Lúcio Lambranho
Déficit financeiro de R$ 34,5 milhões, em 2005, gastos de R$ 42 milhões com cartões corporativos e viagens, e transferência de recursos para duas ONGs envolvidas em escândalos recentes do governo Lula – a Unitrabalho e o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBDS). Esses foram apenas alguns dos questionamentos que o presidente da Fundação Banco do Brasil (FBB), Jacques Pena, teve de responder ontem (7) aos senadores da CPI das ONGs.
O senador Alvaro Dias (PSDB-PR), que preparou um dossiê sobre a FBB, também quis saber sobre o projeto Barraginhas, tecnologia apoiada pela fundação do Banco do Brasil em várias regiões do país. Isso porque Pena tem em barragem idêntica em seu sítio de oito alqueires em Luziânia (GO), no entorno de Brasília. O senador tucano questinou se a barragem havia sido construída na propriedade com dinheiro público ou da própria FBB.
“Sou uma pessoa muito bem remunerada. É uma coisa pessoal que o senador manipulou”, respondeu Pena ao ser questionado por jornalistas ao final da audiência pública da comissão de inquérito.
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As fotos da Fazenda de Pena foram publicadas num site que classifica a instalação de “três tecnologias da Embrapa” como “uma bela vitrine no Planalto Central”. Minutos depois do depoimento de Pena, o site retirou do ar as fotos do sítio do presidente da FFB.
“As perguntas foram feitas para iniciar uma investigação. Não posso afirmar que a obra foi feita com dinheiro público, mas a CPI não pode deixar de checar. Principalmente porque as relações com a Unitrabalho e o IBDS também não estão totalmente explicadas”, disse ao Congresso em Foco o senador do PSDB.
PublicidadeO IBDS, como revelou com exclusividade este site no último dia 23, é uma ONG de Brasília suspeita de intermediar o suposto pagamento de propina no caso Gtech (leia mais). Investigada pela CPI dos Bingos, o IBDS e as relações do presidente da entidade, Fábio Rodrigues Rolim, são consideradas peças-chaves pelo Ministério Público Federal (MPF) na investigação sobre a polêmica renovação do contrato de R$ 650 milhões, em abril de 2003, entre a multinacional de processamento de loterias e a Caixa Econômica Federal.
No contrato com a Fundação Banco do Brasil (FBB), que resultou em dois pagamentos ao IBDS no total de R$ 50 mil, o produto entregue foi um plano de negócios para um projeto da Universidade de Brasília (UnB).
Segundo nota da FBB, o convênio não foi feito diretamente com a ONG, mas com a Fundação Universitária de Brasília (Fubra). “Para seu conhecimento, o pagamento é efetuado na conta do prestador de serviço, pela Fundação Banco do Brasil, conforme dispõem os normativos e o convênio que regem o projeto”, diz a nota da FBB.
O plano de negócio, peça de planejamento usado por empresas de todos os portes, seria destinado ao Projeto Tecbor. Um dos vencedores do Prêmio Chico Mendes de Meio Ambiente, o Tecbor é desenvolvido desde 1997 pelo Instituto de Química (IQ) da UnB.
Na prática, os pesquisadores ensinam às famílias de seringueiros da Amazônia uma técnica de produção da borracha com menor impacto ambiental e com ganhos para a saúde dos trabalhadores.
Aos senadores, Pena reiterou que a parceria teve como objetivo a realização do plano de negócios. “Se essa ONG teve problemas em outras áreas, isso não tem relação com a Fundação Banco do Brasil”, insistiu o presidente da FBB. “Pedimos o estudo e vimos que não tinha viabilidade para investir no projeto”, completou Pena. O Tecbor foi um dos premiados, em 2001, na área de tecnologia social.
Unitrabalho
A Fundação Interuniversitária de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho (Unitrabalho), que recebeu R$ 4 milhões da FBB e mais R$ 18 milhões do governo federal, é pivô da tentativa frustada de compra do chamado dossiê tucano na campanha eleitoral do ano passado.
A ONG é ligada a Jorge Lorenzetti, então assessor de Risco e Mídia da campanha de reeleição do presidente da República. Considerado o churrasqueiro preferido de Lula, Lorenzetti e outros petistas, apelidados de “aloprados” pelo próprio presidente, foram acusados de tentar negociar a compra de um dossiê que envolveria candidatos do PSDB com a máfia dos sanguessugas.
Os contatos dos envolvidos no Banco do Brasil eram o então diretor de Gestão de Risco do BB, Expedito Veloso, e o presidente da FBB, Jacques Pena.
Pena foi administrador da cidade-satélite de Samambaia, no governo petista do senador Cristovam Buarque (PDT-DF). Segundo Alvaro Dias, o presidente da FBB tem relações com Waldomiro Diniz, um dos acusados de ter recebido propina no caso Gtech.
Pena não respondeu à pergunta do senador se era amigo de Expedito Veloso. Disse apenas que os convênios com a Unitrabalho tinham sido orientados pelo Ministério do Turismo. A assessoria do senador não se convenceu, justamente porque Pena enfatizou durante todo o seu discurso que a FBB tinha autonomia nas contratações de ONGs.
Prejuízo e viagens
As informações sobre o prejuízo de quase R$ 35 milhões da FBB estão publicadas no site da instituição. O relatório também mostra gastos de R$ 11 milhões com cartões corporativos e mais R$ 31 milhões com viagens. O gasto das viagens que, segundo Pena, seriam de acompanhamento dos mais de mil projetos atendidos pela fundação, foi incorporado no balanço de 2006 junto com os investimentos sociais.
No depoimento à CPI, o presidente da FBB negou, inicialmente, que a entidade tivesse registrado déficit. Mas, confrontado com dados publicados pela própria fundação, voltou atrás. Os gastos, declarou, não cabiam nas despesas administrativas que giravam em torno de R$ 3 milhões. De fato, o balanço da FBB registra gastos de R$ 2,6 milhões em 2005, quando essas duas rubricas de despesa não são computadas.
O senador Alvaro Dias já pediu informações sobre os contratos e prestação de contas com o IBDS e a Unitrabalho, além de toda a contabilidade da FBB nos últimos quatros anos. Dias questionou Pena sobre os motivos de não ter havido publicação do balanço de 2006 no site da fundação assim como nos anos anteriores.
Em nota à imprensa (leia íntegra), a FBB contestou todos os dados apresentados pela assessoria do senador tucanos. “Foram mal interpretados, devido a equívoco de legenda de Relatório de Gestão de 2005, expressa incorretamente em milhares e não unidades de Real”, diz o texto.
Os gastos com cartões de crédito, em 2005, segundo a FBB, foram de R$ 10.710,00, com o cartão empresarial, e de R$ 30.654,00 com o cartão Visa Viagens. Sobre o déficit, a nota justifica que houve doação de R$ 40 milhões do Banco do Brasil.
“Assim, dado que a execução do orçamento de dispêndios de 2005 gerou despesas contábeis naquele exercício e, como parte dos recursos que lhe deram lastro foi apropriada como receita no exercício anterior, contabilmente houve em 2005 déficit de R$ 34.519.000,00 (trinta e quatro milhões e quinhentos e dezenove mil reais)”, diz a nota.