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Como são necessários 257 votos (maioria absoluta do número total de deputados) para a Câmara declarar a perda de mandato de um de seus integrantes, faltaram 24 votos para a cassação de Natan Donadon, decretada pelo Supremo Tribunal Federal, ser mantida.
A votação durou aproximadamente quatro horas. Dos 469 deputados presentes, 405 votaram. Quando o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), anunciou o fim da coleta de votos, Natan Donadon estava com as mãos tapando os olhos. Após o resultado sair no painel, ele se ajoelhou no plenário, levantou as mãos para o céu e começou a rezar. Na sequência, comemorou com a família a manutenção do mandato. “A Justiça está sendo feita”, afirmou Natan.
“A Câmara dos Deputados está de luto”, afirmou o líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR). Para o deputado paranaense, a decisão de levar o caso a plenário foi infeliz. “Foi uma atitude infeliz que desgasta ainda mais o Parlamento. Essa votação só vai produzir um resultado de descrença para a Câmara dos Deputados”, comentou o líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO). Já o líder do Psol, Ivan Valente (SP), entende que o resultado seria outro se o voto fosse aberto.
A sessão
Aberta às 19h, a sessão começou com o relator do processo na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Sérgio Zveiter (PSD-RJ), reforçando a necessidade da cassação. Na semana passada, o colegiado aprovou o pedido para Natan perder o cargo. “A sociedade tem o direito de receber uma resposta da Câmara. Devemos impedir que a sensação de impunidade se alastre”, afirmou deputado fluminense.
Depois de Zveiter, falaria o advogado do agora ex-deputado, Gilson Stefanes. Ele abriu mão e deixou seu cliente discursar. Em uma intervenção emocionada, usando mais do que os 25 minutos permitidos pelo regimento interno da Câmara, Natan contou sobre seu dia a dia na Penitenciária do Distrito Federal 1, dentro do Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília. Disse que hoje, inclusive, faltou água para tomar banho.
“Só a verdade me trouxe aqui. Eu não viria aqui se não tivesse a verdade. Não adiantaria nada eu vir aqui hoje para mentir”, disse Natan ao subir na tribuna. Depois de falar sobre a família, dos filhos, criticou a ação do Ministério Público de Rondônia que resultou na sua condenação. Também reclamou do seu julgamento no STF e apontou, na sua visão, erros na condução do caso.
“Nunca fiz nada de ilícito. Nunca desviei um centavo da Assembleia Legislativa de Rondônia”, disparou. “Vejam minha declaração de Imposto de Renda. No meu terceiro mandato, eu só tenho uma casa”, ressaltou. Para ele, o Ministério Público local “escolheu as provas” que resultaram na sua condenação. “As provas para me condenar vieram para o Supremo. Mas as provas para me absolver não vieram. Quebrem o sigilo bancário das empresas! O Ministério Público de Rondônia sabe que o serviço foi executado. Se quisessem descobrir, era simples.”
Durante o discurso, criticou a postura da relatora da ação penal, Cármen Lúcia, que reprovou o fato de Natan, na legislatura anterior, ter renunciado um dia antes do julgamento no STF. “Por que renunciei? Porque é o meu direito!”. Usando esse expediente, Natan Donadon pôde concorrer e terminou sendo reeleito.
Para participar da sessão, o advogado de Natan precisou pedir autorização da Vara de Execuções Penais de Brasília. Com a permissão da Justiça, o diretor do presídio mobilizou agentes do Grupo Penitenciário de Operações Especiais (GPOE) para escoltarem Natan até a Câmara dos Deputados. Ao chegar no prédio, deixaram o ex-deputado sob responsabilidade da Polícia Legislativa, que montou um esquema especial para ele chegar até o plenário sem ser percebido pela imprensa.
R$ 4 milhões em gastos
Desde a condenação de Natan, em 28 de outubro de 2010, até o início de julho, quando a Câmara retirou dele o apartamento funcional e o pagamento de salários e verba de gabinete, a Câmara gastou R$ 4 milhões com o deputado, em remuneração e demais benefícios. Somente em vencimentos foram R$ 962 mil. Em 29 meses de mandato, desde a condenação, ele recebeu 36 salários de R$ 26,7 mil, incluindo vencimentos mensais, 13º, 14º e 15º salários.
Outros R$ 893,4 mil foram destinados a ele na forma de ressarcimento para cobrir despesas associadas ao mandato, como aluguel de carro, combustíveis, alimentação, hospedagem e divulgação de suas atividades, o chamado cotão. O parlamentar teve mais R$ 2 milhões para gastar com funcionários que serviam em seu gabinete na capital federal e no escritório político em Rondônia.
Natan Donadon foi condenado porque, conforme entendeu o Supremo Tribunal Federal, acatando denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República, fez parte de um esquema que fraudou licitações para contratos de publicidade da Assembleia Legislativa de Rondônia entre 1998 e 1999, lesando em os cofres públicos em R$ 8,4 milhões. Dois anos e meio após a condenação, o STF rejeitou um embargo apresentado pela defesa do deputado e determinou o trânsito em julgado do processo – ou seja, a impossibilidade de recurso e, por seguinte, de reversão da condenação – e a expedição do mandado de prisão. Em 28 de junho, o deputado se entregou à Polícia Federal em Brasília. Desde então está preso na Penitenciária do Distrito Federal 1 (PDF), na capital federal.
Os aspectos jurídicos
Como acabou a possibilidade de recursos, a Constituição Federal prevê, no parágrafo 2º do artigo 55, que a perda do mandato será decidida pela Câmara “por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”. Foi esse o caminho seguido pelo presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves. No entanto, ele recebeu pareceres jurídicos que lhe apontavam uma outra alternativa: a declaração da perda de mandato “por ato de ofício” da Mesa Diretora da Câmara – isto é, sem ouvir o plenário.
Na sessão em que foi rejeitada a cassação de Natan Donadon, vários parlamentares se pronunciaram nesse sentido. A Mesa alega, contudo, que manter a cassação por ato de ofício não encontrava amparo na Constituição Federal.
Em 12 de agosto, Zveiter apresentou seu relatório recomendando a cassação de Natan. Ele considera a situação “gravíssima”. Para o parlamentar fluminense, o deputado preso “perdeu a condição de permanecer como parlamentar” na Câmara. Na semana passada, os integrantes da CCJ aprovaram o parecer pela cassação por maioria dos votos – 39 a 16.