Edson Sardinha
A presidente eleita, Dilma Rousseff, disse hoje que estuda adotar um mecanismo de compensação para evitar perdas no salário mínimo em decorrência da estagnação da economia no ano passado. Em entrevista coletiva no Palácio do Planalto, a petista afirmou que o salário mínimo deve ultrapassar a barreira dos R$ 600 – valor prometido por seu adversário no segundo turno, José Serra (PSDB) – até o início de 2012. O benefício hoje é de R$ 510. “Adianto a vocês que, num cenário de PIB crescendo a taxas que esperamos, vamos ter salário bem acima de R$ 700 reais em 2014. Já em 2011, estaria acima de R$ 600, no final de 2011, início de 2012″, declarou.
Dilma defendeu o atual critério de correção do salário mínimo, que prevê a reposição da inflação do ano anterior mais a variação do PIB de dois anos antes. No ano passado, não houve crescimento do Produto Interno Bruto brasileiro em razão da crise econômica internacional. “No salário mínimo, temos um critério que considero muito bom, baseado na inflação e no PIB. Temos o problema que o PIB de 2009 se aproxima do zero, até um pouco menos de zero. O Brasil teve uma recuperação muito forte, então estamos avaliando se é possível fazer essa compensação”, declarou.
Na entrevista coletiva, concedida logo após o pronunciamento do presidente Lula, Dilma disse que não pretende enviar ao Congresso proposta recriando a CPMF, derrubada pelo Congresso no final de 2007. A presidente eleita admitiu, no entanto, que há um movimento por parte de governadores cobrando mais recursos para a saúde, área diretamente prejudicada com a extinção da contribuição sobre movimentação financeira.
“Tenho muita preocupação com a criação de imposto. Preferia que a gente tivesse outros mecanismos. Tenho visto mobilização dos governadores nessa direção, não posso fingir que não vi”, afirmou. “Do ponto de vista do governo federal, não é necessidade premente. Do ponto de vista dos governadores, sei que há esse processo. Não posso ir além disso”, acrescentou a presidente.
Veja alguns das principais declarações de Dilma durante a entrevista coletiva:
Saúde e segurança pública
“Duas áreas terão grande destaque no meu governo: saúde e segurança pública. A educação está muito bem encaminhada. O empenho maior será em complementar toda a rede do SUS. Está em questão a regulamentação da Emenda 29. Para a União é mais fácil, para os estados e os municípios, é mais difícil. No caso da segurança pública, vamos ter de discutir recursos significativos. Não é possível resolver questão de envergadura nacional sem cooperação entre estado, município e União.”
Definição do ministério
“Não tenho nenhum nome e não cometeria a temeridade de lançar nomes individuais. Não quero fazer anúncio fragmentado.” “Não estou falando agora sobre continuidade de nenhum ministério, do ponto de vista das pessoas, mas das políticas. Não considero que ainda está maduro o processo de discussão dos nomes que integrarão o primeiro escalão da alta administração. Vou exigir competência técnica, um desempenho, um histórico de pessoas que não tenham problemas de nenhuma ordem, e considero importante também o critério político.” “Os ministros têm de ser competentes, não sombra.”
Aliança com o PMDB
“Tenho conversado muito com o Temer, e nós temos formado uma grande convicção: este é um governo que vai se pautar não por partilha, mas por processo de construção de equipe una. Tenho visto por parte do PMDB iniciativa favorável a essa concepção. Nunca o PMDB me propôs pedido de cargo. Até agora, eles estão participando sem conflito, extremamente participativos. A liderança do Temer é muito importante para que haja esse enfoque.
Pré-sal
“A questão é delicada agora e depois. A questão do pré-sal está na pauta agora. Qualquer outra avaliação, estaria atravessando dois meses. Essa pauta está para ser discutida no Congresso agora. Aguardemos o que vai acontecer. Não posso atravessar esse momento que existe, porque tem um governo e um Congresso no exercício pleno de sua atividade. Quando encerrarem as atividades do governo e do Congresso, o que restar será avaliado. Não tem como ser de outra forma.”
Trem-bala
“É absurdo achar que o trem-bala não precisa ser feito. Nos anos 80, essa conversa era pra metrô. Diziam que o Brasil não podia gastar com metrô porque era muito caro e tinha alternativas como os corredores de ônibus. Num país continental, com grande densidade populacional no Sul e no Sudeste, é um absurdo usar políticas obscurantistas. Trem-bala é feito pela iniciativa privada, não concorre com metrô. Razão técnica não falta. Trem-bala não concorre com recursos públicos.”
Bolsa Família
“Tenho o objetivo de assegurar cada vez mais que a cobertura às famílias do Bolsa Família chegue a 100%. Vou buscar esses 100% e um nível maior de benefício que o país pode dar a esse conjunto de famílias. Não sei qual será hoje esse reajuste, mas que terá, terá.”
Direitos humanos
“Tenho posição bastante intransigente em relação aos direitos humanos. Essa posição se reflete na democracia de opção clara por manifestação que conduza a melhoria dos direitos humanos. Para conseguir melhoras, você precisa negociar. Não concordo, vi vários movimentos que foram benéficos.”
MST
“Em relação ao MST, sempre me neguei a tratar o MST como caso de polícia. Não darei margem para Eldorado dos Carajás, porque isso é questão de direitos humanos. Não compactuo com ilegalidade, nem com invasão de prédios públicos, nem de propriedades que estão sendo administradas. Temos terra suficiente para continuar fazendo reforma agrária.”
Guerra cambial
“Todos os países que não são China e EUA percebem que há uma guerra cambial. Para esses casos, não há solução individual.”
Conquista de uma geração
“Coisas que todos nós hoje achamos hoje absolutamente naturais não eram naturais quando eu cheguei, aos 16 anos, essa geração sofreu uma restrição terrível, a restrição do caminho. O caminho da gente era encurtado, você tinha um horizonte pequeno. Nós lutamos com a cabeça e as condições que a gente tinha. Se a gente cometeu erro ou não, a história dirá. Eu acho que a gente não tinha a menor chance de ganhar. Do meu ponto de vista, essa geração também teve outro mérito, participou da luta da redemocratização do primeiro ao último dia. Nesse processo, ela transformou o Brasil e se transformou. É momento importante para essa geração perceber que só na democracia que uma pessoa daquela geração, sobretudo mulher, pode chegar à Presidência da República.”
Descanso e trabalho
“Eu já volto a trabalhar na segunda-feira. Depois, viajo. Quero assegurar que meus dias de descanso vou aproveitar bem, porque a partir daí sei que é trabalho, trabalho, trabalho, inclusive no fim de semana.”
Leia ainda:
Lula: ”Governo tem de ser a cara da Dilma”
Lula: buscar novo mandato seria “temeridade”
Leia também