Eduardo Militão
Mais uma ponta do golpe contra famílias carentes e a folha de pagamento da Câmara se revela. O deputado Raymundo Veloso (PMDB-BA) diz ter ficado surpreso com o fato de duas funcionárias que acreditava ter contratado em 2009 estarem registradas em seu gabinete desde 2007.
Como mostrou este site, a Polícia Legislativa da Câmara investiga uma fraude que envolve mais de 30 indiciados e já causou um prejuízo superior a R$ 1 milhão aos cofres públicos. Os líderes do golpe seriam um casal de funcionários recém-exonerados por Veloso e pelo líder do PR, Sandro Mabel (GO).
De acordo com os boletins administrativos da Câmara, Rosângela Maria da Rocha e Alda Silva Bandeira trabalharam para Veloso entre agosto de 2007 e setembro deste ano. O deputado afirma que a ex-funcionária Abigail Pereira da Silva – apontada nas investigações como uma das líderes do grupo – solicitou que as duas fossem contratadas pelo gabinete.
Veloso diz que repassou o pedido ao chefe de gabinete, que assim relatou o problema: “A Abigail falou comigo, disse que são pessoas amigas dela que estão passando necessidade, que ela inclusive ajuda, mas ela não pode ajudar. Se podia dar uma ajuda pelo gabinete, um salário mínimo para manter a família. Tinham filhos e gostaria de ajudá-las”.
O deputado concordou e contratou as duas mulheres para trabalharem para seu gabinete. A novidade que é, segundo ele, o ingresso de Rosângela e Alda deveria ter acontecido apenas neste ano, logo após o pedido de Abigail. Na quinta-feira (12), Veloso foi informado pelo Congresso em Foco que as duas já estavam registradas em seu gabinete quase dois anos antes (veja as portarias).
Ele se mostrou surpreso com a informação. “Eu não sabia. Não, de maneira nenhuma”, afirmou. “Estou sabendo por você agora.”
Apesar da revelação, Veloso não pretende tomar nenhuma providência para apurar o caso, porque entende que a situação será resolvida pela Polícia Legislativa da Câmara. “Já está se apurando esse negócio. Se ela for culpada, tem que pagar. Se for inocente, tudo bem.”
Salários e benefícios
Em 2006, Rosângela aparecia como servidora da Casa com salário de R$ 540 e benefícios como os R$ 1.400 do auxílio-creche diferenciado chamado de Programa de Assistência Pré-escolar (PAE). Alda recebia R$ 601, mais R$ 1.400,00 de auxílio-creche e outros benefícios.
Segundo as investigações policiais, os filhos de Alda foram registrados em escola no Distrito Federal, embora estudassem em Águas Lindas (GO).
Mesmo depois do pedido de emprego e da autorização para a contratação, Veloso também sentiu a falta de Rosângela e Alda. “Eu perguntei ao meu chefe de gabinete: ‘O que esse pessoal faz? Fica vindo? Vem ou não vem?”. Aí, mandou exonerar porque elas faltavam muito.
Coincidentemente, Alda e Rosângela trabalharam nos mesmos gabinetes nas mesmas épocas. Portarias publicadas nos boletins administrativos da Câmara mostram que elas ingressaram no gabinete do ex-deputado Irapuã Teixeira (PP-SP) em maio de 2006. De lá, saíram em 17 de outubro daquele ano.
Outro líder
Em 8 de dezembro de 2006, Rosângela e Alda foram nomeadas para trabalhar com Sandro Mabel, onde já estava lotado o marido de Abigail, Francisco “Franzé” Feijão, apontado como outro líder do grupo. As duas sairiam do gabinete do hoje líder do PR exatamente na mesma data: 16 de abril de 2007, quatro meses antes de ingressarem – ao menos no papel – no gabinete de Veloso.
No gabinete de Mabel, foi registrado o vendedor de pastéis Severino Lourenço dos Santos Neto e a faxineira desempregada Márcia Flávia Silveira (nome fictício para preservar identidade). A diarista Márcia Flávia afirma que é vítima de Franzé e que pensou estar sendo cadastrada para um programa social (leia mais).
Mabel prefere não comentar o assunto desde que foi procurado pelo Congresso em Foco pela primeira vez, na terça-feira (11). “Eu pedi a investigação. Demiti. Não quero atrapalhar as investigações”, disse Mabel ao site na quarta-feira. “Eu já encerrei esse assunto com você”, acrescentou.
A reportagem não localizou Franzé, Rosângela, Alda, Abigail e Severino.
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