Daniela Lima
A luta no Conselho de Ética para manter o mandato está longe de ser a única preocupação do deputado Edmar Moreira (sem partido-MG). Acusado de ter destinado recursos públicos para as próprias empresas, Edmar está com os bens bloqueados pela Justiça, onde enfrenta cerca de três mil ações trabalhistas e uma batalha judicial para garantir o recebimento do salário como parlamentar.
Edmar só conseguiu receber no último dia 16 os vencimentos referentes ao mês de abril. Ainda assim, a partir de agora, o deputado só receberá 70% do valor líquido, já que 30% do salário ficarão depositados em juízo para garantir pagamento de uma dívida trabalhista.
O deputado e suas empresas são alvo de 2,7 mil processos trabalhistas apenas no estado de São Paulo, sede de suas firmas de segurança. Há também mais de uma centena de ações em Minas Gerais. Os débitos previdenciários e trabalhistas do parlamentar e de suas empresas são estimados pelo Ministério Público do Trabalho em mais de R$ 30 milhões.
Por causa de duas decisões relativas a esses processos movidos na Justiça do Trabalho, os problemas do deputado, dono de um castelo avaliado em R$ 25 milhões, deixou de ser exclusivamente político e passou a ser, também, econômico.
Em abril deste ano, uma decisão da Vara do Trabalho de Ituverava (SP) determinou a penhora de 100% do salário do parlamentar, descontados os impostos, até que o montante fosse suficiente para quitar dívidas trabalhistas com um dos ex-empregados da F. Moreira, empresa de vigilância de propriedade do deputado.
O autor da denúncia alega que trabalhou oito anos sem receber 13º salário, horas-extras, verbas rescisórias, aviso prévio entre outros direitos. O advogado Jiulian César, que defende o ex-funcionário de Edmar, diz que a dívida com o trabalhador chega a R$ 57 mil, em valores não atualizados.
O deputado recorreu da penhora integral de seus vencimentos no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas). No último dia 15, o TRT determinou que a juíza de Ituverava devolvesse imediatamente os R$ 12.090,50 referentes ao salário líquido do deputado no mês de abril.
Mas uma segunda decisão do TRT, originária do outro processo na Justiça trabalhista, determinou a penhora de 30% dos vencimentos de Edmar Moreira como garantia de pagamento de dívidas trabalhistas. Esse caso tramitava na Vara do Trabalho de Capão Bonito (SP).
Verba intocada
A reportagem procurou o gabinete de Edmar para ouvir o deputado sobre a penhora do salário, mas foi informada por sua assessoria de que ele não fala sobre o assunto. Desde fevereiro, quando o Congresso em Foco mostrou que o deputado foi o parlamentar que mais gastou a verba indenizatória com segurança particular nos últimos dois anos, Edmar não usou mais um centavo sequer do benefício.
A atual economia contrasta com os R$ 230,6 mil utilizados pelo parlamentar, a partir da verba indenizatória, para pagar suas próprias empresas por serviços de segurança particular. O deputado, que prestou depoimento ontem (20) ao Conselho de Ética, disse não ver ilegalidade na destinação de recursos públicos para suas empresas. Em janeiro, o deputado gastou os R$ 15 mil mensais da verba somente com a rubrica segurança.
Com as três empresas que já estiveram em seu nome declaradamente falidas, bens e contas bloqueados e sem verba indenizatória, os advogados argumentaram que Edmar está passando por “necessidade” ao defenderem a liberação de seus salários. A defesa alegou que os vencimentos deveriam ser liberados imediatamente por constituírem créditos de natureza alimentar.
Bens bloqueados
A conduta de Edmar Moreira como empresário é foco de investigações desde 2006, quando funcionários de suas empresas denunciaram atrasos nos salários e, posteriormente, demissões em massa, sem pagamento de rescisões e outros direitos trabalhistas. Por conta disso, a Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região de São Paulo impetrou, em 2007, uma ação cautelar em nome dos 1,5 mil funcionários demitidos das empresas de vigilância de Edmar Moreira.
Apenas nesse caso, as dívidas trabalhistas do empresário Edmar Moreira chegam a R$ 10 milhões, segundo a procuradoria. Ele também é acusado pelos procuradores do Trabalho de ter recolhido o equivalente a R$ 20 milhões de INSS de seus funcionários sem repassar os valores à Previdência.
Desde então, nove bens do parlamentar em Juiz de Fora (MG) e São João Nepomuceno (MG) estão bloqueados. Entre os imóveis, estão apartamentos de luxo em coberturas, casas e terrenos. O famoso castelo do parlamentar, avaliado em R$ 25 milhões, está fora dessa lista. Edmar afirma que doou o “empreendimento hoteleiro” aos filhos, em 1993.
Em depoimento ao Conselho de Ética, o deputado disse não ver problema em ter construído um castelo avaliado em R$ 25 milhões por acreditar que o empreendimento poderia gerar empregos.
A procuradoria também pediu a descaracterização da pessoa jurídica das empresas, pleito ainda não considerado pela Terceira Vara do Trabalho paulista. Se o pedido for concedido, os bens de Moreira passarão às mãos da Justiça e serão usados para quitar as dívidas do deputado com seus ex-funcionários.
Os procuradores argumentam que os ativos (valores e bens) das empresas de Edmar Moreira não são suficientes para cobrir suas dívidas com os ex-funcionários. O entendimento deles é partilhado pela juíza de Ituverava, Eliana dos Santos Alves Nogueira.
“Este juízo foi informado da decretação de falência da primeira (F.Moreira) e segunda (Itatiaia) executadas. A terceira executada (Ronda) permanece no desenvolvimento regular de suas atividades. (…) Durante a execução nenhum bem, imóvel ou dinheiro foi encontrado em nome da terceira executada (Ronda)”, relatou a juíza ao TRT, ao justificar sua decisão de penhorar integralmente o salário de Edmar.
A defesa do deputado alega que sua punição deveria ser extinta, uma vez que ele teria aderido ao Programa de Recuperação Fiscal (Refis) e quitado o valor total da dívida previdenciária.
Polêmica
A penhora de salários é questão controversa na Justiça brasileira. A Justiça Trabalhista lança mão com mais frequência desse recurso, mas ainda assim ele não é uma unanimidade entre os magistrados. Há o entendimento de que o salário de qualquer pessoa é destinado à subsistência e, portanto, impenhorável.
A juíza de Ituverava que ordenou o sequestro integral do salário de Moreira disse que esse argumento não poderia ser aplicado no caso de Edmar. “A declaração de bens do referido executado (Edmar Moreira) evidencia robusto patrimônio e propriedades de diversas empresas privadas e imóveis (que por certo geram renda) o que nos leva à conclusão de que os subsídios que o mesmo recebe enquanto deputado federal não são destinados à sua subsistência”, respondeu Eliana em despacho ao ser questionada pelo TRT sobre sua decisão.
Ela prossegue sua argumentação explicando o porquê de a Justiça não conseguir quitar os débitos trabalhistas dos ex-funcionários das empresas de Edmar. “A prática do referido executado consiste em ocultar seu patrimônio, tornando absolutamente impossível o prosseguimento da presente execução e o pagamento do crédito do reclamante”, fundamenta a magistrada. A juíza teve sua condutaquestionada pelo TRT, que decidiu enviar ao Ministério Público Federal relato de sua decisão para análise, sob pena de crime de responsabilidade.
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