Manolo Fontoura Ferraresi *
De janeiro a julho, uma equipe da Secretaria da Receita Federal identifica tudo o que foi arrecadado pelos governos municipais, estaduais e do Distrital e Federal e publica, em agosto, as Estatísticas Tributárias, demonstrando a Carga Tributária do Brasil no ano anterior. Os técnicos agrupam em 33 itens todos os tributos (impostos, contribuições e taxas, incluindo o recolhimento previdenciário e do FGTS).
A quantidade de tributos brasileiros é uma incógnita. Muda conforme o estudioso no assunto: 61, 76, 80 e diversas outras quantidades. A Associação Comercial de São Paulo pesquisou e afirma que são 112 os tipos de tributos cobrados dos brasileiros. Todos esses tributos refletem na cadeia de fornecimento e nos preços finais aos consumidores.
Essa imensidão de tributos exige que cada um dos 5.563 municípios, os 26 estados, o Distrital Federal e a União tenham equipe de tributação, de arrecadação e de fiscalização. No mínimo, são 16.773 equipes trabalhando exclusivamente em função da arrecadação. Quanto do valor arrecadado é necessário para pagar o custo dessa enorme máquina administrativa?
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Se compararmos a arrecadação com o PIB dos últimos 15 anos, veremos que a carga tributária passou de 25,86% para 34,23% do PIB. Ou tivemos mais investimentos públicos nesse período ou o custo da máquina pública cresceu em demasia! Provavelmente, a segunda opção.
Fala-se muito em justiça social tributária no Brasil. Alguns gostam de dizer que os ricos devem pagar mais que os pobres; outros dizem que a conta sempre cai no colo da classe média. Analisando os percentuais de tributos sobre os produtos não vemos onde há diferenciação na cobrança de impostos entre os ricos e os pobres. Vejam como está a carga tributária sobre alguns produtos consumidos por ricos, pobres e pela classe média:
Produto |
% |
produto |
% |
produto |
% |
produto |
% |
Açúcar |
40,40 |
Peixe |
18,02 |
Detergente |
40,50 |
Conta de luz |
45,81 |
Sal |
29,48 |
Farinha |
34,47 |
Esponja de aço |
44,35 |
Conta de telefone |
47,87 |
Arroz |
18,00 |
Macarrão |
35,20 |
Vassoura |
26,25 |
Roupas |
37,84 |
Feijão |
18,00 |
Ovos |
21,79 |
Caneta |
48,69 |
Fogão |
39,50 |
Café |
36,52 |
Frutas |
22,98 |
Lápis |
36,19 |
Geladeira |
47,06 |
Leite |
33,63 |
Pasta de dente |
42,00 |
Livros |
13,18 |
Casa popular |
49,02 |
Carne bovina |
18,63 |
Sabonete |
42,00 |
Medicamentos |
36,00 |
CD |
47,25 |
Frango |
17,91 |
Papel higiênico |
40,50 |
Conta de água |
29,83 |
Brinquedos |
41,98 |
Mas o rico não deveria pagar mais? Sim, ele paga. Ou alguém acredita que o pobre algum dia pagou ou pagará mais impostos do que o rico? O rico consome mais, portanto recolhe mais dinheiro aos cofres públicos, isso sim é justiça social tributária. O fato do pobre não ter condições financeiras de consumir mais não é questão de justiça tributária, o problema é outro. Olhe a carga tributária parcial sobre quem ganha um salário mínimo mensal:
Trabalhador
Salário mínimo |
Tributo |
Salário bruto – R$ 380 |
% – Valor (R$) |
INSS – R$ 29,07 |
7,65 – 29,07 |
Salário líquido – R$ 350,93 |
– 29,07 |
CPMF – R$ 1,33 |
0,38 – 1,33 |
Saldo – R$ 349,60 |
– 30,40 |
Empregador
Salário mínimo |
Tributo |
Salário bruto – R$ 380 |
% – Valor (R$) |
+INSS |
23,45 – 89,11 |
+FGTS |
8,00 – 30,40 |
+Vale-transporte |
30,00 – 18,24 |
Total de tributos |
36,25 – 137,75 |
Trabalhador
Gasto com |
Tributo |
Item – R$ |
% – R$ |
Alimentação – 228,00 |
25 – 57,00 |
Transporte – 22,80 |
30 – 6,84 |
Água – 10,00 |
29,83 – 2,98 |
Luz – 15,00 |
45,81 – 6,87 |
Higiene – 20,00 |
40 – 8,00 |
Material escolar – 10,00 |
30 – 3,00 |
Medicamento – 10,00 |
36 – 3,6 |
Roupa – 10,00 |
37,84 – 3,78 |
Lazer – 10,00 |
30 – 3,00 |
Saldo – 335,80 |
28,31 – 95,08 |
Tributo direto sobre o salário |
– 30,40 |
Total de tributos |
33,02 – 125,48 |
O trabalhador que recebe um salário mínimo mensal paga de imposto, aproximadamente, 33,02% de seu salário. E sobre o mesmo salário mínimo seu empregador paga 36,25%, sem considerar os demais encargos trabalhistas. E o que isso tem a ver com a CPMF e com o imposto único? Tudo.
A tão pedida redução da carga tributária somente será possível com a redução de custo da máquina pública, não há outra saída. Se o custo da máquina pública diminuir, será possível reduzir a carga tributária sem afetar os investimentos governamentais necessários. Todos pagarão menos impostos e terão mais dinheiro para o consumo.
Em 2006 os governos municipais, estaduais e o Distrital Federal arrecadaram juntos R$ 795,11 bilhões. A arrecadação da CPMF foi de R$ 32,05 bilhões (4,03% do total arrecadado).
Para que a arrecadação total seja a mesma, com a mesma base de cálculo da CMPF (sobre a movimentação financeira), basta transformar a CPMF em imposto único e aplicar uma alíquota de 9,43%.
O trabalhador que paga 33,02% de imposto pelo ganho de um mísero salário mínimo passará a pagar apenas 9,43%, nada a mais que isso. O empregador que paga 36,25%, também, pagará apenas 9,43%.
Para ajudar nossos governantes na reorganização da máquina pública e prepará-la para a redução gradativa de seu custo, vamos considerar uma alíquota redonda de 10%, o que colocará R$ 48,61 bilhões a mais nos cofres públicos. Para isso, nossos governantes terão que assumir o compromisso de diminuir a alíquota do imposto único em 0,25% ao ano, até que a arrecadação de total do imposto único fique no máximo em 25% do PIB.
Esse compromisso exigirá uma reformar administrativa efetiva e redução gradativa do custo da máquina pública.
Com o imposto único todos os preços praticados no país terão que sofrer redução imediata (desoneração de toda a carga tributária atual). A maioria dos produtos será adquirida com preço entre 25% e 75% do preço atual. Também os serviços terão que sofrer reduções imediatas. Com isso, a população pagará menos pelos produtos e terá dinheiro para suprir outras necessidades até então impossíveis.
Inicialmente, a distribuição do total arrecadado será de acordo com os percentuais de participação atual de cada tributo e de acordo com o percentual atual que cabe a cada um dos governos. Estudos posteriores poderão definir outra metodologia. Poderemos ter uma parte da arrecadação distribuída proporcionalmente à população de cada município, pois quanto maior a população maior a necessidade de recursos. Também poderemos ter uma parte proporcional ao PIB e aos indicadores de desenvolvimento sócio-econômico de cada localidade, beneficiando dessa formas os municípios e Estados que mais contribuem para a arrecadação total.
Os créditos previdenciários e do FGTS serão vinculados ao depósito bancário do salário, o que evitará o pagamento “por fora” para escapar do imposto único.
Com o imposto único começaremos a redução dos custos da máquina pública. Não haverá mais a necessidade das 16.773 equipes envolvidas com a arrecadação e sim, apenas as equipes do governo federal. O sistema de declaração do imposto de renda deverá ser substituído por outro sistema, que sirva para auditar se os bancos repassaram corretamente tudo o que arrecadaram do imposto único.
Em vez de declaração do imposto de renda, teremos declaração do imposto único debitado em conta-corrente bancária, com declaração a cada cinco anos, por exemplo. Ao término de cada ano o governo federal sorteará quais os finais de CPF e CNPJ, ou os contribuintes, que deverão prestar declaração do imposto único pago durante o ano (declaração totalizando o imposto mês a mês). De posse dessas declarações, a Receita Federal fará um cruzamento com as informações recebidas dos bancos e poderá identificar eventuais fraudes nos repasses.
Portanto, para mudar o sistema tributário brasileiro e para instituir o imposto único, basta coragem!
* Manolo Fontoura Ferraresi é especialista em Gestão de Processos, Mudanças e Tecnologia da Informação.