Mas o regimento tem sido cumprido? Os parlamentares têm sentido no bolso pelas faltas em plenário? O Truco no Congresso – projeto de fact-checking da Agência Pública, feito em parceria com o Congresso em Foco – foi atrás dos dados e constatou, em um levantamento exclusivo obtido por meio da Lei de Acesso à Informação, que realmente os descontos na folha de pagamento têm ocorrido.
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Segundo dados da Coordenação de Pagamento de Pessoal da Câmara, 288 deputados tiveram, juntos, R$ 1,437 milhão em cortes na folha de pagamento pelas 1.373 faltas registradas entre fevereiro e junho. Pelas regras, o parlamentar tem descontos proporcionais quando não justifica ausências a sessões no plenário ou, mesmo estando presente, a cada votação de que deixa de participar. O limite para o abatimento é de R$ 21.101,88, ou 62,5% da remuneração mensal de R$ 33.763.
O próprio Rodrigo Maia é um exemplo de que estar presente não significa receber o salário integralmente. Apesar de não ter perdido um único dia de sessões entre fevereiro e junho, o presidente da Casa deixou de receber R$ 1.507,28 em março. Além dele, 19 parlamentares tiveram desconto mesmo sem ter faltas não justificadas.
Outra situação que chama a atenção, criada pelas regras da Câmara, é a diferença entre os valores descontados para o mesmo número de faltas. Em maio, por exemplo, o abatimento para quem teve apenas uma falta oscilou de R$ 468,93 a R$ 1.406,79. Em fevereiro, ficou entre R$ 376,82 e R$ 1.507,28.
Isso acontece porque o valor máximo que pode ser descontado em um determinado mês – R$ 21.101,88 – é dividido pelo número de dias em que houve sessões deliberativas. E o valor de cada dia é novamente dividido pelo número de votações que aconteceram – já que o desconto na folha é feito por votação, não por dia. Assim, o parlamentar que deixa de votar uma vez em um dia com muitas consultas ao plenário perde menos dinheiro do que quando o faz em dias de trabalho menos intenso. PublicidadeAtestado
Como mostrou o Congresso em Foco no início do ano, 90% das faltas dos deputados em 2015 foram abonadas com o uso de atestados médicos. A explicação é simples: essa é a única forma de justificar uma ausência a qualquer tempo, sem prazo.
O campeão de faltas em 2015, Wladimir Costa (SD-PA), por exemplo, soma 38 descontos que diminuíram em R$ 36.306,81 os seus rendimentos em 2016 – o recorde do ano até agora. A assessoria do paraense informou que o deputado sofre de sequelas de duas cirurgias na coluna, tendo talvez de se submeter a uma terceira operação e, por isso, é tão ausente da Casa. Disse ainda que ele já providenciou documentação para pedir o abono de parte das faltas à Câmara.
Elcione Barbalho (PMDB-PA), por exemplo, teve 11 abatimentos em folha, perdendo R$ 9.214,98 este ano. Poderia ser muito mais, caso a deputada não tivesse justificado com atestados médicos 24 dos dias em que faltou. Segundo a assessoria, ela contraiu uma superbactéria e precisou se tratar em São Paulo, onde voltará a ficar internada em breve, pelo mesmo motivo.
Há casos mais nebulosos. Marinha Raupp (PMDB-RO), por exemplo, abonou 20 dias de faltas que teve entre fevereiro e junho – a Câmara teve 54 sessões – também devido a motivos de saúde. A assessoria informou que ela esteve doente, mas que foram “coisas de rotina” e que a deputada “já está 100%”. Insistimos em obter ao menos um nome de doença ou de exame, mas a assessoria não soube informar.
Sem abono
O segundo que mais perdeu dinheiro, Macedo (PP-CE), disse que não pretende abonar parte das faltas. “Na escolha das prioridades, é fundamental valorizar o povo. Precisei me ausentar do plenário da Câmara dos Deputados para atender demandas específicas em meu estado”, disse. O cearense teve descontados R$ 29.908,47, distribuídos em 24 abatimentos. As faltas decorrentes de atividades políticas fora da Câmara só podem ser perdoadas se o parlamentar estiver em missão autorizada.
Explicação parecida foi dada por Índio da Costa (PSD-RJ). “Sou candidato a prefeito no Rio de Janeiro e ao longo deste ano venho construindo um plano de governo junto com a sociedade carioca”, explica. Ele diz ainda que sequer vai procurar saber se a Câmara autoriza o abono – o que não ocorre nesses casos –, pois acha mais honesto não receber pelos dias em que esteve em pré-campanha. O carioca teve abatidos R$ 27.455,63 pelas 26 votações a que deixou de comparecer.
Na sequência da lista está Guilherme Mussi (PP-SP), que sofreu 26 descontos, somando uma redução de R$ 26,295,89 neste ano. A assessoria do deputado informou que ele assumiu a presidência estadual do partido e, em ano de eleições, preferiu se ausentar da Câmara a abandonar as articulações para os pleitos municipais.