Época
Acabou a folia de Arruda
Desde que foi deflagrada a Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal, o governador afastado do Distrito Federal, José Roberto Arruda, estabeleceu um paradigma inédito na farta história da corrupção na política brasileira. Arruda foi o primeiro governador flagrado em vídeo ao receber dinheiro supostamente sujo de um ex-assessor. Na semana passada, Arruda também se tornou o primeiro governador a ser preso no exercício do cargo, desde a redemocratização, em 1985, por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), antecipada, em primeira mão, por epoca.com.br. Ao decretar a prisão de Arruda, o STJ também determinou seu afastamento do cargo por prazo indeterminado.
A queda de Arruda começou no último dia 7 de janeiro. Naquele dia, o então deputado distrital Geraldo Naves foi até a casa de Sombra para sondá-lo sobre a possibilidade de ajudar Arruda em seu processo. Sombra pediu uma prova de que Naves falava mesmo pelo governador. Num segundo encontro, Naves apareceu com um bilhete de Arruda. Sua intenção era apenas mostrá-lo a Sombra. Mas o jornalista pediu para ficar com o papel, sob o argumento de que precisava mostrá-lo a amigos que poderiam ajudá-lo a romper com Durval. Naves acreditou na história – e deixou o papel.
A procuradora Raquel Dodge apresentou ainda outros indícios de obstrução da Justiça por Arruda e seus assessores. Após o início do escândalo, o STJ pedira ao governo do Distrito Federal informações sobre os gastos com publicidade por suspeitar de irregularidades. Num vídeo obtido pela polícia, Welligton conta como foi feita a maquiagem de informações contábeis da Secretaria da Fazenda para enganar a Justiça. Outro indício foi o financiamento de manifestações pró-Arruda, com o pagamento de uma claque a favor do governador, conforme revelou epoca.com.br na semana passada. “A organização criminosa instalada no Distrito Federal continua valendo-se de dinheiro para impedir investigações”, afirma o ministro Fernando Gonçalves, do STJ, na sentença em que decretou a prisão de Arruda e o afastou do cargo. “Os monitoramentos telefônicos indicam sua pretensão de não se submeter à lei brasileira.”
A prisão de Arruda poderia ter ocorrido há uma semana. O ministro de plantão no STJ Aldir Passarinho, porém, se declarou impedido. O presidente do tribunal, César Asfor, se declarou pronto a dar a sentença. Mas a principal prova material do envolvimento do governador na tentativa de suborno do jornalista Sombra – o bilhete escrito por Arruda de próprio punho – ainda não fora periciada pelos técnicos da PF. O laudo só foi concluído no dia 9. Por causa disso, na semana passada, o expediente na Procuradoria-Geral da República se estendeu noite adentro na preparação de quatro representações – três elaboradas por Raquel Dodge para o STJ e a outra, subscrita pelo procurador-geral Roberto Gurgel, com o pedido ao STF de intervenção no Distrito Federal.
“O lulismo pode durar 30 anos”
Autor de um artigo que causou grande repercussão nos meios acadêmicos e políticos, o cientista político e ex-porta-voz da Presidência André Singer diz que as eleições presidenciais de 2010 serão o grande teste de força do lulismo. Para Singer, o lulismo alia um projeto de redistribuição de renda à manutenção da ordem social, o que atraiu eleitores conservadores e de baixa renda historicamente avessos ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Singer acompanhou Lula ao longo do primeiro mandato e estudou o comportamento eleitoral brasileiro nas cinco últimas eleições para presidente. Segundo ele, o lulismo reorganizou o eleitorado brasileiro e poderá virar uma força política hegemônica por décadas.
O lulismo pode sobreviver sem o Lula? Não é preciso uma liderança carismática à frente desse projeto político?
Singer – No lulismo existe um elemento de carisma, mas isso não é o mais importante. A importância do carisma é maior nas regiões menos urbanizadas do país, onde se tende a atribuir a capacidade de execução de um projeto a características especiais da liderança. Em regiões urbanizadas existe uma adesão mais racional ao programa político. Se minha análise estiver correta, o lulismo sobreviverá sem o Lula. Uma hipótese é que o lulismo vá desaguar no PT. Essa camada social que aderiu ao Lula pode lentamente começar a votar nos candidatos do PT a prefeito, governador, senador. Vejo indícios de que isso começou a ocorrer nas eleições municipais de 2008. O PT foi mal nas capitais, mas foi bem nas regiões metropolitanas de São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte. Isso pode sinalizar que o voto da camada de menor renda da sociedade está caminhando para o PT.
Eles caíram nas armadilhas do Twitter
Após a eleição de Barack Obama para a Presidência dos Estados Unidos, embalada por uma forte campanha de arrecadação e mobilização em redes sociais, o uso do Twitter virou moda entre os políticos brasileiros. Dos 513 deputados federais, 253 têm perfil ativo no site de troca de mensagens curtas. Marqueteiros e acadêmicos também passaram a especular sobre os possíveis impactos da internet nas eleições deste ano. Até agora, o que mais tem chamado a atenção dos internautas, porém, é a avalanche de gafes, grosserias e erros de português (leia alguns exemplos abaixo) . Apesar do entusiasmo, a maior parte dos políticos que aderiram ao Twitter parece completamente despreparada para lidar com a nova tecnologia.
O motivo para as gafes está relacionado à natureza imediata da internet. Nos perfis citados nesta reportagem, quase todas as atualizações foram feitas diretamente pelos políticos sem passar por assessores, subvertendo a estrutura de comunicação à qual eles estão acostumados. Em tese, a comunicação mais direta ajudaria os políticos a se aproximar dos eleitores. Na prática, ela passou a expor os tropeços típicos da comunicação instantânea. “Para tirar do contexto uma mensagem do Twitter, que é curta, é um pulo. É muito fácil ser mal interpretado”, afirma o empresário Antônio Graeff, fundador de uma agência digital e autor do livro Eleições 2.0.
Eles brigam com o adolescentes
A disputa política entre o PT e o PSDB ganhou na semana passada os ares de uma rixa adolescente, em que meninos competem entre si para mostrar quem é melhor ou faz mais. Inflados pela aprovação recorde do governo, os petistas querem transformar a campanha presidencial da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, numa variação do bordão preferido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: “Nunca antes na história deste país”. O PT segue a estratégia de uma disputa plebiscitária contra o PSDB em que pretende confrontar as realizações do governo Lula com as do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que deixou o Palácio do Planalto com a popularidade em baixa. Na semana passada, FHC reagiu. Em artigo, FHC acusou Lula de “inventar inimigos e enunciar inverdades”, de se deixar contaminar “por impulsos tão toscos e perigosos” e topou o desafio. “Se o lulismo quiser comparar, sem mentir e sem descontextualizar, a briga é boa. Nada a temer”, escreveu FHC.
Veja
Sem cargo e na prisão
Quase todo mundo viu o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, estrelar o mais bem documentado caso de corrupção do país. Em uma série de vídeos, um ex-secretário, Durval Barbosa, registrou cenas explícitas de arrecadação e distribuição de propinas em Brasília. O dinheiro era guardado em malas, bolsos de paletó, meias, cuecas e até em uma banheira de hidromassagem. O governador, filmado acomodando 50.000 reais num envelope pardo, alegou ter usado o montante na compra de panetones para os pobres. Não convenceu nem seu partido, o DEM, e teve de se desfiliar para evitar uma expulsão. O abandono da sigla impediu Arruda de disputar a própria sucessão nas eleições de outubro. Existe papel pior para um político? Existe. Entrou em cartaz, na semana passada, mais um capítulo do cinema de horror protagonizado pelo governador e sua trupe. Tentativas de sabotar as investigações levaram o Superior Tribunal de Justiça (STJ), responsável pelo inquérito que apura a corrupção na capital do país, a decretar a prisão preventiva do governador. O STJ também o afastou do cargo. Arruda se entregou à polícia espontaneamente. Ele é o primeiro governador a ser preso em pleno exercício do mandato.
O caso mais conhecido de político preso por tentar atrapalhar investigações é o de Paulo Maluf, ex-governador de São Paulo. Ele passou quarenta dias preso, em 2005, acusado de tentar impedir o depoimento de uma testemunha de acusação. Nos últimos anos, vários governadores também estão sendo acuados. Desde 2006, nove deles foram processados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sempre sob a suspeita de fraudar as regras que garantem a lisura das eleições. Três governadores foram punidos com a perda do mandato e quatro ainda aguardam julgamento. O ex-governador da Paraí-ba Cássio Cunha Lima foi afastado do cargo por ter lançado um programa assistencial durante a campanha à reeleição. O TSE ainda ceifou o mandato do governador do Tocantins, Marcelo Miranda, pela contratação de servidores públicos às vésperas da reeleição, o que é proibido. Já o ex-governador do Maranhão Jackson Lago caiu por ter distribuído material de construção e combustível a eleitores. Lago foi acusado, na esfera criminal, de também participar de um esquema de corrupção e fraude em licitações. Sua prisão chegou a ser pedida à Justiça, mas foi negada pelo STJ. Nada disso, porém, pode ser comparado à corrupção institucionalizada que assalta o governo de Brasília.
A tempestade FHC
Há quem o ame e quem o odeie. Mas uma coisa é indiscutível: no mundo da política, ninguém fica indiferente a ele. Quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) fala, os outros escutam. Foi o que ocorreu na semana passada, quando FHC assinou em sua coluna quinzenal no jornal O Estado de S. Paulo um artigo intitulado “Sem medo do passado”. Com o texto, ele entrou de vez na campanha eleitoral – e, pelo visto, não sairá dela tão cedo. Em dois movimentos, fez o que a oposição foi incapaz de fazer nos últimos sete anos: enfrentou duramente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acusando-o de “enunciar inverdades” e “distorcer” fatos para inflar as realizações do PT, e defendeu vigorosamente as conquistas econômicas e sociais do seu próprio governo (1995-2002), enfileirando estatísticas que revelam que o desempenho dos tucanos no poder foi muito mais positivo do que tenta fazer crer a propaganda oficial. FHC entrou nessa briga depois de o Palácio do Planalto alardear que tentaria reduzir a eleição a um processo plebiscitário, orientado a partir da comparação do governo dele com o de Lula. “O PT fica ameaçando o tempo todo comparar os governos, como se isso amedrontasse o PSDB. Isso é conversa. Com o artigo, mostrei ao nosso pessoal que é possível defender o que foi feito com toda a tranquilidade. Temos resultados para mostrar. Se o PT quiser ir para o pau, nós vamos para o pau”, diz Fernando Henrique.
60 servidores novos por dia
Quando assumiu o governo, em 2003, Lula herdou um quadro que totalizava 884 000 servidores federais. Agora, o total na ativa dos três poderes – Executivo, tanto civis como militares, Judiciário e Legislativo – já passa de 1 milhão. Em sete anos, o efetivo foi inchado em 153 000 pessoas, gente suficiente para lotar dois Maracanãs, no atual limite de capacidade do estádio carioca. Desde a redemocratização, não houve governante que contratasse pessoal nesse ritmo. Ocorreu um avanço de 17%, num período em que a população do país cresceu 12%. Reverteram-se, assim, os esforços, ainda que tíbios, de governos anteriores para tornar a máquina pública mais enxuta. Ao mesmo tempo em que acelerou as contratações, a equipe de Lula concedeu reajustes acima da inflação. Essa política, cujo intuito ideológico expresso foi fortalecer o estado, resultou na elevação de 54% nas despesas totais com a folha do funcionalismo – um aumento que supera, em termos relativos, qualquer indicador econômico acumulado no período.
Istoé
A corrupção sem fim no poder
O Brasil está diante de uma oportunidade sem precedentes para reverter a forma como encara a corrupção e a impunidade. Nas últimas décadas, o País conseguiu o respeito da comunidade internacional por seus feitos econômicos e sociais. Apesar de dar provas de uma democracia capaz de enfrentar as idiossincrasias políticas e constituir-se eficiente, com um processo eleitoral invejado pelo mundo e ágil em fazer valer os seus princípios democráticos, faltava-lhe ainda a coragem de punir aqueles que usam o poder para o enriquecimento ilícito roubando o dinheiro de um povo sacrificado. Vencida esta etapa, o capítulo seguinte começa com uma pergunta: O caso José Roberto Arruda, o primeiro governador em exercício preso por corrupção, pode ser uma mudança de paradigma?
Logo depois da decisão da Justiça, a questão entrou em pauta e há muito a se fazer para o País abraçar essa chance histórica e, ao menos, reduzir a praga da corrupção que ameaça a democracia. “Essa medida, forte e necessária, inaugura uma nova fase no Brasil e é um sinal para todo o País de que há pouca tolerância à corrupção”, afirma Antonio Carlos Bigonha, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República. Para esta esperança tornar-se um divisor de águas, no entanto, há muitas lições a se apreender. A primeira foi o papel da tecnologia, uma aliada fundamental para a produção das mais contundentes provas de corrupção já enviadas a um tribunal no País. Mas isso só foi possível após se comprovar a eficiência de uma legislação – adotada pelo País com certo atraso – que permitiu a delação premiada e se associou ao aprimoramento das técnicas de investigação, tanto da polícia como do Ministério Público.
Um governador na prisão
No ano do cinquentenário de Brasília, a cidade criada por Juscelino Kubitschek entra para a história como a primeira unidade da Federação a ter um governador preso por corrupção. Acusado de obstruir a Justiça, José Roberto Arruda (ex-DEM) foi levado para uma sala especial da Superintendência da Polícia Federal no final da tarde da quinta-feira 11. A decisão exemplar do Superior Tribunal de Justiça, que por 12 votos a 2 mandou Arruda para a cadeia, tornou-se um novo marco. Mergulhada por mais de dois meses no escândalo que abalou o governo do Distrito Federal, a população de Brasília tirou um peso de suas costas na noite da quinta-feira. Os mesmos manifestantes que antes gritavam “Fora, Arruda”, pelas ruas da cidade, passaram a exigir “Fica, Arruda”, desta vez na frente da Polícia Federal. “A força da sociedade civil e das instituições venceu a corrupção”, comemorou o presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante. “O País começa finalmente a respirar um ar puro e livre do gás venenoso das fraudes”, acredita ele. O destino de Arruda foi selado no segundo andar do edifício principal do STJ, em sessão da Corte Especial, que se reuniu para referendar a decisão do ministro Fernando Gonçalves, a favor do pedido de prisão apresentado pela subprocuradora da República Raquel Dodge.
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