foi secretário-executivo e vice-presidente do PT e do Foro de São Paulo. É historiador formado pela USP, mestre e doutor em História Econômica. Sua tese de doutorado foi “A Metamorfose – Programa e estratégia política do Partido dos Trabalhadores: 1980-2005”.
Leia a íntegra do texto de Pomar:
“O PT deve expulsar Delcídio Amaral?
(texto que será apresentado para debate na reunião da direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda, que ocorrerá nos dias 28 e 29/11/2015)
1.O Supremo Tribunal Federal determinou a prisão preventiva do Senador Delcídio Amaral (PT-MS), basicamente sob a acusação de tentativa de obstrução da Justiça, configurando flagrante delito.
2.O Supremo Tribunal Federal tomou esta decisão com base em gravações de diálogos mantidos pelo Senador com outras pessoas, algumas das quais também foram presas. Não se conhece ninguém que questione a autenticidade e legalidade das referidas gravações, nem tampouco a gravidade do que ali é dito.
3.O Senado Federal decidiu, em votação realizada depois da prisão, validar a prisão. A maior parte da bancada do PT votou contra, argumentando que não estaria sendo respeitado aquilo que a Constituição prevê como condição para a prisão de um mandatário popular.
4.Não se trata de um tema simples, envolvendo desde interpretações da Constituição até a análise do significado político da prisão do líder do governo Dilma no Senado Federal.
5.Isto posto e por isto mesmo, somos de opinião que a maioria da bancada do PT no Senado Federal errou. Ao Partido dos Trabalhadores e ao Governo Dilma interessa separar o joio do trigo. E o fato é que o Senador Delcídio Amaral traiu a confiança do governo, traiu a confiança do PT, traiu a confiança do eleitorado popular.
6. É verdade que o STF aplica, contra petistas e filiados ao PT, um rigor que não adota quando se trata de filiados a partidos de centro-direita. Exemplo disto é o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB), que até este momento segue solto. Entretanto, não é de esquerda a tese segundo a qual enquanto não restaura-se a moralidade, locupletar-se é permitido. Está provado que o Senador usava o cargo para tentar cometer um crime, em benefício próprio e em prejuízo dos interesses do Brasil, do governo e do próprio PT, que seriam inevitavelmente acusados de estarem por trás da eventual fuga do criminoso que Delcídio Amaral queria impedir de colaborar com a Justiça.
7.Por tudo isto, a bancada do PT no Senado deveria ter votado a favor de chancelar a prisão preventiva determinada pelo STF. E com muito mais motivos — pois neste caso não está em jogo uma interpretação da Constituição, mas sim o estatuto e o código de ética do Partido– , a Comissão Executiva Nacional do PT deve abrir imediatamente um processo disciplinar contra o senador, reafirmando o caráter pessoal e anti-partidário de suas ações e sinalizando explicitamente a disposição de expulsá-lo do Partido.
8.O presidente nacional do PT, companheiro Rui Falcão, divulgou uma nota na qual declara perplexidade com a atitude do Senador. Apoiamos o presidente do Partido em sua atitude de não prestar solidariedade a Delcídio Amaral, mas não compartilhamos de sua perplexidade.
9.Registre-se que quando Delcídio Amaral pediu filiação ao PT, nós da tendência petista Articulação de Esquerda recorremos contra no seu diretório municipal. Derrotados, impugnamos a filiação no Diretório estadual do PT-MS. Derrotados, questionamos a filiação junto ao Diretório Nacional. Nós sabíamos quem ele era, acompanhamos sua trajetória pública desde então e por isto não estamos perplexos.
10.Não é necessário lembrar agora, quem patrocinou, apoiou, deu os votos necessários ou simplesmente lavou as mãos, permitindo por ação ou omissão a filiação de Delcídio Amaral.
11.Mas aquele erro está na origem do que ocorre agora, quando o conjunto do Partido sofre os efeitos da filiação de alguém que nunca teve qualquer passado de esquerda. E que em diversas oportunidades — por exemplo na CPI dos Correios, no processo do chamado mensalão, na discussão do regime de partilha do petróleo, nos temas indígenas etc.– demonstrou ter uma mentalidade empresarial e tucana, traindo inclusive aqueles que estimularam sua filiação ao PT.
12. O caso de Delcídio Amaral, assim como os de André Vargas e Candido Vaccarezza, são sintomáticos da falta de critério, da falta de vigilância, da falta de limites, do oportunismo e do pragmatismo que predominam em certos setores do Partido.
13.Se quiser sobreviver ao cerco da direita, o PT não precisa apenas mudar de política, precisa também mudar de comportamento. O que significa, em casos como este, que precisamos depurar. Por tudo isto, o PT deve expulsar Delcídio Amaral.”