O terceiro semestre de mandato de Michel Temer, entre julho e dezembro deste ano, foi de vitórias relativas do governo, como o sepultamento das duas denúncias apresentadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente. Para barras as duas investigações, o Planalto teve que negociar altas cifras em emendas parlamentares e cargos estratégicos na cúpula da máquina pública, e justamente por isso sentiu a volatilidade da base e seu apoio de ocasião. Prova disso foi o fato de ter faltado voto para aprovar a joia da coroa da gestão peemedebista, a polêmica reforma da Previdência.
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Mas Temer obteve vitórias importantes enquanto negociava para se manter no Palácio do Planalto. Umas das principais foi a reforma trabalhista, que alterou inúmeros pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e foi criticada por entidades do setor no Brasil e no mundo. Da primeira para a segunda votação de denúncia, teve que fazer um refinanciamento de dívidas que beneficiou vários deputados que decidiriam seu destino em plenário. Até a chamada “MP do Trilhão”, já na reta final da sessão legislativa, entrou em pauta para beneficiar petrolíferas estrangeiras que atuarão na exploração de petróleo nos campos de pré-sal.
Confira as principais aprovações que Temer conseguiu no Congresso e, logo abaixo, confira o raio-X feito pela Revista Congresso em Foco a respeito das votações do segundo semestre:
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Reforma trabalhista
Em vigor desde novembro, a reforma passou no Senado em julho após grande polêmica. Senadoras da oposição ocuparam a Mesa Diretora para impedir a aprovação da proposta. Para forçar a votação, o presidente Eunício Oliveira determinou o corte dos microfones e das luzes em plenário. Acordo entre governo e oposição foi costurado após compromisso de Temer de enviar uma medida provisória posteriormente, alterando alguns pontos.
A reforma prevê mais de cem mudanças na legislação entre empresas e trabalhadores.
A seguir, algumas das alterações:
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Estabelece a prevalência do negociado sobre o legislado. Poderão ser negociados, com o aval dos representantes dos trabalhadores, itens como parcelamento
de férias, flexibilização da jornada, banco de horas, trabalho remoto, participação nos lucros e resultados, plano de cargos e salários e intervalo. -
Cria o regime de tempo parcial de trabalho, com até 30 horas semanais, sem possibilidade de horas extras semanais, ou de 26 horas semanais com até seis horas extras, pagas com acréscimo de 50%.
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Permite a negociação entre empregadores e empregados a respeito da jornada de 12 horas de trabalho, intercalada por 36 horas de descanso.
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Estabelece o trabalho intermitente, que permite a contratação de funcionários sem
horários xos de trabalho, ganhando de acordo com o tempo que trabalharem. -
Possibilita a divisão das férias em três períodos: um não poderá ser inferior a 14 dias corridos e os demais terão de ser de pelo menos cinco dias corridos.
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Acaba com a obrigatoriedade do pagamento do imposto sindical.Regulamenta o teletrabalho, também conhecido como home-office, quando o funcionário trabalha de sua casa, por exemplo.
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Fixa o período mínimo de 18 meses entre a demissão e a recontratação de funcionário, dessa vez como terceirizado, por uma mesma empresa.
Refis
O programa de refinanciamento de dívidas tributárias de pessoas físicas e jurídicas com a União estabeleceu regras generosas para os devedores, inclusive dezenas de parlamentares. Durante nove meses, o governo editou quatro medidas provisórias e negociou com deputados e senadores os termos da versão final.
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Prevê descontos sobre os juros que podem variar de 50% a 90%, conforme a modalidade de pagamento escolhida, e de 25% a 70% para as multas.
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Dívidas de até R$ 15 milhões terão condições especiais, com entrada menor e possibilidade de uso de créditos.
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Para débitos superiores a R$ 15 milhões, o parcelamento pode ser feito em até 175 parcelas. Os deputados rejeitaram uma emenda que excluía políticos do programa de refinanciamento.
Minirreforma eleitoral
Depois de muitas polêmicas, o Congresso aprovou um conjunto de mudanças que passam a valer a partir de 2018 e 2020:
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Cria um fundo eleitoral com recursos públicos, no valor estimado de R$ 1,7 bilhão, para financiar campanhas.
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Libera a arrecadação de recursos para campanhas por meio das chamadas vaquinhas online a partir de 15 de maio. Partidos poderão promover eventos e vender bens e serviços para levantar fundos.
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Estabelece limite de gasto conforme o cargo pretendido:
Presidente – R$ 70 milhões no 1º turno, e metade desse valor se houver 2º (ou seja, até R$ 105 milhões)
Governador – de R$ 2,8 milhões a R$ 21 milhões, conforme número de eleitores do estado
Senador – de R$ 2,5 milhões a R$ 5,6 milhões, conforme número de eleitores do estado
Deputado federal – R$ 2,5 milhões
Deputado estadual – R$ 1 milhão Abre janela durante todo o mês de março em anos eleitorais para a troca de partido sem que isso implique a perda do mandato por
infidelidade partidária do parlamentar. -
Acaba com as coligações para eleições proporcionais e institui uma cláusula de barreira na tentativa de reduzir o número de partidos no Brasil. Essas mudanças, porém, só valem a partir de 2020.Permite a propaganda na internet, mas deixa de fora sites e blogs.
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Libera o pagamento para que postagens alcancem número maior de usuários em redes sociais, como Twitter e Facebook, e em mecanismos de busca, como o Google.Temer também fez alguns vetos à minirreforma. Barrou, entre outros pontos, o dispositivo que permitia uma censura prévia com a retirada conteúdos de publicações anônimas da internet, com informações que fossem consideradas falsas ou discurso de ódio até que o autor fosse identificado. Também excluiu o limite para o autofinanciamento eleitoral.
Foro privilegiado para Moreira Franco
O presidente Michel Temer editou medida provisória para garantir foro privilegiado a um de seus aliados mais próximos. Por MP, Temer recriou a Secretaria de Governo para acomodar Moreira Franco, até então responsável pelo Programa de Parcerias e Investimentos, e livrá-lo do risco de ser julgado pela primeira instância na Operação Lava Jato.
Um dos alvos da Procuradoria Geral da República na segunda denúncia contra o presidente, Moreira só poderá ser investigado com autorização do Supremo Tribunal Federal. A Câmara decidiu barrar o pedido de investigação contra ele e o também ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha. Moreira Franco é citado nas delações da Odebrecht e do grupo J&F, da JBS.
BNDES
O governo alterou a taxa de juros do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES): saiu a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), entrou a Taxa de Longo Prazo (TLP), mais próxima da praticada pelas demais instituições financeiras. A previsão é de que ela se iguale à dos bancos em cinco anos. A medida provisória sinaliza mudança de rumo na política da instituição, que favoreceu grandes empresas, os chamados campeões nacionais, nos governos Lula e Dilma.
Isenção fiscal para petrolíferas
A medida provisória aprovada pela Câmara e pelo Senado isenta de impostos petrolíferas estrangeiras. Recebeu o apelido de “MP do Trilhão” devido à estimativa de que a União perderá R$ 1 trilhão nos próximos 25 anos com a renúncia fiscal. O texto permite que essas empresas deduzam valores aplicados em atividades de exploração e produção na apuração do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
A MP seguiu para o Senado após conclusão da votação dos destaques e a poucos dias de perder a validade, no dia 15 de dezembro. Em 12 de dezembro, os senadores incluíram uma emenda de plenário, alterando o prazo do Repetro, um regime especial que isenta de tributos federais a comercialização de equipamentos utilizados em pesquisa e exploração industrial de reservas de petróleo e gás natural (lavras de jazidas) de 2040 para 2022, conforme limite determinado pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). A emenda fez com que a matéria retornasse à Câmara, onde foi votada no dia seguinte. Os deputados derrubaram a emenda e a MP seguiu para a sanção de Temer.
MP do Fies
O governo antecipou para o primeiro mês após a conclusão do curso a cobrança da primeira parcela a ser paga pelo estudante de instituições de ensino privado vinculado ao programa de financiamento estudantil. Até então a tolerância era de 18 meses. Com a nova lei, o pagamento pode ser consignado à folha de pagamento caso o ex-estudante esteja empregado. O saldo da dívida restante deverá ser quitado em mensalidades equivalentes ao maior valor entre o pagamento mínimo e o cálculo do percentual vinculado à renda bruta do estudante ou amortizado e quitado integralmente com redução de encargos. Segundo o Executivo, essas e outras mudanças eram necessárias para cobrir um rombo estimado em mais de R$ 32 bilhões no sistema.
Aplicativos de transporte
O projeto de lei gerou protestos e grande mobilização dos representantes dos aplicativos e dos motoristas de transporte individual, como Uber, Cabify e 99, no Senado. A proposta aprovada antes pela Câmara estabelecia que os carros usados para essa modalidade de transporte deveriam ter placas vermelhas e documento de propriedade do veículo utilizado no serviço, entre outras coisas. Essas exigências foram retiradas do texto pelos senadores, o que obriga os deputados a reexaminarem o projeto.
Foi aprovada emenda que atribui ao município apenas a competência para fiscalizar o serviço dos aplicativos. A prefeitura não terá o papel de autorizar o exercício da atividade, como estabelecia a Câmara. A versão dos deputados praticamente igualava as exigências sobre os motoristas dos aplicativos às feitas pelas prefeituras aos taxistas.
Pacote de segurança
Na esteira do recrudescimento da violência no Rio de Janeiro, os deputados aprovaram um conjunto de medidas voltado para a segurança pública. Entre elas, a retirada do atenuante de pena para menores de 21 anos, a exigência de bloqueadores de sinal de celular em presídios e a restrição do “saidão” de presos em regime semiaberto, o fim da progressão de regime fechado para semiaberto para condenados por assassinato de policiais. As propostas serão analisadas pelo Senado.
Foro militar
A lei aprovada pelo Congresso em outubro transfere para a Justiça Militar a competência de julgar militares que tenham cometido crime doloso contra civis. O projeto foi apresentado para que a nova regra valesse na Copa do Mundo de 2014 e na Olimpíada do Rio de Janeiro, em 2016. A proposta, votada somente após os dois megaeventos, torna o “foro privilegiado” da categoria permanente em todo o país. Antes da lei, eles eram julgados como qualquer cidadão na Justiça comum.