Ricardo Ramos
A CPI do Mensalão chega hoje ao ponto mais alto de suas investigações com a megaacareação que vai colocar lado a lado os principais personagens do escândalo com sacadores dos quatro partidos da base do governo Lula atingidos pela crise: PP, PT, PTB e PL. Pela primeira vez juntos, o tesoureiro recém-expulso do PT, Delúbio Soares, o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza e a diretora financeira da SM&B, Simone Vasconcelos. O trio ficará ao lado dos beneficiários para esclarecer quanto foi sacado, quem e por que sacou recursos das contas do empresário mineiro.
A discrepância entre os valores declarados pelos convocados para a acareação é enorme. A diferença entre os valores mínimos retirados de saques no Banco Rural e os máximos é de um para três. Se fossem considerados os menores valores, os saques somariam R$ 6,1 milhões. Considerando-se os maiores, chega-se à cifra de R$ 19,6 milhões.
Delúbio, Valério e Simone passarão todo o dia no auditório da comissão. Um a um, a partir das 10h, serão chamados cinco envolvidos no mensalão. Do PL, o presidente do partido, Valdemar Costa Neto, que renunciou ao mandato de deputado em agosto, e o ex-tesoureiro Jacinto Lamas. Do PP, o ex-assessor da liderança do partido João Cláudio Genu, Do PTB, o ex-tesoureiro Emerson Palmieiri. Do PL, José Luiz Alves, ex-chefe-de-gabinete do ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto. E do PT, Manoel Severino dos Santos, ex-presidente da Casa da Moeda e tesoureiro da campanha da petista Benedita da Silva ao governo do Rio, em 2002.
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A megaacareação foi marcada para elucidar as contradições apresentadas por eles em seus respectivos depoimentos no Congresso. Simone e Valério entregaram listas com valores e destinatários distintos dos saques feitos das contas da empresa à Polícia Federal. O próprio Delúbio, que entrou com pedido de habeas-corpus preventivo para não ser preso, em caso de se auto-incriminar, também já deu às CPIs dos Correios e do Mensalão declarações contraditórias sobre valores de saques autorizados.
“Quem entregou nos valores em dinheiro diz que entregou tal quantia. Quem recebeu, diz que recebeu, mas as quantias não batem”, observa o relator da CPI, deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG). A prova de fogo para os beneficiários também deve colocar em xeque, mais uma vez, a versão de que os empréstimos tomados por Valério foram contraídos, a pedido de Delúbio, para financiar campanhas de partidos da base aliada.
Sugestões
Anteontem, o empresário Marcos Valério apresentou um conjunto de sugestões aos parlamentares para tornar “mais eficiente e produtiva” a megaacareação da CPI do Mensalão. No texto encaminhado à CPI, o empresário sugeriu cinco procedimentos para “contribuir para o êxito das investigações”:
1) Os registros de entrada e saída da agência do Banco Rural, em Brasília, dos acareados; 2) os recibos dos saques assinados por eles nas agências do banco em Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro; 3) os e-mails e faxes trocados por Simone Vasconcelos entre as agências do banco nas três cidades, com as autorizações de saques; 4) os registros de entrada, presença ou estada nos hotéis Gran Bittar, Nacional e Blue Tree de Brasília e Blue Tree, Sofitel, Intercontinental e Paulista Plaza em São Paulo, nas datas de saques; 5) por fim, os registros telefônicos, fruto das quebras de sigilo determinado pela CPI dos Correios, em nome de Valério, Simone e das sedes da SMP&B em Brasília e em Belo Horizonte.
Não se sabe se os parlamentares da CPI vão acatar as sugestões de Valério. Abaixo, o Congresso em Foco aponta contradições que serão postas à prova hoje durante a megaacareação:
PL
Valdemar Costa Neto
Jacinto Lamas
Há uma contradição do valor total sacado pelo partido declarado por todos os envolvidos. A relação entregue por Simone Vasconcelos à Polícia Federal Jacinto Lamas sacou, entre 16 de setembro de 2003 e 19 de fevereiro de 2004, R$ 2,4 milhões. Marcos Valério, por sua vez, informou à PF que o PL sacou entre 26 de fevereiro de 2003 até 3 de agosto de 2004. Em depoimento à CPI do Mensalão, contudo, Lamas disse que sacou R$ 1,3 milhão. Já Valdemar disse à mesma comissão que o PL recebeu R$ 6,5 milhões a pedido de Delúbio Soares. Valdemar disse que o dinheiro recebido de Valério custeou dívidas de campanha do partido nas eleições de 2002.
PP
João Cláudio Genu
A relação entregue por Simone Vasconcelos à Polícia Federal Genu sacou R$ 1,6 milhão, entre 17 de setembro de 2003 e 201 de janeiro de 2004. Segundo o empresário Marcos Valério, o assessor do PP sacou, entre 17 de setembro de 2003 e 5 de julho de 2004, R$ 4,1 milhões – parte desses recursos pela corretora Bonus-Banval. Em depoimento à CPI do Mnesalão, entretanto, Genu disse que só sacou R$ 700 mil das contas do empresário na agência do Banco Rural em Brasil. A versão do assessor do PP foi a quarta dada pela cúpula do partido desde o início da crise política (leia mais).
PTB
Emerson Palmieiri
Três grandes dúvidas pairam sobre o tesoureiro informal do PTB: os saques feitos no Banco Rural, o misterioso destino dado ao acerto milionário entre o partido e o PT para a campanha eleitoral de 2004 e a viagem para captar dinheiro para o PT e o PTB em Portugal. Segundo a lista de saques entregue pelo empresário Marcos Valério, Palmieiri sacou R$ 2,46 milhões, entre 16 de dezembro de 2003 e 12 de agosto de 2004. A lista da diretora-financeira da SMP&B, por sua vez, revela que ele retirou apenas R$ 200 mil entre os dias 7 e 14 de janeiro de 2004. Entretanto, o tesoureiro informal do PTB afirma que jamais sacou dinheiro das contas do Banco Rural. “Esse dinheiro jamais entrou no PTB”, disse à CPI do Mensalão.
Palmieri afirmou à CPI que o empresário Marcos Valério levou, em dinheiro vivo, R$ 4 milhões referentes ao acerto para a campanha eleitoral do PTB em 2004. Foram duas levas, segundo o tesoureiro do partido: uma de R$ 2,2 milhões e outra de R$ 1,8 milhão, no início de julho do ano passado. Por último, a viagem que Palmieri e Valério fizeram para supostamente captar recursos.
PT
Manoel Severino Santos
Na lista apresentada pelo empresário Marcos Valério à Polícia Federal, Manoel Severino sacou R$ 2,6 milhões entre 19 de agosto de 2003 e 5 de julho de 2004. Em depoimento à CPI do Mensalão, o ex-coordenador da campanha de Benedita da Silva, contudo, admitiu ter sacado apenas R$ 100 mil, que foi para a candidata ao governo do Rio.
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