Não importa se a prova era de português, direito constitucional e administrativo, raciocínio lógico ou inglês. Não importa se o candidato buscava ser consultor legislativo na área de agricultura ou de transportes. Qualquer que fosse a hipótese, duas coisas eram certas no concurso do Senado, realizado no último domingo (11). A primeira: quem fosse aprovado, passaria a ganhar um salário de quase R$ 24 mil. A segunda: a resposta certa para a primeira pergunta de qualquer uma das provas citadas acima, para qualquer um dos cargos, era letra “D”. Da mesma forma, a resposta em todos os casos para a segunda pergunta era letra “B”. E a coincidência seguia para 50 das 80 questões de todas as provas em todos os cargos de consultor legislativo. Em todas, a resposta para a questão de número 50 também era a mesma: letra “B”. Somente a partir daí, quando as provas deixam de cobrar um conteúdo geral e passam a cobrar conteúdo específico para cada área, é que os gabaritos mudam. Assim, se alguém possuísse o gabarito de qualquer uma das provas, poderia se habilitar a qualquer cargo, e acertar mais da metade da prova, porque, independentemente do conteúdo, a resposta era exatamente a mesma.
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É mais um grave item na sequência de problemas ocorridos com as provas do concurso do Senado desde o último domingo. Já no dia da prova, a Fundação Getúlio Vargas (FGV), responsável pelo concurso, teve que cancelar as seleções para três cargos. Depois, descobriu-se que várias das questões da prova foram literalmente copiadas de outros concursos. Agora, o Congresso em Foco/SOS Concurseiro descobre mais um escândalo, provavelmente o maior deles: para as 50 questões de conhecimentos não específicos cobrados nas provas de consultor legislativo, o gabarito é exatamente o mesmo.
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O posto mais cobiçado do Senado, de consultor legislativo, oferece nove vagas imediatas e formação de cadastro de reserva e remuneração inicial de R$ 23,8 mil. Cada um dos 8.607 inscritos desembolsou R$ 200 para participar da seleção, o que rendeu R$ 1,7 milhões de arrecadação para a organizadora.
Conforme apuração do SOS Concurseiro/Congresso em Foco, as respostas às questões aplicadas do concurso, divulgadas na última quarta-feira, permitiam que qualquer candidato respondesse igualmente às perguntas de português, conhecimentos gerais, direito constitucional e administrativo, raciocínio lógico e inglês. Na sequência final da prova, haveria 30 questões de conhecimento específico. O mínimo para aprovação na área era acertar 18 das 30 questões. Ou seja: alguém que tivesse o gabarito e, graças a ele, acertasse todas as questões de conhecimentos gerais, só precisaria estudar para acertar 18 das 30 questões de conhecimento específico.
Não é a primeira vez que há problemas com a seleção dos futuros consultores. Como divulgou o SOS Concurseiro/Congresso em Foco em dezembro, o edital divulgado às vésperas do Natal continha conteúdo programático clonado do processo seletivo para o mesmo cargo realizado pelo Cespe em 2001. Na primeira semana de janeiro foi divulgado edital retificador (veja o que mudou no concurso do Senado).
Imoral
Na avaliação do professor de Direito Administrativo, Washigton Barbosa, não há ilegalidade em oferecer uma mesma prova a todos e não há obrigatoriedade de oferecer vários tipos de avaliações, a não ser que isso esteja previsto no contrato entre o órgão e a banca. “Pelo contrário, é esperado que exista isonomia na avaliação”. Porém, ele considera que oferecer quatro tipos de provas iguais é imoral. “Atitudes como esta facilitam a cola dentro da sala de prova e tornam o concurso vulnerável”.
Barbosa critica a simplificação do processo seletivo. “O que a FGV fez foi criar formas de reduzir o custo na prova: fazer um só tipo de prova com cores diferentes é mais barato do que imprimir vários tipos”, exemplifica. Outro fator que considera grave é o que chamou de uma maneira de “enganar o concurseiro” ao dispor de cores diferentes identificando o tipo de prova enquanto, na realidade, todos faziam as mesmas questões, na mesma ordem.
Outras irregularidades
Desde domingo, dia das provas, os candidatos relatam falta de organização e de segurança nos locais de prova, envelopes com cadernos de questões com lacres rompidos, falta de páginas, cadernos trocados, telefones celulares tocando durante a avaliação e erros de português nos enunciados. Parte das reclamações se transformou em boletins de ocorrência na 21ª Delegacia da Polícia de Brasília e foram parar na Polícia Federal, que garantiu investigar. Com a anulação das provas para os cargos de analistas legislativos nas áreas de enfermagem, análise de sistemas e análise de suporte de sistemas. Ao todo são cerca de 10,5 mil candidatos prejudicados diretamente que disputam 15 vagas.
Processos seletivos de, pelo menos, mais dois cargos também estão “contaminadas” por problemas. Conforme divulgou o Correio Braziliense, na edição da última sexta-feira, duas questões do cargo de analista da área de fisioterapia são idênticas às aplicadas no concurso da Prefeitura de Balnerário Camboriú (SC), em 2008, e da Eletronorte, em 2006, organizadas, respectivamente, pelas empresas Fepese e NCE/RJ. E outras duas perguntas para médico urologista foram clonadas do caderno de questões da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, aplicadas em 2010.
Para o advogado especialista em concursos José Vânio Sena, a FGV ignorou o ineditismo. “Quando se contrata uma banca está implícito ao contratante que as questões serão inéditas”, explica. Ele detalha que as atitudes que estão sendo exposta pela imprensa contra a seleção devem ser levadas ao conhecimento do Ministério Público. “Todos os candidatos que se sentirem prejudicados devem levar o caso para o Ministério Público Federal”.
Ao longo da semana, mais denúncias chegaram ao conhecimento da Polícia Federal, e o Ministério Público Federal também decidiu investigar: vai avaliar se há irregularidades na contratação da banca por dispensa de licitação e a inscrição e depois expulsão do processo seletivo da servidora que integrava a comissão organizadora interna.
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