Com base nas informações oficiais do Palácio do Planalto, da Advocacia-Geral da União, das declarações dos dois ministros envolvidos no escândalo do apartamento de Geddel Vieira Lima e no depoimento formal prestado à Polícia Federal pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, muitas perguntas precisam ser feitas pela sociedade. Aqui vão algumas:
Por que o presidente da República, Michel Temer, com sua agenda atribulada e em meio a uma das mais profundas crises econômicas e políticas do país, convocou duas vezes o seu então ministro da Cultura, Marcelo Calero, para saber as razões do embargo do Instituto do Patrimônio Histórico Nacional à construção de um prédio residencial em Salvador, onde outro ministro, Geddel Vieira Lima, tinha comprado apartamento?
Por que Temer, um jurista, procurador aposentado do maior estado do país, ex-presidente da Câmara duas vezes, aceitou a pressão de Geddel para e tentou “arbitrar o conflito” entre o interesse privado do seu ministro favorito e uma decisão técnica de um órgão federal, o Iphan, que proibiu a construção de um prédio em área tombada pelo patrimônio histórico nacional?
Por que um terceiro ministro, o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, também pressionou o ex-ministro da Cultura a encontrar uma solução não técnica para que o edifício onde Geddel diz ter comprado uma unidade pudesse ser construído?
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Por que o sub-chefe da Casa Civil, Gustavo do Vale Rocha (ex-advogado do notório Eduardo Cunha), pressionou o então ministro Calero para que o processo do Iphan fosse enviado à AGU, para que a ministra Grace Maria Fernandes Mendonça encontrasse uma solução heterodoxa e driblasse o embargo à construção?
O presidente da República é o gestor de um empreendimento chamado Brasil, que tem um PIB de U$ 2,2 trilhões, mais de 100 empresas estatais, bancos públicos, inúmeras autarquias, fundações e uma administração direta com mais de 2 milhões de servidores públicos responsáveis pela prestação de serviços a mais de 200 milhões de pessoas.
Também está sob a responsabilidade do presidente as relações internacionais, porque é o chefe da nação. Sob sua alçada estão as decisões administrativas que envolvem o patrimônio do país, sua riqueza agrícola, seu potencial energético e ambiental, a política industrial e os verdadeiros conflitos entre os auxiliares sobre o modelo de gestão pública.
Após o impeachment de Dilma Rousseff, o presidente está encarregado de organizar novamente as contas públicas e resgatar a credibilidade do governo, com incentivos a investimentos nacionais e internacionais. Precisa trabalhar duro para aprovar medidas que possibilitem essa reorganização do Estado e a contenção do crescimento da dívida interna. E, além de tudo isso, conseguir maioria parlamentar no Congresso para continuar governando.
Como alguém com tantas atribuições arrumou tempo na agenda para tratar de um assunto privado de um dos seus auxiliares do tamanho de um apartamento de R$ 2,6 milhões?