Lucas Ferraz
Um projeto do deputado Luciano Castro (PR-RR), que torna inelegível quem mudar de partido até quatro anos após a sua diplomação, passou a ser visto como uma possível saída para o impasse em torno da votação da reforma política na Câmara dos Deputados. O Projeto de Lei Complementar 35/07 proíbe que disputem quaisquer cargos eletivos aqueles que trocarem de legenda no exercício do cargo de presidente e vice-presidente da República, governador, vice-governador, senador, deputado federal, deputado estadual, deputado distrital, prefeito, vice-prefeito e vereador.
Nem mesmo sua aprovação, porém, é garantida. No momento, a única coisa certa é que o atual projeto de reforma política, relatado por Ronaldo Caiado (DEM-GO), não tem a mínima chance de sobreviver. A começar pelo seu ponto central, o voto em lista fechada, já rejeitado pela maioria dos deputados (leia mais). A tentativa de criar remendos – como o financiamento público para campanhas majoritárias (prefeito, governador, senador e presidente da República) e o voto em lista flexível – também não vingou.
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Por isso, o próprio líder do PT na Câmara, Luiz Sérgio (RJ), disse, ao sair de uma reunião na última semana, que a reforma “foi para o beleléu”. O presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), um dos patrocinadores do projeto, ainda acredita que é possível aprovar a fidelidade partidária e o fim das coligações nas eleições proporcionais (leia mais). E ainda esta semana, contrastando com a opinião da grande maioria, para a qual o melhor seria deixar tudo para o segundo semestre.
Na Câmara, ecoa como nunca uma antiga frase do ex-presidente Fernando Henrique que reflete bem o atual cenário: “Não há um deputado ou senador que seja contra a reforma. O problema é que cada um é a favor da sua reforma política”. Ou, como diz o deputado Márcio França, líder do PSB: “Estamos todos unidos na dúvida”. O líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), complementa: “Aqui, cada um é especialista, baseado em sua realidade e em seu horizonte. É muito difícil”.
Em busca de consenso
Chinaglia declarou ontem (segunda, 9) que é necessário votar a reforma política mesmo sem consenso, apesar de ressaltar que ela não será tão profunda como se imaginava anteriormente. Mas os rumos do projeto – que está há um mês na pauta do Plenário – serão definidos na reunião do colégio de líderes, a ser realizada hoje pela manhã.
O presidente da Câmara não busca uma saída honrosa somente para a Casa que preside, mas para si próprio, já que foi dele a iniciativa de pôr a reforma política em votação, quando muitos deputados, especialmente os de primeiro mandato, ressaltavam a necessidade de aprofundar o debate a respeito do assunto. Sua veemente defesa da conclusão da votação nesta semana baseia-se na constatação de que a fidelidade partidária e o fim das coligações em eleições proporcionais já são pontos de consenso entre os deputados. Daí a possibilidade de votar o projeto de Luciano Castro.
Mas há questionamentos, como fez o deputado Renildo Calheiros (PCdoB-PE) em uma recente reunião. “Isso aqui é tão surreal que o líder do partido que mais cresceu por causa da infidelidade propõe um projeto pela fidelidade”, disse. Luciano Castro avermelhou. Hoje com 42 deputados, o PR, resultante da fusão entre PL e Prona, ganhou quase 20 deputados na legislatura iniciada em fevereiro deste ano.
O líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO), considera possível votar agora a fidelidade partidária. Na sua opinião, isso é “o máximo” que a correlação de forças na Casa permitiria neste momento. E, na condição de representante de uma das bancadas que mais críticas fizeram ao projeto de Caiado, condena tanto a proposição derrotada em plenário quanto as tentativas posteriores de emendá-la: “Somos contra remendo vermelho em calça branca. Essa não é a reforma que o povo quer. Não vamos fazer uma coisa mal-feita”.
Segundo Arantes, o PTB fez uma pesquisa que detectou os principais pontos que a população quer ver em uma reforma. São eles: voto distrital misto, fidelidade partidária, a instituição do voto facultativo e coincidência de mandatos.
Nova reforma
Na última reunião do conselho político, que reúne os 11 partidos que apóiam o governo, o ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia, demonstrou interesse em realizar um seminário para que a base aliada chegue a um consenso sobre a reforma política. Os líderes partidários ouvidos pelo Congresso em Foco destacam ainda a insegurança dos novos deputados que não participaram da elaboração do projeto de Caiado, elaborado na legislatura anterior.
Tais fatos animam alguns a manterem a esperança em mudanças mais significativas, desde que resultem de um período mais prolongado de debate. “Sem a pressa de se aprovar tudo em cima da hora para vigorar nas eleições de 2008”, explica Márcio França. Nessa futura reforma, seria possível apresentar pontos que alteram mais profundamente o sistema político-eleitoral, como, por exemplo, a revisão das regras para eleição de suplentes de senadores.
Ganha adeptos também a proposta de realizar-se um plebiscito nas eleições do ano que vem para que a população decida as diretrizes gerais da reforma política. A idéia é defendida por Miro Teixeira (RJ), líder do PDT na Câmara. Não faltam, finalmente, os que continuam a sonhar com uma Constituinte exclusiva, que poderia rever o sistema político-eleitoral dos pés à cabeça.
Enfim, a reforma política continua sendo o que foi nos últimos anos. De um lado, é encarada por muitos como o remédio mais eficaz para as vicissitudes da política brasileira: as relações incestuosas entre políticos, empreiteiros e fornecedores do setor público, alimentadas pelo financiamento privado; os elevados custos das campanhas eleitorais; a fragilidade dos partidos etc. Do outro, não consegue ultrapassar a condição de promessa, continuamente reiterada e jamais cumprida.
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