As falhas de segurança e a violência registrada no Rio de Janeiro durante o Carnaval deste ano foram o estopim para a assinatura do decreto pelo presidente Michel Temer, na última sexta-feira (16), que autorizou a intervenção federal nas forças de segurança do Rio de Janeiro até o final do ano. Já em vigor, a medida estabelece que o interventor, o chefe do Comando Militar do Leste, general Walter Braga Netto, terá poderes de governo, ficando responsável pelo comando geral da Secretaria de Segurança Pública, da Polícia Militar, da Polícia Civil, do Corpo de Bombeiros e do sistema carcerário do estado. A pauta dominará as discussões nesta semana, mas sem desviar o foco das votações de projetos sobre segurança pública já inciadas no Senado. É o que garante o líder do MDB, Raimundo Lira (PB).
Leia também
O senador destaca que a agenda da segurança pública no Congresso Nacional – classificada como prioridade pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), durante seu discurso de abertura do ano legislativo –, não deverá ser prejudicada pelo decreto presidencial. Na última sexta-feira (16), Eunício também afirmou que a intervenção federal no Rio será votada pela Casa com a maior celeridade possível, assim que a votação na Câmara for concluída, abrindo caminho para as demais deliberações. A expectativa é que o decreto seja votado pelos deputados já nesta segunda-feira (19).
<< “Medida extrema negociada”: os vídeos em que Temer fala da intervenção e do Ministério da Segurança
Ao abrir os trabalhos legislativos de 2018, no começo do mês, Eunício Oliveira avaliou a situação da segurança pública como uma “nuvem cinza que turva os horizontes do Brasil”, apresentando uma pauta de nove projetos a serem votados no setor, que incluem a criação de um sistema federal unificado de segurança pública, a exemplo do Sistema Único de Saúde (SUS), como forma de aprimorar a troca de informações entre agentes e órgãos públicos; além da proposta de um novo Código Penal; da proibição do contingenciamento de verbas para o setor; e da criação de uma comissão mista extraordinária para propor medidas adicionais que tramitem em regime de urgência na Câmara e no Senado.
PublicidadeNa última quarta-feira (07) foi aprovada por unanimidade (60 votos), e em regime de urgência no Senado, a proposta que fixa um prazo de seis meses para que bloqueadores de sinal de celulares sejam instalados em unidades do sistema penitenciário nacional. De autoria do próprio senador Eunício Oliveira, o Projeto de Lei 32/2018 deverá agora ser analisado pela Câmara.
<< Senado aprova obrigatoriedade de bloqueador de celulares em presídios
Pauta temática
Outros temas relativos à pauta de segurança pública continuam agendados para votação no próximo dia 20. Entre eles, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 118/2011, que impede o bloqueio de recursos orçamentários destinados aos fundos de segurança; o PLC 140/2017, de autoria do deputado Rubinelli (PT-SP), que extingue do Código Penal o atenuante de pena para jovens entre 18 e 21 anos; e o PLS 469/2015, do senador Raimundo Lira, que agrava a pena para crimes cometidos próximos a residências ou escolas, em situação de tocaia.
“A questão da segurança no país é muito ampla, exige um planejamento e um investimento muito forte por parte do governo federal e dos estados, mudanças, aperfeiçoamentos, modernização do Código de Processo Penal, melhorias na eficiência, no treinamento das polícias, um reforço no sistema de inteligência”, elencou Raimundo Lira ao Congresso em Foco.
“Por isso, as votações que estavam previstas continuam. A única vedação em função do decreto de intervenção federal, previsto no artigo 60 da Constituição, parágrafo 1º, é com relação à votação de emenda constitucional. Qualquer outro procedimento legislativo, de lei ordinária, lei complementar, não sofre qualquer solução de continuidade”, acrescentou o parlamentar.
Gás extra
A intervenção setorial tem sido vista por alguns como uma demonstração de força e comanda relativos da gestão Temer no ocaso de seu impopular mandato. A medida, no entanto, tem gerado controvérsia, em especial na classe política brasileira. Tida por alguns parlamentares como um pretexto para postergar a votação da reforma da Previdência, já que o governo Temer ainda não conseguiu os votos necessários para aprovar a proposta, a intervenção federal também tem os seus defensores, entre eles o próprio Raimundo Lira. Para ele, esta foi a melhor alternativa encontrada pelo governo federal para coibir a “violência explícita” no Rio de Janeiro.
“A violência mais explícita do Brasil é a do Rio de Janeiro, e ela precisa ser contida. Essa medida, acredito, foi o melhor instrumento legal que o governo poderia ter para resolver e melhorar essa situação”, ponderou o senador paraibano, acrescentando acreditar que o auxílio das forças militares na segurança do estado será bem recebido pela população, uma vez que os resultados comecem a aparecer.
“Existe uma intranquilidade muito grande da população do Rio de Janeiro face a essa violência praticamente incontrolável. Ela foi mostrada de forma explícita através dos noticiários de televisão durante o Carnaval. A população esperava que houvesse alguma medida por parte da União, e a União tomou essa medida com um decreto de intervenção no sistema de Defesa e de Segurança do Rio de Janeiro. Com certeza a população vai receber muito bem, mas é necessário que essa intervenção também seja bem-sucedida, apresente resultados eficazes, que venham a atender plenamente as expectativas da população do Rio de Janeiro”, avaliou.
Fator reforma da Previdência
Ainda assim, o decreto de intervenção federal no Rio de Janeiro vai muito além da questão da segurança pública. Isso porque enquanto a medida vigorar, estará proibida qualquer tipo de mudança na Constituição Federal, o que suspenderia a votação da reforma da Previdência. Para a presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), a decisão do presidente Temer teria sido uma manobra para minimizar o desgaste do governo.
“Sem votos para aprovar a reforma da Previdência, o governo muda a pauta e aceita pedido de intervenção no Rio. A situação da segurança lá é grave, mas fiquemos alertas que pode vir junto mais repressão aos movimentos sociais e mais suspensão de direitos constitucionais”, declarou a parlamentar, em seu perfil no Twitter.
Já o senador Paulo Paim (PT-RS) afirmou que a intervenção federal trouxe à tona o caos que permeia a segurança pública do Rio de Janeiro. “A população sofre com a incompetência do governo estadual. Por outro lado, a reforma da Previdência subiu no telhado. Estamos com um olho no peixe e outro no gato. A mobilização continua”, conclamou o petista na rede social.
<< Oposição diz que intervenção é “cortina de fumaça”, não é séria e desrespeita situação do Rio
“O governo tomou essa medida para socorrer o Rio de Janeiro, para amenizar e reduzir ao máximo possível a violência do Rio de Janeiro. Esse é um problema emergencial e pontual”, rebateu o senador Raimundo Lira. “Agora, o fato de não poder ser feita qualquer outra votação que envolva uma emenda constitucional, isso é consequência, e não causa”, justificou.
Ao assinar o decreto de intervenção, Temer salientou que a reforma da Previdência não deverá sair da pauta, por ser uma medida “extremamente importante para o futuro do país”. Segundo o emedebista, caso o texto consiga apoio suficiente para ser aprovado, a intervenção será revogada para que a votação da reforma prossiga – “jeitinho” que, segundo alguns juristas, fere a Constituição.
Em caso de necessidade, um novo decreto poderá entrar em vigor posteriormente. Presidente da Câmara e um dos principais fiadores da política reformista de Temer, Rodrigo Maia (DEM-RJ) já avisou que vai consultar o Supremo Tribunal Federal acerca da constitucionalidade da interrupção da pauta com fins políticos.
<< Bolsonaro critica intervenção militar no Rio: “Bando de vagabundos”
<< Membros da bancada da bala na Câmara apoiam intervenção no Rio, mas a consideram insuficiente