Após mais de nove horas de discussão, a comissão especial aprovou na madrugada desta sexta-feira (21), por 17 votos a quatro, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que prorroga a Desvinculação das Receitas da União (DRU) até o fim de 2015. Com o texto, o mecanismo, que se encerraria em 31 de dezembro, passa a valer para os próximos quatro anos. Uma das prioridades do governo para o fim do ano, a proposta pode ser votada na próxima quarta-feira (26) em plenário. Para isso acontecer, deverá haver acordo de líderes para a quebra do intervalo de cinco sessões previsto no regimento da Casa.
Atualmente, a União pode trabalhar livremente com 20% da arrecadação de todos os tributos federais existentes, mesmo os que tiverem vinculação constitucional. Ou seja, até verbas carimbadas, como para saúde e seguridade social, podem ser retiradas e usadas para outros fins. A exceção é para verbas da educação e para as transferências constitucionais, como os fundos de participação dos estados (FPE) e municípios (FPM). De acordo com o Ministério da Fazenda, R$ 61 bilhões do que está previsto no orçamento do ano que vem depende da manutenção da DRU.
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De acordo com o Ministério do Planejamento, 82% da atual receita já possui destino fixo. Ou seja, o dinheiro está vinculado a uma determinada área. O mecanismo, de acordo com o governo, permite investir em outras áreas. Na mensagem assinada pelos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior, o Executivo precisa da DRU, inclusive, para investimentos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e para as obras para a Copa do Mundo de 2014.
Para a oposição, no entanto, o governo ficou “viciado” na DRU. “Na época que foi criada, o país era extremamente deficitário”, afirmou o deputado Cesar Colnago (PSDB-ES). Mesmo deputados da base são contrários à matéria. Paulo Rubem Santiago (PDT-PE) diz se diferenciar do discurso feito pelos governistas e dos oposicionistas. Ele defende que os recursos para a seguridade social não possam ser atingidos pela DRU. Inclusive apresentou uma PEC sobre isso, que tramita em conjunto com a PEC 61/11 e foi rejeitada pelo relator.
Obstrução
Antes de começar a sessão, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), da base governista, sugeriu um acordo com a oposição. Ele conversou com demistas e propôs a votação do texto-base, deixando os destaques para a próxima semana. No entanto, foram os próprios governistas que não aceitaram. A pedido do Palácio do Planalto, receoso da postergação da votação, a presidência da comissão manteve toda a análise para hoje. De acordo com um parlamentar governista, a determinação do Planalto é não arriscar e, aproveitando o quorum suficiente e a maioria aliada, garantir a aprovação da proposta.
Com a tentativa fracassada de acordo, a oposição tentou várias formas para obstruir a votação da PEC. Primeiro questionou o erro na leitura da ata. Inicialmente, o deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) foi colocado como suplente nas reuniões anteriores. Porém, ele não fazia parte do colegiado até ser indicado hoje pelo partido como titular.
Outra forma de atrasar a votação foi a de orientar a bancada na votação até da discussão da ata. Depois, o fato de a TV Câmara não transmitir ao vivo a sessão. “O tema é lixo hospitalar. Tem tudo a ver com a DRU. O lixo hospitalar tem que ser incinerado, assim como a DRU”, disparou Ronaldo Caiado (DEM-GO). No mesmo momento, a emissora transmitia um programa de entrevistas sobre lixo hospitalar. Depois de quase 30 minutos de críticas, a TV Câmara começou a transmissão da sessão do colegiado.
Um requerimento pedindo a retirada de pauta foi apresentado. A bancada governista, em ampla maioria, conseguiu derrubar o pedido do DEM e manteve a votação para hoje à noite. “É uma obstrução de uma nota só. Não há o interesse em discutir a matéria. Estamos dispostos a varar a noite para votar a matéria. É uma medida fundamental até para lidar com a crise mundial”, disse o deputado José Guimarães (PT-CE).
Após o requerimento, como forma de consumir mais tempo, o DEM pediu verificação de quorum – o que exige chamada nominal de cada um dos integrantes – e entrou novamente em obstrução. Na sequência, um pedido do PSDB para adiar a votação pelo prazo de oito sessões também foi derrubado. “O governo está cerceando a oposição na tentiva de aprovar uma liberação para o presidente da República de R$ 100 bilhões que o cidadão paga para aplicar de acordo com seus interesses”, criticou Caiado.
Oposicionistas tentam obstruir votação da DRU
Governo tem dificuldades para aprovar a DRU
Processo
Outra tentativa da oposição foi apelar para o parágrafo 1 do artigo 136 do regimento interno. O dispositivo prevê que o “processo referente a proposição ficará sobre a mesa durante sua tramitação em plenário”. Com o relator, estava o relatório e o avulso da proposta. No entanto, o presidente da comissão, Junior Coimbra (PMDB-TO), negou. O peemedebista disse que o processo original – com o texto enviado pelo governo, avulsos, emendas, etc – deve estar somente na votação em plenário.
“Eu não vou cair na baixaria que a oposição está promovendo”, respondeu o relator da PEC, Odair Cunha (PT-MG), após ouvir as críticas da oposição por quase duas horas. Depois de muita discussão por conta de onde estava o processo original, uma assessora do petista trouxe a pasta com os arquivos. “Eles estavam com a Consultoria da Câmara e agora estão aqui sobre esta mesa. Podemos continuar”, concluiu.
A oposição tinha apresentado dois destaques supressivos. No entanto, eles acabaram retirados. Os quatro integrantes do DEM na comissão, então, apresentaram votos em separado, todos derrubando a DRU. Foi uma forma de tentar retardar a votação e segurar a maioria governista. A estratégia conseguiu segurar a sessão até 4h30 de hoje, mas não foi suficiente para derrubar a proposta.
Votação da DRU terá análise de dois destaques
Colaborou Fábio Góis