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O que Dilma lê, presumidamente uma resposta ministerial, obviamente não foi revelado. “Por que os jornais estão dizendo que houve um acordo ontem no Congresso sobre o Código Florestal? Eu não sei de nada?”, questiona o texto da parte de cima do bilhete, em letra cursiva. Logo embaixo, em letra de fôrma, um rascunho que parece complementar as indagações presidenciais. “Não houve acordo com o governo. A posição do governo é a defesa da MP, com foco especial na ‘escadinha’”, registra o verso do bilhete , em referência à sistemática da “escadinha” para designar a determinação de recuperação e preservação de áreas ambientais de maneira proporcional por pequenos, médios e grandes produtores – o dispositivo foi retirado do texto da MP, editada sob orientação de Dilma.
Acordo não teve aval
Consequência ou não da bronca registrada no billhete, ao final da reunião do conselho, Isabella Teixeira reafirmou o posicionamento do governo pela manutenção dos termos da medida provisória, integralmente. Segundo a ministra do Meio Ambiente, as alterações patrocinadas pelos ruralistas na comissão especial representam “retrocesso”, com margem à insegurança jurídica concernente à legislação em vigor. O pronunciamento oficial foi reforçado com nota da Secretaria de Relações Institucionais sobre o assunto (veja íntegra abaixo), por meio da qual o Planalto reitera que a aprovação da MP 571 “não teve aval ou concordância do governo federal”, embora ambas as ministras tenham negociado com os parlamentares envolvidos na questão.
PublicidadeA oposição também resolveu se manifestar depois da divulgação do conteúdo do bilhete. Igualmente por meio de nota (íntegra abaixo), o vice-líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado (GO), membro da bancada ruralista, rechaça, “com indignação”, a intervenção da Secretaria de Relações Institucionais. “Tal atitude eliminou qualquer chance de acordo em plenário. […] O Legislativo brasileiro não é casa de vassalos do Executivo”, registra o parlamentar goiano, dando sinais de como será a votação em plenário, a depender do recrudescimento oposicionista para negociar.
Ao deixar o Congresso, onde se reuniu com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), a ministra Ideli disse que, ao alterar a norma da “escadinha”, membros da comissão desfiguram “o coração” da matéria. “Eles [parlamentares] mexem nesse equilíbrio que foi o grande ganho da MP”, lamentou a ministra, referindo-se ao fato de que, de acordo com o texto aprovado, pequenos, médios e grandes produtores têm de recompor ou proteger as mesmas dimensões de área ambiental.
Principais pontos
O texto da MP ainda precisa ser referendado pelos plenários da Câmara e do Senado para que tenha sua vigência mantida – a proposição perde validade em 8 de outubro. Encaminhada ao Congresso em 28 de maio (confira o texto original), a matéria recebeu mais de 600 emendas, além de uma avalanche de críticas da oposição, que questionou sua constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal em 6 de junho.
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O texto aprovado na comissão especial restituiu a exigência de proteção ambiental dos rios temporários, norma anteriormente excluída no início deste mês. Por meio de emenda, a senador Kátia Abreu (PSD-TO), membro da Frente Parlamentar da Agricultura e presidente da Confederação Nacional da Agricultura, conseguiu a redução, para 15 metros, da faixa obrigatória de reflorestamento nas margens de rios com até 10 metros de largura, em propriedades com dimensão entre 4 e 10 módulos fiscais (a medida antes exigida era de 20 metros). A emenda de Kátia também amplia essa norma para propriedades com até 15 módulos fiscais.
Outro ponto da matéria aprovada no colegiado reduz para 20 metros a faixa mínima de proteção ao longo de rios com extensão superior a 10 metros de largura. O limite anteriormente estipulado na medida provisória era de 30 metros de área a ser preservada.
Relator da matéria na comissão, o senador Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC) conseguiu retomar a proteção obrigatória nas margens de rios e excluiu do texto a exigência de tal preservação nas margens de cursos d’água efêmeros. Esses rios não têm leito em atividade por todo o ano, e em geral são resultantes da trajetória que a água da chuva marca em registros elevados de índice pluviométrico. A matéria deve ir ao plenário no próximo esforço concentrado da Câmara, com possibilidade de ser votada já na próxima quarta-feira (5).
Confira as notas sobre o assunto
Da Secretaria de Relações Institucionais:
“Nota de esclarecimento – Código FlorestalA aprovação da MP 571 (Código Florestal), ocorrida ontem (29), na Comissão Especial Mista do Congresso Nacional, não teve aval ou concordância do Governo Federal.
Durante toda a tramitação da matéria na Comissão, o governo, por meio da SRI, MMA, MAPA e MDA, sempre deixou claro que o ideal era manter a proposta original da MP 571.A ministra chefe da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, Ideli Salvatti, e a ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira, mantiveram conversas ao longo do dia de ontem com vários parlamentares da comissão, em especial o presidente e o relator da matéria, reafirmando a posição pela manutenção sem alteração do item 61 – A (escadinha).
Este item produz equilíbrio socioambiental ao determinar que todos precisam recuperar áreas de preservação, mas quem tem mais terras, deve recuperar mais.
Assessoria de Comunicação Social da Secretaria de Relações Institucionais SRI/PR”
Da liderança do Democratas na Câmara:
“Nota da Presidência contra acordo do Código Florestal é antidemocrática
Recebemos com indignação a nota da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República que desautorizou o acordo proposto na última quarta-feira (29/8) pela base governista durante a votação da Medida Provisória 571 (Código Florestal) na Comissão Mista do Congresso Nacional. Tal atitude eliminou qualquer chance de acordo em plenário. Parlamentares de oposição e de governo foram desrespeitados pelo Governo Federal, que insiste em cassar a nossa prerrogativa de legislar. É ainda a desmoralização de deputados e senadores governistas, que empenharam sua palavra para que a matéria fosse apreciada. Se essa atitude da presidente Dilma Rousseff não for revista, será criada uma crise institucional de graves proporções. O Legislativo brasileiro não é casa de vassalos do Executivo.
Brasília, 30 de agosto de 2012
Ronaldo Caiado
Vice-líder do Democratas na Câmara dos Deputados”