O Congresso em Foco convida o leitor para um exercício de imaginação. Suponha que o atual deputado Tiririca (PR-SP), o recordista de votos da história da Câmara (mais de 1,3 milhão de votos), fosse absolutamente anônimo. Vá além: jamais qualquer nota de uma de suas músicas, “Florentina”, fora ouvida pelos rincões do mundo. Você votaria em um candidato com o nome dele? E se, desconhecido total, Tiririca reforçasse a “performance” em um vídeo no qual, vestido de palhaço, aparecesse entre piadas perguntando ao votante – que, pressupõe-se, precisa de orientação e informação, e não de ainda mais dúvidas: “Você sabe o que faz um deputado? Nem eu… Mas vote em mim que depois eu te conto!”. Seja sincero: você votaria?
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Pois há um grande número de candidatos bem menos conhecidos que Tiririca que opta por estratégia semelhante para se eleger nas eleições municipais deste ano. Nomes estranhos, performances de todos os gêneros e vídeos para os mais variados gostos, entre outras alegorias, têm transformado a propaganda eleitoral Brasil afora naquele que foi o cenário do palhaço Tiririca por muitos anos: o circo, metáfora usada pelo cidadão comum para repudiar as “palhaçadas” protagonizadas de tempos em tempos por nossos excelentíssimos congressistas. A criatividade, de bom ou mau gosto, tem sido cada vez mais atrelada ao requisito básico para quem pretende disputar cargo eletivo – a condição de “candura”, cuja acepção do termo explica a origem da palavra candidato. Chegou a vez dos “homens de palha” – ou, na etimologia italiana, omino di paglia. Os pagliaccios, como queiram.
São dezenas (seriam centenas?) de nomes engraçados, estranhos, impronunciáveis, melodiosos, poéticos, chulos, constrangedores… Uma infinidade de estilos que, digitalizados nas urnas, no mínimo surpreenderão. O Congresso em Foco adverte: os nomes e cenas a seguir podem não ser prejudiciais à saúde, mas têm o potencial de assustar crianças e adultos desavisados.
Tia Nei e Hakuna Matata!
Comecemos pela Tia Nei, candidata ao cargo de vereadora em Guararapes pelo DEM de São Paulo que também atende pelo nome de Cidinei Soares da Silva. Sua candidatura, pela coligação “Guararapes em primeiro lugar”, está devidamente avalizada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – o que indica que Tia Nei pode até receber da blogosfera local o qualificativo de “candidatos bizarros”, mas ao menos tem a ficha limpa.
Pois bem. Tia Nei postou no Youtube uma cena da animação Rei Leão (Disney) com os seguintes dizeres: “Na urna é batata. Meu voto eu já sei. É a Tia Nei. Os seus problemas ela vai resolver. É a Tia Nei. Você vai ver”, diz um dos personagens do desenho animado, em vídeo iniciado com as credenciais da candidata, “professora infantil há 21 anos” (“bacharel em Pedagogia e pós-graduada em Educação Infantil”, informa o filmete).
Confira o vídeo da Tia Nei:
Billaw e um Axé a Reka
Do universo lúdico para o anedotário. Em Jequié, Bahia, a urna mostrará o Billaw da Cultura entre os candidatos autorizados pelo TSE ao pleito de vereador. Trata-se do nome de urna de Wenceslau Braz Silveira Nogueira Júnior, que concorre pelo PP na coligação “É hora de mudar”. Confira a animação do jingle de campanha de Billaw, que começa com uma espécie de frevo e, no ápice da animação, desacelera depois da exortação: “Vote Billaw!!!”.
Escute a obra-prima de Bilaw:
Billaw entrou na disputa, ao contrário do risco que correm candidatos a vereador em Recife, onde a Justiça Eleitoral tem enquadrado nomes estranhos nas urnas – homônimos ou excesso de caracteres implica a disputa com o nome de nascimento, o que é pouco recomendado segundo a ótica dos intrépidos candidatos marqueteiros. Para alegria de Wenceslau, juiz nenhum quis cortar o Billaw das urnas.
Outro que remete à sexualidade é o candidato Reka, codinome de Valmir Batista de Souza, que vai à luta de maneira independente (não coligado), pelo PDC, pelo cargo de vereador em Salvador – lá a briga é boa: são 1.308 nomes disputando 43 vagas na câmara de vereadores. Ao estilo baiano, Reka deixa seu recado nas entrelinhas (o suingue, sem trocadilho, do jingle, é de tirar os pés do chão): “Alô, Salvador! Vamos dar um axé a Reka!”. Axé a Reka… Quem se habilita?
Eis a “traquinagem” de Reka, em vídeo:
Dragon Ball e Pokemón
A candidata Tia Nei, como vimos lá no início, explora o universo infantil que tão bem conhece, na condição de educadora mirim. Em municípios Brasil afora, talvez ela possa dar umas dicas para candidatos que, apesar de enveredarem pelo mesmo caminho, eles são em si mesmos uma espécie de regressão à infância.
É o caso do candidato Tiago Dionísio Penha, que pleiteia uma cadeira de vereador em Parnamirim, Rio Grande do Norte, pelo Psol. Como Reka (mais uma vez, sem trocadilhos), Tiago Dionísio não está em coligação, mas se inspira nas aventuras de Dragon Ball Z para vencer o mal.
Detalhe: o “candidato super-herói” tem apenas 18 anos – se ele também acreditar em numerologia, lá vai: são 18 vagas para 222 concorrentes. “Mal saiu da fralda, já quer mamar na teta da União”, brincou um blogueiro sarcástico.
Divirtam-se, crianças, ao som da paródia da abertura de Dragon Ball Z:
Rei Leão, Dragon Ball Z… Pokemón! Quem não ouviu falar do Picachu e seus amigos monstrinhos? Pois tem gente grande se inspirando na vinheta de abertura da animação que enlouqueceu os baixinhos dos anos 1990. Foi essa a escolha de Thalison Roberto Mendes, que quer uma vaga de vereador em Rio Claro, São Paulo. Ele disputa pelo PSL, na coligação “Ficha Limpa”.
“Pra fazer Rio Claro crescer, já sei em quem vou votar // É juventude no poder, vamos renovar!”, diz o jingle teenager, cantado por uma voz bem parecida com a que entoava a canção de abertura do desenho animado japonês.
Ouçamos:
Sesóstris!
Deixemos um pouco as simpáticas vinhetinhas de lado, e apreciemos a criatividade dos nomes – alguns não inventados, por insondáveis escolhas paternas. Mas, no caso do petista Sesóstris (coligação PT-PDT-PV), candidato a vereador em Curitiba, Paraná, o jingle de campanha se faz necessário pelo contexto.
Sesóstris Filipe Armstrong Oliveira, como foi batizado, foi buscar nos anos 1980 a inspiração para a corrida às urnas. Algum amigo engraçadinho deve ter visto semelhança na pronúncia de seu nome com o refrão de uma música (“U can’t touch this?”, do saltitante MC Hammer; relembre aqui). E lá se vai Sesóstris, que promete “juventude com cultura”, no embalo do rapper norte-americano com sua calça-pamonha…
Confira:
Tem pra todos os gostos. Em Ribeirão Preto (SP), por exemplo, o cardápio é tão farto como bem-humorado: o TSE considerou entre os aptos para a disputa de vereador, a despeito dos nomes que vão às urnas, Picite (PR), Coruja (PTN), Franklin Papai Noel (PSDB), Luiz Meladinho (PSB), Márcio Terror (PRTB), Suavinho (PPS), Barney (PV), Carunchão (PR), Cigano Cacareco (PSL), Dadinho (PR), Giló (PR) e Boka (PV).
Menção honrosa para Dadinho, também conhecido como Ariovaldo de Souza, que sai às ruas vestido de quimono, faixa-preta e um dado suspenso nos ombros por uma estrutura mambembe. Em tempo: Dadinho ganhou este apelido porque, quando criança, gostava de um doce em formato de dado.
Furúnculo Maligno
Em Recife, o juiz da 151ª Zona Eleitoral do Recife, João Maurício Guedes Alcoforado, resolveu examinar os rigores da lei. A ele coube a tarefa de aplicar ou não a Resolução do TSE nº 23.373, que impede abusos no uso de nomes de urna, classificando-os como fora do padrão. É que lá pela terra do frevo surgiram uns candidatos de apelido, segundo o entendimento do tribunal, “anormal”.
Entre eles, alguns deles já devidamente notificados pela autoridade eleitoral: Bololô (DEM), Pindoba (PHS), Pai Gay (PV), Cobra (PPS), Suador (PMN), Papai Noel (PRP), Deninho Nota 10 (PPS), Boca (PHS), Som (PR) e Furúnculo Maligno (PPS). Destaque para Roberto do Bloco Bimba Mole (PSDC), ou Roberto Ferreira dos Santos, que quase teve candidatura indeferida pelo juiz – a solução foi abreviar o “bimba mole” do Roberto nas urnas, ficando “Roberto B.M.”. Para registro: bimba, em Recife, é isso mesmo o que você que lê estas linhas está pensando. Rivaliza com Bilaw…
Disputa canina
Tem Tem (PMN) – parênteses: o redator não repetiu a palavra, como o Word insiste em apontar – e Wescley Cueca (PRB) concorrendo a vereador no município mineiro de Timóteo; tem Pelado (PHS) disputando em Caaporã, na Paraíba. Agora, briga de cachorro grande é em São Paulo, onde o candidato Vira Lata (PRB), vulgarmente conhecido como Antonio D’Agosto, disputa com outros 1.225 nomes uma das 55 vagas na concorrida Câmara de Vereadores de São Paulo.
A variedade é tanta que o portal UOL, por exemplo, lançou a enquete: qual candidato tem o nome mais excêntrico? Na liderança, o transformista candidato a vereador Bixa Muda (PRB), ou João dos Reis, aproximando-se dos 20 mil votos neste sábado (18). Cearense arretado (a), ele teve de provar sanidade mental à Justiça Eleitoral para poder concorrer ao pleito municipal em Juazeiro do Norte. Na cola de Bixa aparece Dulce dos Paus Pretos (PSB), na disputa de vereador no município alagoano de Monteirópolis e chegando a 17 mil votos. Coisa de louco.