Lucas Ferraz
A idéia inicial era o mês de maio, mas ela só foi entrar na pauta no mês seguinte. Primeiro, a Câmara prometeu votá-la há duas semanas, no dia 13 de junho. Depois, ficou para o dia 20, na semana passada. Agora, Arlindo Chinaglia (PT-SP), presidente da Casa, afirma que de quarta-feira (dia 27) não passa. A tão falada reforma política tem seguido esse roteiro há pelo menos uma década.
A votação da reforma foi adiada, entre outros motivos, pela falta de consenso sobre o projeto relatado pelo deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO). Nele está previsto um dos mais polêmicos itens, o voto em lista fechada, que o relator considera sua “espinha dorsal”, ao lado do financiamento público de campanha.
Ficou claro, no entanto, que o Plenário não aprovaria esse ponto, principalmente os deputados dos pequenos e médios partidos. A rejeição veio até de alguns integrantes do PT, que se rebelaram contra a determinação do partido de fechar questão sobre o tema. A solução foi flexibilizar a lista, idéia que inicialmente parecia complexa demais, mas que logo encontrou um ponto comum.
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O DEM, PMDB, PCdoB, parte do PSB, além do próprio PT, formaram um chamado “aglutinativo global”, que nada mais é do que uma espécie de projeto alternativo, que aproveitou basicamente 80% do conteúdo do texto original de Ronaldo Caiado. A diferença está exatamente na lista flexível, que os parlamentares apelidaram de “lista flex”.
“É um projeto pirateado. Eles conseguiram fazer no texto algo pior que o atual sistema, algo que eu não imaginava”, diz Caiado. Na tal lista flex, o eleitor votaria duas vezes: primeiro, em um partido, que determinará a lista com os candidatos nas eleições proporcionais (deputados e vereadores) e a ordem dos nomes; depois, abrirá uma segunda tela, onde o eleitor poderá reordenar o nome do candidato na lista.
Lista flex com financiamento público
O que Caiado considera pior nesse sistema é que, pela proposta, será mantido o financiamento público de campanha exclusivo. Segundo ele, isso não seria possível na lista flexível. “É a mesma coisa que ser escalado para jogar futebol e não poder tocar na bola”, compara, argumentando que não será possível impedir o uso do caixa dois, já que ainda haverá competição entre os candidatos.
O “aglutinativo global” surgiu das quase 350 emendas apresentadas ao projeto em duas semanas – o relator Caiado estuda ainda quais serão incorporadas ao seu projeto. O texto alternativo surgiu exatamente do número 345, e a tendência é que ele seja votado primeiro que o projeto do deputado goiano. Mas, para isso, precisará ser aprovado um parecer pela preferência.
“Quase revolução”
Um dos vice-líderes do governo, Henrique Fontana (PT-RS), defensor do voto em lista fechada, se tornou um dos maiores articuladores da lista flex depois de a primeira opção ter sido enterrada. Ele classifica de “incompreensível” a posição de Caiado e defende o novo modelo, o qual considera uma “quase revolução”, como um meio para acabar com o personalismo que há atualmente nas eleições proporcionais.
Como uma das medidas de melhoria, Fontana cita o fim do material individual de campanha – “ele terá que ser partidário” – e o fortalecimento “programático dos partidos”. “Além de que, com o financiamento público, se diminui a força do poder econômico nas eleições”, explica.
Henrique Fontana concorda que existirá, se aprovado o texto alternativo, a possibilidade do uso de caixa dois nas campanhas, principalmente porque os candidatos continuarão a concorrer com outros. No entanto, o petista diz que essa disputa será “atenuada”.
Independente do projeto, a Mesa Diretora quer votar a reforma política esta semana. Chinaglia está preocupado com a imagem da Câmara, receoso dela sofrer um processo de desgaste se o projeto naufragar.
Uma antiga frase do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), contudo, reflete bem o clima no Congresso nestas semanas de discussão sobre o assunto: “Não há um deputado ou senador que seja contra a reforma. O problema é que cada um é a favor da sua reforma política”.