Eduardo Militão
Propostas que restringem o consumo e a publicidade das bebidas alcoólicas, como as enviadas semana passada pelo governo ao Congresso, dormitam no Parlamento há pelo menos 14 anos. Desde 1947, mais de 500 projetos de lei que se referem à indústria de bebidas foram apresentados na Câmara e no Senado.
A maior parte dessas proposições tenta fechar o cerco contra o setor. Elas prevêem mais impostos, menos propagandas, publicação de advertências contra os malefícios causados pelo álcool no organismo humano e imposição de restrições ao consumo.
Uma das iniciativas mais curiosas sobre bebidas alcoólicas é o PL 2176/2007, do deputado Jurandy Loureiro (PSC-ES). O texto obriga os automóveis a saírem de fábrica com um dispositivo sensor de ar alveolar, o chamado bafômetro passivo.
Nariz eletrônico
O “nariz eletrônico”, como define o próprio autor do projeto, detecta o ar do ambiente do carro. Identificada a presença de álcool, a ignição do automóvel é travada. Jurandy disse ao Congresso em Foco que não é possível enganar o sistema, fazendo, por exemplo, com que uma pessoa sóbria dê a partida para depois o real condutor assumir o volante.
Leia também
“O sistema é acionado e, durante todo o trajeto, ele fica ligado. Se em algum momento ele detectar que o motorista está dirigindo com o teor alcoólico acima do permitido, ele trava. Dessa forma, impede qualquer pessoa alcoolizada dirigir”, afirmou.
De acordo com o parlamentar, o equipamento já tem sido adotado em alguns países, como Inglaterra e Estados Unidos, para reduzir os acidentes de trânsito. “Já que não podemos impedir motoristas embriagados de sair dirigindo por aí, vamos então impedir os carros de circular com motoristas alcoolizados”, disse Jurandy, na justificativa do projeto. “Precisamos adotar medidas de ‘tolerância zero para os motoristas que dirigem embriagados’, e isso, com urgência.”
Custo ignorado
O deputado ignora o custo do bafômetro passivo, mas acredita que o novo equipamento não pesará no bolso do consumidor brasileiro. “Acho que quem está comprando um carro zero tem condições de pagar um acessório, pois esse pode estar salvando vidas”, considera.
Estimativas do governo indicam que cerca de 150 mil brasileiros dirigem embriagados todos os dias país afora. Resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) em vigor desde 2006 determina que o condutor que for parado em suspeita de embriaguez e recusar o teste do bafômetro seja multado em R$ 957,69. Além disso, atualmente, o motorista pode ter a carteira de habilitação apreendida.
O Projeto de Lei 2176/2007 está na Comissão de Viação de Transportes, onde é relatado pelo deputado Hugo Leal (PSC-RJ). Nenhuma emenda foi apresentada à proposta.
Idéia pioneira
Eleita como prioridade para 2008 pelo ministro da Saúde, José Gomes Temporão, a batalha pela redução do consumo de álcool terá, em breve, dois capítulos no Congresso: a votação da MP que proíbe a venda de bebidas alcoólicas nas estradas e do projeto de lei que veda a publicidade de cerveja, no rádio e na TV, entre as 6h e as 21h. O PL 2733/2008 tramita em regime de urgência e terá de ser examinado pelos parlamentares já no início dos trabalhos legislativos deste ano.
Desde 1994, tramita na Câmara o PL 4846/94, que contém pontos em comum com essas duas propostas do governo. De lá pra cá, porém, a proposição não avançou.
O projeto foi desarquivado no ano passado e ganhou uma comissão especial para analisá-lo, também a cargo de Hugo Leal. O projeto de lei proíbe a venda de bebida alcoólica nos estádios de futebol e só permite a publicidade desses produtos após as 22h.
A ela, somou-se mais uma centena de proposições em tramitação na Casa, todas com o objetivo de fechar o cerco contra a indústria da bebida. O autor do PL 4846 é o ex-deputado Francisco Silva, que hoje, aos 69 anos, se dedica a dirigir uma rádio evangélica no Rio de Janeiro.
O ex-deputado disse ter ficado triste ao constatar que sua proposta não saiu do lugar. “Para você ver o que vale um deputado. A gente luta, luta e não consegue aprovar. Vem o governo e faz uma medida provisória sobre o assunto. Nesse sentido, pode fechar o Congresso”, desabafa Francisco Silva, que foi deputado federal por três mandatos.
Jurandy Loureiro concorda com o ex-colega: “Isso não poderia acontecer. Tínhamos que ter mais tempo para analisarmos os projetos enviados e os que estão tramitando na casa”.
Pressão
Ele acredita que o projeto de lei que proíbe a propaganda de bebidas alcoólicas durante o dia na TV e no rádio não irá para frente por causa da burocracia da Câmara e da pressão dos fabricantes de bebidas. “Imagine a potência da indústria de bebidas alcoólicas!”
Levantamento feito pelo Congresso em Foco, publicado ontem (30), mostra que 51 deputados e 11 senadores declararam ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ter recebido R$ 4,5 milhões de fabricantes de cerveja, vinho e cachaça.
A indústria de bebidas ajudou a financiar ainda a eleição de 11 governadores (veja a lista) com R$ 2,4 milhões. Alguns com grande influência sobre numerosas bancadas no Congresso, como Aécio Neves (PSDB), de Minas Gerais, Yeda Crusius (PSDB), do Rio Grande do Sul, e Sérgio Cabral Filho, do Rio de Janeiro (PMDB).
Juntas, as empresas do setor doaram R$ 11,6 milhões para 143 candidatos, entre eleitos e não eleitos, na última campanha eleitoral (veja a lista completa).
“É o cúmulo! Tantos projetos rolam na Casa sobre bebidas alcoólicas e parlamentares aceitam o financiamento da indústria de bebidas”, indignou-se Francisco Silva. Ele acredita que as doações desse tipo de empresa deveriam ser proibidas.
Procurados pela reportagem, parlamentares que receberam recursos da indústria de bebidas garantiram que não serão influenciados pelos financiadores de campanha e que v
Deixe um comentário