“Já falei que o delator mente. E mente a mando do procurador-geral da República, para não perder a sua delação”, sentenciou o peemedebista.
Na tarde desta quinta-feira (16), Cunha, um dos políticos investigados na Operação Lava Jato, já havia desafiado o ex-consultor da Toyo Setal, integrante do “clube vip” de empreiteiras que fraudavam contratos na Petrobras, a provar que diz a verdade. “Desminto com veemência as mentiras do delator e o desafio a prová-las”, acrescentou o deputado, por meio de nota (leia a íntegra abaixo).
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A reportagem quis então saber por que Julio Camargo teria mentido, uma vez que o beneficiado por delação premiada deve apresentar provas do que diz – para legitimar, por meio de seu depoimento, uma eventual redução de pena. Para Cunha, as novas declarações só pioram a situação de Camargo, porque supostamente desmentiriam o próprio depoimento anterior.
“Pior, ele mentiu. Porque já deu vários depoimentos”, acrescentou o deputado, prometendo recorrer a toda e qualquer medida que lhe esteja ao alcance. “Vou reagir com tudo o que puder”, respondeu, depois de questionado pelo site se reagiria com ação por calúnia e difamação.
Por meio de nota (veja a íntegra abaixo), a Procuradoria-Geral da República (PGR) também reagiu às declarações de Cunha sobre a suposta ingerência do órgão nas delações premiadas da Lava Jato. Para a PGR, “o depoimento prestado na presente data por Júlio Camargo à Justiça Federal do Paraná não tem qualquer relação com as investigações (inquéritos) em trâmite no âmbito do Supremo Tribunal Federal”, referindo-se aos inquéritos contra figuras com foro privilegiado no STF, caso de Cunha.
PublicidadeEnredo
O depoimento foi prestado por Julio Camargo nesta quinta-feira (16) em Curitiba, em uma das ações conduzidas pela Justiça Federal. Ele disse aos investigadores que o suposto operador do PMDB, partido de Cunha, no esquema de corrupção, Fernando Falcão Soares – o Fernando Baiano –, relatou que sofreu pressão de Cunha pelo pagamento da propina. Os recursos, segundo Camargo, foram obtidos por meio de compras de navio-sonda.
O lobista e ex-consultor da Toyo Setal disse ter ido ao apartamento do deputado no Leblon, bairro nobre do Rio de Janeiro, para discutir a negociata. “Fui bastante apreensivo. O deputado Eduardo Cunha é conhecido como uma pessoa agressiva, mas confesso que comigo foi extremamente amistoso, dizendo que ele não tinha nada pessoal contra mim, mas que havia um débito meu com o Fernando do qual ele era merecedor de 5 milhões de dólares. E isso estava atrapalhando, porque estava em véspera de campanha – se não me engano uma campanha municipal, e que ele tinha uma série de compromissos e que eu vinha alongando esse pagamento há bastante tempo, e que ele não tinha mais condição de aguardar”, relatou Camargo, em uma das ações penais em trâmite na 1ª instância da Justiça Federal no Paraná.
Arrolado pelo Ministério Público Federal como testemunha de defesa de Fernando Baiano, que seria ligado a Cunha, Camargo descreveu como foi o relato do operador do PMDB. “Julio, realmente nós estamos com um problema, porque eu estou sendo pressionado violentamente, inclusive, pelo deputado Eduardo Cunha. Isso aí vai chegar numa situação muita embaraçosa para mim, mas para você, com certeza vai ser muito mais embaraçosa”, acrescentou o delator, reproduzindo a fala de Fernando Baiano.
Camargo continua: “Eu falei, bom, eu estaria à disposição para conversar com o deputado Eduardo Cunha explicar o que está acontecendo. Ele falou: Julio, ele não quer conversar com você. Ele quer receber”, emendou o delator.
Mencionando o então ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão, atualmente senador pelo PMDB do Maranhão, Camargo revelou ainda o porquê do pedido de propina. Ele disse que se reuniu com Lobão no Rio de Janeiro e, na ocasião, mostrou-lhe a cópia de um requerimento de informações da Câmara subscrito por uma deputada aliada de Cunha. No que seria uma forma de achaque, o documento solicitava informações sobre contratos firmados entre a Petrobras e a Mitsui, empresa à época representada por Camargo.
Um vídeo com as declarações do lobista foi amplamente veiculado na imprensa e nas redes sociais nesta quinta-feira (veja aqui). Quando um investigador pergunta ao depoente sobre a menção à agressividade de Cunha, Camargo explica: “Agressivo não no tipo físico. Diria mais sob o ponto de vista verbal. Uma pessoa que tenta lhe constranger, lhe colocar a corda no pescoço, no sentido de possuir as ideias”, arrematou.
Leia a nota de Eduardo Cunha:
“Com relação à suposta nova versão atribuída ao delator Júlio Camargo, tenho a esclarecer o que se segue:
1- O delator já fez vários depoimentos, onde não havia confirmado qualquer fato referente a mim, sendo certo ao menos quatro depoimentos.
2- Após ameaças publicadas em órgãos da imprensa, atribuídas ao Procurados Geral da República, de anular a sua delação caso não mudasse a versão sobre mim, meus advogados protocolaram petição no STF alertando sobre isso.
3- Desminto com veemência as mentiras do delator e o desafio a prová-las.
4- É muito estranho, às vésperas da eleição do Procurador Geral da República e às vésperas de pronunciamento meu em rede nacional, que as ameaças ao delator tenham conseguido o efeito desejado pelo Procurador Geral da República, ou seja, obrigar o delator a mentir.
Deputado Eduardo Cunha
Presidente da Câmara dos Deputados”
A nota da Procuradoria-Geral da República:
“Nota de esclarecimento
A Procuradoria-Geral da República esclarece que o depoimento prestado na presente data por Júlio Camargo à Justiça Federal do Paraná não tem qualquer relação com as investigações (inquéritos) em trâmite no âmbito do Supremo Tribunal Federal. A audiência referente à ação penal da primeira instância – que tem réu preso, ou seja, tem prioridade de julgamento – foi marcada pelo juiz federal Sergio Moro há semanas (em 19 de junho), a pedido da defesa de Fernando Soares, e a PGR não tem qualquer ingerência sobre a pauta de audiências do Poder Judiciário, tampouco sobre o teor dos depoimentos prestados perante o juiz.”