O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), determinou a criação de uma comissão especial para analisar o projeto de lei que trata do abuso de autoridade. A proposta chegou há cerca de seis meses na Casa e estava engavetada desde então. O projeto passa a ser discutido em regime de urgência na esteira do arquivamento das duas denúncias apresentadas pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot contra o presidente Michel Temer (PMDB). Durante os debates na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da análise dessa segunda denúncia, por organização criminosa e obstrução de Justiça, os deputados da base do governo fizeram enfáticas críticas ao que chamaram de tentativa de “criminalizar a política e os partidos”. O texto endurece punição a autoridades, como juízes e procuradores, que forem acusadas de abusar de suas prerrogativas.
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Enquanto o projeto, que é criticado por juízes e procuradores ligados à Lava Jato, seguirá com prioridade na Câmara, a matéria que prevê o fim do foro – que pode atingir quase 200 deputados que são alvos de inquéritos e ações penais no Supremo Tribunal Federal (STF) – está parada na Casa desde maio. O texto está parado na Comissão de Constituição e Justiça ( CCJ).
Levantamento do Congresso em Foco mostra que pelo menos 96 deputados que respondem a algum inquérito ou ação penal no STF votaram a favor do relatório do deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) nesta quarta-feira (25), recomendando a suspensão da ação penal até o fim do mandato de Temer. Entre esses, 25 já se tornaram réus na Corte.
A proposta de emenda à Constituição (PEC) do fim do foro privilegiado andou com celeridade no Senado no primeiro semestre de 2017 e foi aprovada por unanimidade em dois turnos na Casa – 75 a 0 na primeira votação e 69 a 0 na segunda. O texto prevê o fim da prerrogativa no caso de crimes comuns para deputados, senadores, ministros de Estado, governadores, ministros de tribunais superiores, desembargadores, embaixadores, comandantes militares, integrantes de tribunais regionais federais, juízes federais, membros do Ministério Público, procurador-geral da República e membros dos conselhos de Justiça e do Ministério Público. Estima-se que cerca de 54 mil pessoas perderiam a prerrogativa de serem julgadas pelos tribunais superiores.
A matéria foi encaminhada à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, onde chegou no dia 26 de junho. Lá, ficou dois meses à espera de um relator, que só foi escolhido no fim de agosto. Efraim Filho (DEM-PB), o relator escolhido, também é relator de outras duas PECs com a mesma temática. Ele apresentou voto pela constitucionalidade da matéria no fim de setembro, mas a proposta ainda não foi pautada na comissão.
Além de passar pela CCJ, a PEC também deve ter apoio de 308 deputados, equivalente a três quintos da Casa, em dois turnos de votação. Se os deputados decidirem modificar a proposta, ela deve voltar ao Senado e ser chancelada por pelo menos 49 senadores antes de seguir para sanção presidencial.
“Retaliação”
A proposta de abuso de autoridade veio do Senado com um texto produzido a partir de duas proposições que tramitavam na Casa: o PLS 280/16, de autoria do senador Renan Calheiros; e o PLS 85/17, apresentado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que se originou de sugestões elaboradas pelo Ministério Público Federal. As duas propostas foram apensadas e tramitarão juntas.
A proposta de Renan foi uma resposta a outra decisão do Judiciário na época, no fim do ano passado. Ele desengavetou um projeto originalmente apresentado em 2009 após o Supremo Tribunal Federal ter tentado afastá-lo do Senado e após ser denunciado pela primeira vez no âmbito da Lava Jato. O projeto foi relatado por Roberto Requião (PMDB-PR) e enfrentou resistência no Judiciário, inclusive do juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da Lava Jato no Paraná e dos coordenadores da força-tarefa da operação, que a classificaram como “uma vingança”.
O debate foi resgatado em março deste ano, quando Janot enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedidos de abertura de inquérito com base em delações premiadas de executivos e ex-executivos da Odebrecht. A proposta passou no Senado por 54 votos a 19 e uniu peemedebistas e petistas.
A proposta final que chegou à Câmara lista 37 ações que poderão ser consideradas abuso de autoridade, quando praticadas com a finalidade específica de prejudicar alguém ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro. Entre elas, obter provas por meios ilícitos; executar mandado de busca e apreensão mobilizando pessoal ou armamento de forma ostensiva, para expor o investigado a vexame; e decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado sem intimação prévia de comparecimento ao juízo.
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