Durou cerca de 20 minutos o depoimento do assessor especial da Presidência da República, Freud Godoy na Superintendência da Polícia Federal, em São Paulo. Ele negou envolvimento na compra de um dossiê com informações contra o ex-ministro José Serra (PSDB) e saiu sem falar com a imprensa.
Acusado de tentar comprar um material que envolveria o tucano na máfia das ambulâncias, o advogado Gedimar Pereira Passos disse que agiu a pedido de uma grande revista e de uma pessoa chamada "Froud ou Freud", ligada ao PT. Freud Godoy negou ontem qualquer participação no ocorrido e pediu demissão do cargo após conversar, por telefone, com o presidente Lula, a quem assessora há 17 anos. "Pode dormir tranqüilo que tenho como provar que não tenho nada com isso", teria dito Freud ao presidente, segundo relatou mais tarde.
À PF, o assessor disse que conheceu Gedimar por meio do petista Jorge Lorenzetti, mas negou ter negociado a compra do material, fornecido pelos empresários Luiz Antonio Vedoin e Darci Vedoin, sócios da Planam. Os agentes tentaram uma rápida acareação entre Godoy e o advogado, que está preso na superintendência, mas Gedimar alegou direito constitucional de ficar calado.
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Em entrevista ao Jornal Hoje, da TV Globo, confirmou que se encontrou quatro vezes com o advogado em Brasília, mas negou envolvimento com a compra do dossiê Vedoin. "Meu nome é Freud, trabalho com o presidente e minha esposa tem uma empresa de segurança. Isso tudo é verdade. Agora, que até aí eu fiz esse tipo de negociata, de pegar dinheiro ou mandar alguém fazer alguma coisa, eu quero ver como é que ele prova isso", afirmou.
Compra negociada
Na última quinta-feira (14), a PF abordou em Cuiabá (MT) Paulo Roberto Trevisan, tio de Luiz Antonio Vedoin, dono da Planam, quando embarcava para a capital paulista com uma fita de vídeo, um DVD, uma agenda e seis fotos de Serra em um evento para a entrega de ambulâncias compradas pelo esquema das sanguessugas.
Roberto contou que se encontraria com Valdebran e Gedimar para vender o material por R$ 1,7 milhão. O primeiro é ligado ao PT de Mato Grosso e o segundo atua no comitê de campanha presidencial. Eles foram detidos e ouvidos na sede da PF. Segundo os agentes, Gedimar representava o partido na transação e Valdebran, a família Vedoin.
Valdebran Padilha revelou aos agentes que, naquele dia, recebeu R$ 1 milhão de Gedimar para a compra dos documentos. O restante do dinheiro seria pago posteriormente. A negociação com os donos da Planam em troca do dossiê havia começado em R$ 20 milhões, valor considerado alto demais pelo teor dos documentos. Os empresários baixaram o valor para R$ 10 milhões e, finalmente, fecharam acordo em R$ 2 milhões.
O pagamento seria feito na última sexta-feira, na hora do almoço, em quarto de hotel na capital paulista. Porém, o valor ainda era alto demais para o caixa do PT. Para resolver o problema, revelou Gedimar, "uma importante revista de circulação nacional" foi convidada a ratear a compra das informações.
Gedimar disse que foi escalado pelo PT para avaliar a viabilidade jurídica e autenticidade do material. Ele narrou que ficou acertada a ida de uma equipe de jornalistas a Cuiabá para uma entrevista exclusiva com os Vedoin. O primeiro milhão, segundo o advogado, foi entregue a Valdebran assim que iniciada a entrevista.
O restante do dinheiro seria repassado quando todo o material estivesse nas mãos do PT. Gedimar não revelou qual era o veículo envolvido na transação, mas no último fim de semana, a revista IstoÉ publicou entrevista exclusiva em que os donos da Planam acusam Serra de envolvimento com a máfia das ambulâncias. Ontem, a publicação divulgou nota para afirmar que "não compra e nunca comprou dossiês" e que a reportagem é fruto "de trabalho jornalístico".
Gedimar disse à PF que o material dado aos jornalistas não trazia nada de novo e tinha pouca importância. Vedoin deu então aos repórteres um CD-ROM que conteria documentos comprometedores, mas o disco estava vazio. Diante disso, o advogado avisou que só pagaria a outra parte do dinheiro quando recebesse novas informações, o que nunca aconteceu.
PF soube de venda do dossiê ao investigar Funasa
A Polícia Federal descobriu a negociação do dossiê que envolveria o ex-ministro José Serra (PSDB) com a máfia das ambulâncias quando investigava a possível atuação da quadrilha dos sanguessugas na Fundação Nacional de Saúde (Funasa).
Segundo o vice-presidente da CPI dos Sanguessugas, deputado Raul Jungmann (PPS-PE), os agentes revelaram ter descoberto a venda do material por meio de interceptações telefônicas. Nas escutas, que levaram à prisão de Gedimar Pereira Passos e Valdebran Padilha da Silva, aparece uma terceira pessoa que seria Freud Godoy, assessor especial da Presidência da República.
"Existem fitas em que se coloca o nome de uma terceira pessoa, que seria o Freud", disse Jungmann, que esteve na sede da corporação ontem, em Brasília, para tentar a liberação de documentos do dossiê. A PF, porém, não confirmou que as gravações levantem suspeitas contra Freud.
O parlamentar disse que vai sugerir que uma comitiva da CPI viaje a Cuiabá (MT) para acompanhar os depoimentos dos supostos envolvidos na compra do dossiê. Ele afirmou ainda que vai pedir a cópia dos depoimentos e das escutas telefônicas feitas pela polícia.
Roberto contou que se encontraria com Valdebran e Gedimar para vender o material por R$ 1,7 milhão. Em depoimento à polícia, Gedimar afirmou que tentou comprar o dossiê a pedido de uma revista e de uma pessoa chamada "Freud ou Froud", ligada ao PT.
Berzoini nega participação do PT
O presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, negou nessa segunda-feira, em entrevista coletiva, que o partido tenha qualquer participação com o esquema de compra de dossiês. "O PT não tem nenhuma atividade em relação à campanha que envolva recursos financeiros para a compra de informações", afirmou Berzoini. "Até porque temos o princípio básico de que o tratamento de informações deva ser feito profissionalmente com base na legislação do país", acrescentou.
Berzoini preferiu não fazer acusações, mas levantou a suspeita de que possa haver uma armação contra a campanha de Lula. "A nossa candidatura está muito bem consolidada. Não haveria razão para criar fatos que pudessem conturbar a campanha a essa altura do campeonato", disse. "Fico me perguntando a quem interessaria conturbar a campanha", completou o presidente do PT.
Na entrevista, Berzoini contou, ainda, que Gedimar Pereira Passos era ligado à Coordenação de Tratamento de Informações e subordinado a Jorge Lorenzetti, que seria a pessoa responsável por coordenar o trabalho de tratamento de informações. Conforme explicou o presidente do PT, esse trabalho consiste na elaboração de relatórios contendo qualquer informação que pudesse auxiliar na campanha.
Todos os relatórios eram então encaminhados para a coordenação da campanha, cujo chefe é Berzoini. "Qualquer informação seria entregue à coordenação. A divulgação não dependia deles e eles não tinham autorização para fazer viagens ou qualquer tipo de negociação para obter qualquer dado", garantiu o presidente do PT.
Para finalizar, enfatizou que o dinheiro não poderia ter vindo do PT, pois ninguém no partido tem informações sobre ele. Preferiu não entrar em detalhes sobre Gedimar Pereira Passos e Valdebran Padilha. "Não temos informações suficientes para comentar a prisão de um funcionário e a citação de outro. O PT vai avaliar e colher dados para poder passar com clareza e transparência à sociedade", garantiu.
Berzoini disse que só tomou conhecimento que Gedimar trabalhava para o PT no sábado à tarde. "Vou pedir explicações diretamente para o Jorge (Lorenzetti), mas ainda não consegui falar com ele", afirmou.
Quanto ao suposto envolvimento do assessor da Presidência Fred Godoy no esquema de compra do material, Berzoini limitou-se a dizer que o assessor já havia negado, em depoimento à PF, sua participação em qualquer negociata.
"Ainda não temos detalhes sobre o que aconteceu, mas se for comprovado envolvimento de pessoas do partido tomaremos todas as medidas cabíveis, tanto no plano jurídico, quanto no administrativo", afirmou Berzoini.
Bastos diz que Lula está "indignado" com episódio
O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, afirmou ontem que a Polícia Federal não deixará de investigar a participação do assessor da Presidência da República Freud Godoy na tentativa de compra de um dossiê que envolveria o ex-ministro José Serra (PSDB) com o escândalo dos sanguessugas. Bastos declarou ainda que o presidente Lula está "indignado" com o episódio.
Freud foi envolvido no caso depois que o advogado Gedimar Pereira Passos revelou à PF que compraria o material contra Serra a pedido de uma grande revista e de uma pessoa chamada "Freud ou Froud", ligada ao PT. Gedimar foi detido junto com Valdebran Padilha num hotel em São Paulo. Eles estavam com R$ 1,7 milhão, dinheiro que seria dado em troca de vídeos e fotos que mostravam o tucano ao lado de sanguessugas.
Segundo Bastos, Lula disse não acreditar que Freud esteja ligado ao ocorrido. O presidente teria afirmado ainda que não "compactua com essa história de dossiê". "Não contem comigo para fazer uso deste", teria dito Lula, segundo o ministro da Justiça.
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