Iara Bernardi*
Mais um mês de março e, com ele, inicia-se a passagem de uma data muito significativa para as mulheres de todo o mundo: o Dia Internacional da Mulher. Quando analisamos a questão feminina retrospectivamente, causa-nos enorme entusiasmo perceber o quanto avançamos nas últimas três décadas.
Há mais de 25 anos trabalhando pelos direitos femininos, percebo, porém, que temos lados distintos da luta: grandes vitórias e situações espantosas que não acompanham essa evolução. Lembrar das conquistas é muito bom para todas nós, brasileiras. A contar de 1932, quando passamos a ter direito ao voto, muito se evoluiu. A inserção das mulheres no mercado de trabalho, a ampliação da participação feminina nas esferas de poder e na política, além da criação dos conselhos e delegacias da mulher são progressos que valem a pena ser lembrados.
Pesquisa da Fundação Perseu Abramo registra que uma a cada cinco brasileiras (19% da população feminina) afirma ter sido agredida por homens – fisicamente, psicologicamente ou na forma de assédio sexual – e mais da metade delas assume que não procurou ajuda. Diante do progresso que já tivemos em relação à estrutura de apoio às mulheres, com a criação das delegacias especializadas e das casas abrigo por exemplo, este é um dos dados que mais nos espantam. Porém, quem trabalha com mulheres nessa situação conhece os motivos da omissão.
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Existem peculiaridades em relação à mulher agredida no âmbito familiar. Na maioria dos casos, a vítima é tomada inicialmente pela vergonha, se negando a expor o problema para amigos ou autoridades policiais. Se a situação foge do controle e a vítima percebe que não há outra solução senão a denúncia, surge outro sentimento: o medo de estar sozinha, de sofrer ameaças, dos filhos ficarem sem a referência masculina. A mulher é aquela que exerce o papel de preservar o núcleo familiar e, para ela, a solução ideal é que o agressor mude sua postura e seus atos, e não que saia de casa.
Para combater essa triste realidade, o governo Lula, por meio da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, tem trabalhado ações afirmativas. A primeira concretizou-se em 2004, com o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, que reúne 198 propostas voltadas à promoção da igualdade de gênero e atendimento às necessidades femininas. Fazem parte das metas do plano até 2007 a ampliação do acesso das mulheres ao mercado de trabalho e ao crédito, a redução da taxa de analfabetismo feminino, a ampliação das ações de planejamento familiar, o aumento de delegacias da mulher, dentre outros. Como o plano envolve ações principalmente nos municípios (onde a violência acontece), o comprometimento das prefeituras com as metas estabelecidas é muito importante.
Complementando o plano, o Executivo também enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei 4559/2004, que trata a violência doméstica específica contra a mulher, de forma abrangente, envolvendo numa mesma lei as questões de apoio à vítima, reabilitação do agressor, forma de atendimento policial e de saúde para casos de agressões domésticas, dentre outras ações. Este PL foi amplamente discutido em audiências pelo país, promovidas pela bancada feminina, e já temos o compromisso do presidente da Câmara, deputado Aldo Rebelo, de colocá-lo na pauta de votações nesta semana do Dia Internacional da Mulher.
Continuamos lutando sabendo que ainda temos muito a conquistar. Apesar das diferenças salariais, ainda absurdamente registradas pelo país, as mulheres já dominam o mercado de trabalho, por sua competência, protagonismo e por representarem mais de 50% da população brasileira. Direitos garantidos por lei? Apesar de ainda a passos lentos, felizmente nossa legislação vem caminhando nesse sentido. Combater a violência contra a mulher? Este sim é o tema que hoje merece a atenção de toda a sociedade, pois o número de mulheres agredidas, espancadas e, muitas vezes, mortas apenas por “serem mulheres” cresce a cada dia.
* Iara Bernardi é deputada federal (PT-SP), psicóloga e coordenadora da Bancada Feminina no Congresso Nacional.