Tarciso Nascimento
Com ampla maioria no Congresso, o governo Fernando Henrique Cardoso conseguiu driblar as pressões da oposição à época e impedir a apuração de uma série de denúncias de irregularidades envolvendo privatizações do patrimônio público. No requerimento de criação da CPI, são listados 77 casos nos setores petroquímico, elétrico, financeiro, siderúrgico, de mineração, petróleo e gás, telecomunicações, informática, saneamento e transportes. O foco da CPI deve ser a participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) nessas privatizações.
Até o final de 2004, o BNDES havia injetado nas empresas estatais que foram privatizadas US$ 15,6 bilhões. Houve casos em que as empresas receberam muito mais dinheiro do que renderam seus leilões de privatização.
Teles
Um dos processos mais controversos foi o que envolveu a privatização do Sistema Telebrás. Antes de vender as teles, o governo investiu R$ 21 bilhões no setor. Depois, o governo vendeu tudo por cerca de R$ 22 bilhões e financiou, via BNDES, metade dos R$ 8 bilhões dados de entrada no negócio. Grampos telefônicos divulgados, na época, mostraram também o envolvimento de lobistas com autoridades do primeiro escalão do governo e o jogo de cartas marcadas para beneficiar determinadas empresas.
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As fitas mostravam que informações privilegiadas eram repassadas aos escolhidos pelo governo federal para vencer as licitações. A divulgação de uma dessas gravações resultou na queda do então ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, e do presidente do BNDES André Lara Rezende.
Em uma das gravações os dois aparecem articulando o apoio da Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil) para beneficiar o consórcio do banco Opportunity, que tinha como um dos donos o economista Pérsio Arida, amigo de Mendonça de Barros e de Lara Resende.
Vale do Rio Doce
Outro fantasma que a CPI poderá ressuscitar é o da venda da Companhia Vale do Rio Doce. A estatal foi leiloada , em 1997, por R$ 3,3 bilhões, e hoje é avaliada em R$ 40 bilhões. “A venda da Vale do Rio Doce foi muito estranha. Só para se ter uma idéia, o lucro trimestral da Vale é o que foi pago por ela”, afirma o deputado José Divino (PMR-RJ), autor do requerimento de criação da CPI das Privatizações.
O ex-diretor da área internacional do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira, que havia sido tesoureiro de campanha de FHC e do então senador José Serra, foi acusado de pedir propina de R$ 15 milhões para obter apoio dos fundos de pensão ao consórcio do empresário Benjamin Steinbruch, que levou a Vale, e de ter cobrado R$ 90 milhões para ajudar na montagem do consórcio Telemar.
Setor elétrico
A comissão também poderá investigar, entre outras coisas, as condições de venda da Eletrosul ao grupo belga Tractebel, pelo valor de US$ 760 milhões, e da Light ao consórcio formado pela AES, Houston, EdF e CSN. O negócio foi fechado em maio de 1996 por mais de US$ 2 bilhões. Desde 1991, o governo federal arrecadou US$ 105,5 bilhões com as privatizações.