Ricardo Ramos |
Apesar de faltar a assinatura de apenas cinco senadores para o início dos trabalhos, a auditoria da dívida externa brasileira deve continuar onde sempre esteve desde 1988: na Constituição. Bandeira erguida pelo PT na última eleição presidencial, a revisão dos valores desses contratos bilionários esbarra no próprio governo Lula e no desinteresse das lideranças partidárias pelo tema para, pela primeira vez, tentar sair do papel. Pelas contas da Frente Parlamentar de Acompanhamento da Dívida, 260 deputados e 22 senadores já assinaram o pedido para instalação de uma comissão parlamentar mista de inquérito (CPMI) para tratar do assunto. Há duas semanas, a coordenadora da frente, deputada Dra. Clair (PT-PR), ganhou um aliado de peso: o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE). "Quem não paga direito acaba pagando duas vezes", afirmou o progressista, que se comprometeu a cobrar o apoio do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Leia também Confiante nas futuras adesões, Dra. Clair já fala em entregar o pedido ao presidente do Congresso na próxima semana. Para isso, precisa aumentar de 22 para 27 o número de assinaturas recolhidas entre os senadores. Até o momento, contudo, Renan não se pronunciou sobre o assunto, segundo sua assessoria de imprensa. A disposição política dos senadores em abordar o assunto é, aparentemente, menor que a dos colegas da Câmara. “Isso é um assunto novo”, afirmou José Agripino Maia (RN), líder do PFL no Senado, que participou da elaboração da Carta Magna em 1988. “Nunca tratamos desse assunto na bancada, embora eu seja favorável a qualquer tema que esteja na Constituição”, ressalva. O tema também não foi discutido entre os representantes do PT e do PSDB nas duas Casas. Via judicial Diante do desinteresse dos congressistas em fazer valer a Constituição, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) decidiu entrar na briga pela realização da auditoria, no final do ano passado. Mas pela via judicial. O presidente nacional da entidade, Roberto Busato, cobrou explicações no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o motivo por que, até o momento, o Congresso Nacional não convocou a CPMI para tratar do assunto. “O endividamento externo restringiu a soberania brasileira, atingiu a dignidade da pessoa humana, dos brasileiros, e ainda impediu que fossem realizadas ações capazes de erradicar a pobreza”, sustenta a OAB, por meio de uma argüição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). A argüição foi distribuída ao ministro Carlos Britto, que pediu um parecer sobre o caso ao procurador-geral da República, Cláudio Fonteles. No dia 18 de fevereiro, Fonteles opinou contrariamente ao pedido da OAB. O procurador-geral sustentou que, como a auditoria da dívida constava do Ato das Disposições Transitórias da Constituição de 1988, não haveria violação de preceito fundamental – válido apenas, segundo Fonteles, para casos em que os próprios artigos da Constituição estejam sendo descumpridos. A argüição “(…) só pode ser acionada diante da violação de preceito fundamental, a ser especificado pelo STF diante das circunstâncias do caso”, diz o procurador-geral, em seu parecer. E acrescenta: “Assim, em análise do ato do Poder Público em questão, não sendo constatada preceito fundamental violado, não poderá a ADPF ser conhecida”. Em breve, o ministro do STF vai emitir o seu relatório sobre a matéria, para apreciação em plenário da Corte suprema. Assim como no Congresso, não há, porém, data marcada para uma decisão final sobre o assunto. |