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Foi o próprio Leão quem admitiu sua amizade com Olímpio Queiroga. Ele alegou a existência dessa relação com o bicheiro para não aceitar cuidar da Monte Carlo depois que o juiz responsável, Paulo Augusto Moreira Lima, pediu para ser afastado do caso, alegando que sua família vinha sendo ameaçada. Na quarta-feira (20), Leão teve uma conversa com a corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon. O juiz não atendeu aos pedidos de entrevista feitos pelo Congresso em Foco. Ele, porém, nega qualquer responsabilidade pelo vazamento, e pediu para ser investigado.
Graças à descrença de Cachoeira, o vazamento não impediu que a operação acontecesse. Mas causou preocupação ao juiz Paulo Augusto Moreira Lima, que considerou “assustador” o alcance da organização criminosa de Cachoeira. “O presente trabalho somente prosperou devido à extrema habilidade dos procuradores da República e policiais federais e ao descrédito dos criminosos de que poderiam ter seus rádios importados interceptados, tendo em vista os supostos vazamentos ocorridos na investigação, como a existência da própria operação, seu nome, objeto e qual o juiz responsável, sem contar descoberta de escuta ambiental”, escreveu ele na ordem de prisão. Alegando estar com a segurança em risco, Moreira Lima deixou o caso e passa a ter esquema de proteção pessoal, assim como o novo responsável pela Operação, Alderico Rocha.
“Uma bosta”
Foi no fim da tarde do dia 2 de fevereiro que Queiroga informou à quadrilha de Cachoeira o que sabia sobre a Operação Monte Carlo. Ele pede para se encontrar em um shopping center de Brasília com o ex-sargento da Aeronáutica Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, araponga e braço operacional do esquema. Precisa falar com urgência. É nessa conversa, não gravada, que Olímpio conta a Dadá sobre a operação.
Depois do encontro, Dadá, às 22h14 do mesmo dia, telefona para Cachoeira e informa a ele o que Olímpio Queiroga contou. O ex-sargento porém, duvida. Os dois acreditam que Queiroga mente ao dizer que sua fonte seria uma mulher, funcionária da Justiça Federal. “Um bosta”, classifica Cachoeira, para duvidar que a tal mulher pudesse ter a informação. Também duvidam da informação de que a investigação acontecia em Brasília, e não em Goiânia, como seria o natural. A investigação da PF estava na capital porque havia envolvimento de policiais federais de Goiás na quadrilha. “Eu quero dar um esculacho nele agora: ‘Ô, Olímpio, você está tumultuando, rapaz’”, prometeu Cachoeira.
“Gordinho”
Três minutos depois, às 22h17, Dadá e Cachoeira conversam de novo. Reforçam a sua descrença a partir de outra informação trazida por Queiroga, a de que Demóstenes Torres, a quem chamam de “Gordinho”, também estava sendo investigado. Na verdade, o nome do parlamentar aparece em um relatório à parte que seria remetido à Procuradoria Geral da República e ao Supremo Tribunal Federal (STF) por conta do que os policiais chamam de “encontros fortuitos”: ele apareceu cerca de 300 vezes nas conversas grampeadas pela Polícia Federal ao investigar a quadrilha. Cachoeira e Dadá duvidam que possa haver menção a Demóstenes justamente por conta de seu foro privilegiado.
“Se o Gordinho estivesse numa parada dessa, o negócio estaria no Supremo [Tribunal Federal]. Não tava em juiz de primeira instância, não”, afirmou o araponga Dadá. “Ah, não, mas tem um relatoriozinho falando dele”, desdenhou Dadá, reproduzindo, sem dar crédito, a frase de Olímpio para contar sobre o “auto circunstanciado de encontros fortuitos” feito pela PF a respeito de Demóstenes. Dadá diz que o jeito é esperar o Olímpio ir a Goiânia de novo.
Olímpio Queiroga, o informante em que Cachoeira não confiava, acertou até a Vara onde o processo corria. E Cachoeira, mesmo não acreditando muito, foi checar a informação com o delegado da Polícia Federal Fernando Byron, outro preso na Operação Monte Carlo. Em 3 de fevereiro, às 8h29, Byron tranquiliza o chefe da organização. Ele afirma existir uma investigação na 11ª Vara, mas não sobre jogos ilegais, e sim de corrupção, de outras pessoas. “Não tem nada a ver com a gente, não, ok, guerreiro? Pode ficar tranquilo”, afirmou Byron.
Perto de descobrirem
O que fez Cachoeira duvidar de Olímpio Queiroga foi o fato de que ele não era alguém considerado pelo bicheiro como bem informado sobre o que acontecia na Justiça e na polícia. Cachoeira tinha fontes melhor posicionadas e em quem confiava mais, como Dadá e Byron. No dia 2 de fevereiro, às 18h30, o braço operacional de Cachoeira, Lenine Araújo de Souza, também conversa com Dadá sobre a eventual existência da Operação e sobre o envolvimento de Demóstenes, o “Gordinho”. Outra vez, o araponga argumenta que, se o senador estivesse no processo, o caso “subiria” para algum tribunal superior. De qualquer modo, na conversa, Dadá demonstra já ter informações de que o caso poderia estar com o juiz Paulo Augusto Moreira. E acrescenta saber que ele tinha sido delegado da PF antes. “É. Agora o problema é… essa história toda de… Tem que ver mesmo se esse juiz de lá foi delegado também, né?”, afirma na conversa o ex-sargento da Aeronáutica.
Três dias depois, o próprio Cachoeira vai procurar informações sobre um tal Paulo, da PF. Em 6 de fevereiro, às 22h15, ele liga para uma pessoa chamada Valmir. Ele quer saber o nome do delegado amigo de um tal de Elion. Valmir diz ao bicheiro que “a denúncia” partiu de Goiânia. “Não tem um tal de Paulo, não?”, questiona Cachoeira. No mesmo dia, às 10h17, Valmir afirma que Elion tem um amigo com o nome de Paulo. “Mas ele é federal?”, questiona Cachoeira, que insiste em saber a profissão do tal Paulo.
Origem em Valparaíso
A quadrilha também já suspeitava que pudesse haver uma investigação originada na cidade de Valparaíso (GO), como realmente aconteceu, conforme mostrou o Congresso em Foco. Era em Valparaíso que Olímpio Queiroga operava o jogo ilegal. Em 3 de fevereiro, às 22h53, Dadá liga para Cachoeira, conversa na qual o bicheiro se mostra preocupado com mais essa informação prestada por Olímpio. O aliado de Cachoeira disse que o caso foi remetido a Goiânia, por causa do envolvimento de dois delegados. O líder da organização lembra a Dadá que eles realmente recebem ajuda de dois delegados, Fernando Byron e Deuselino Valadares. Mas o araponga diz que checou com suas fontes e não apurou nada semelhante, só uma investigação sobre receptação. “O material colhido até agora não tem nada que indique um crime de repercussão”, disse Dadá.
Por causa do envolvimento de delegados de Goiânia, as escutas eram feitas e analisadas na Superintendência da PF em Brasília. Em duas ocasiões, em fevereiro de 2011 e de 2012, os procuradores do Ministério Público Lea Batista de Oliveira, Daniel de Resende Salgado e Marcelo Ribeiro pedem “expressamente” à Justiça que as informações do caso não cheguem ao conhecimento da Superintendência da Polícia Federal em Goiás por causa dos “contínuos vazamentos” de investigações contra a organização de Cachoeira.
Certidão negativa
Para garantir não sofrer nenhum processo, os advogados de Cachoeira vão à Justiça Federal e pedem uma certidão de nada consta contra o bicheiro. O funcionário do Judiciário disse que, se for inquérito fora das Varas, não haveria como dizer, mas, em caso de processo, poderia fornecer o documento. Com a certidão negativa em mãos, Cachoeira liga para Olímpio Queiroga em 8 de fevereiro, às 16h09, e comemora o fato de obter o documento. Ainda assim, Olímpio Queiroga desconfia: “Deus ouça que ele esteja falando a verdade.”
No dia seguinte, o aliado de Cachoeira busca o mesmo documento. Em 9 de fevereiro, ele fala com um interlocutor de nome Arnaldo, que acha que o juiz mente quando diz inexistirem processos. Queiroga concorda, mas afirma que o bicheiro está confiante. E se resigna com a situação: “Às vezes ele está certo, mas não custa nada a gente se prevenir”. Para infelicidade de Olímpio Queiroga, naquele momento quem estava certo não era Carlinhos Cachoeira. Era ele.