O governo federal, por intermédio da Emenda à Constituição nº 95/2016, congelou o gasto público, em termos reais, por 20 anos, independentemente de haver ou não aumento de receitas e crescimento do PIB. É proibido gastar além do orçamento executado no ano anterior, corrigido pelo Índice Nacional de Preço ao Consumidor Ampliado (IPCA).
Com isso, sempre que a despesa ultrapassar o limite global haverá cortes em rubricas específicas, como pessoal, previdência, assistência social, entre outras. A única rubrica imune a cortes será a de pagamento de juros e amortização das dívidas internas e externas, exatamente porque a economia a ser feita com os cortes será integralmente destinada a ela.
Para dar consequência ou efetividade à E.C. 95, além do gatilho automático de corte de direitos e vantagens dos servidores, o governo propôs uma ampla reforma da previdência e da assistência social, com regras draconianas de acesso a benefícios pagos com recursos da seguridade social e do orçamento fiscal.
Ao limitar o crescimento do gasto, frente às crescentes necessidades de serviços públicos e de programas sociais, haverá um forte aumento do conflito distributivo. Como a disputa por recursos do orçamento sempre favorece os setores mais organizados ou com mais interlocução com o governo, já se sabe quem irá arcar com os prejuízos.
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Ora, como a alocação de recursos no orçamento congelado fica a cargo do governo e dos parlamentares, sem qualquer participação popular, o governo já escolheu o assalariado, o aposentado e o pensionista, cuja fonte de renda tem natureza alimentar, como a variável de ajuste. Ou seja, as perdas e prejuízos recairão sobre a parte mais fraca econômica, social e politicamente na relação com o governo e o mercado: os assalariados e dependentes de programas sociais.
Nos próximos 20 anos, portanto, se não for revogada a E.C. 95, os assalariados e aqueles que dependem de prestações ou de serviços do Estado serão os principais prejudicados, porque terão direitos cortados ou reduzidos e haverá piora na quantidade e na qualidade dos serviços públicos, como a saúde, a educação, a segurança, etc.PublicidadeAs políticas públicas dependem da orientação governamental. O próprio ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em artigo no jornal O Globo de 5 de fevereiro de 2016, reconheceu, como conhecimento de causa, que “adotar políticas que favoreçam mais ao capital do que ao trabalho, ou vice-versa, depende da orientação política do governo”. E a orientação do governo Temer é clara em favor do capital.
A opção preferencial do governo pelo rentismo – detentores de títulos públicos – além dos assalariados, também prejudicará o setor produtivo, cujos incentivos fiscais e creditícios poderão sofrer cortes, naturalmente após a redução ou eliminação do que ainda resta de Estado de Bem-Estar Social.
Todos estamos de acordo sobre a necessidade e até urgência de saneamento das contas públicas, inclusive para manter sustentável a função social do Estado, mas os sacrifícios devem ser distribuídos para todos e de modo proporcional à capacidade contributiva de cada um. Fazer do modo como está sendo feito, escolhendo quem vive de salário, de aposentadoria e de pensão ou que depende de políticas públicas e de programas governamentais para arcar com os cortes, é uma atitude, além de injusta, perversa.
A população precisa ser consultada sobre o conteúdo do ajuste. Se for, como tudo indica, atendendo apenas o desejo e a pauta do mercado e do rentismo, os eleitores serão implacáveis em 2018 com os governantes e parlamentares que aprovarem essa agenda de reformas em bases neoliberais.
Os parlamentares que irão votar essas reformas, especialmente a trabalhista e a previdenciária, cujo objetivo central é cortar ou reduzir direitos, precisam ser alertados de que não dispõem mais de financiamento empresarial de campanha para comprar votos, e se votarem contra os interesses dos eleitores não terão qualquer chance de reeleição em 2018. Ou os potenciais prejudicados com essas reformas saem da zona de conforto e pressionam seus representantes, ou o retrocesso, com a transferência do orçamento dos mais pobres para os mais ricos, será inevitável.