Renata Camargo
A comissão especial criada para analisar o Estatuto da Igualdade Racial (PL 6264/05) deve votar nesta quarta-feira (8), às 14h, o substitutivo do relator, deputado Antônio Roberto (PV-MG). Após muita polêmica e embate entre grupos que defendem interesses dos afro-descendentes e outros que discordam de políticas afirmativas para negros no país, a proposta, que está há mais de um ano na comissão especial, pode ser aprovada.
Segundo o relator, um acordo modificando pontos polêmicos do projeto que veio do Senado permitirá a votação desta tarde. O PL, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), traz as diretrizes para garantir à população negra a efetividade da igualdade de oportunidades para as raças, além de apresentar normas de combate à discriminação racial.
Entre os pontos polêmicos, está o capítulo que garante o acesso a terra e à moradia adequada para a população negra. Segundo o art. 34 do substitutivo, remanescentes de quilombos que estejam ocupando terras têm direito ao título definitivo da propriedade. Esse direito – que está garantido no art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – é questionado, especialmente, por parlamentares ligados à bancada ruralista.
No entendimento da bancada, somente remanescentes de quilombos que ocuparam terras entre 1888 até 1988, data em que a Constituição vigente foi promulgada, devem ter o direito ao título definitivo da terra. O projeto do Estatuto, no entanto, previa que ocupações recentes fossem tituladas. Para acabar com o impasse, o relator retirou do projeto a temporalidade da ocupação.
“No Estatuto estava previsto que terras ocupadas ‘atualmente’ deveriam ter o título de propriedade definitivo emitido pelo Estado. Esse ‘atualmente’ estava causando muita briga e deixava sem saber quem tinha o direito às terras. Retirei o ‘atualmente’ e remeti a questão à própria Constituição. Mudei de nível o conflito. O meu parecer não está nem a favor nem contra essa questão”, explicou o relator ao site.
Cotas
Outro ponto muito polêmico do projeto era a previsão de percentuais de cotas para negros nas áreas de educação, cultura, lazer, trabalho, esporte e mídia. A proposta original previa, por exemplo, que empresas com mais de 200 funcionários tivessem em seus quadros funcionais 70% da proporção de afro-brasileiros na população economicamente ativa do estado.
No parecer do relator na Câmara, os percentuais foram retirados. Ficou mantida a necessidade por parte do Poder Público de adoção de ações afirmativas destinadas a preenchimento de vagas para a população afro-descendente, mas a porcentagem a ser ocupada em cada área foi extinta. “Tirei os percentuais deixando o espírito da igualdade de oportunidade. A gente abre caminho para operacionalizar essa igualdade”, considerou o relator.
O parlamentar retirou também a previsão de cotas para mídia. Antônio Roberto afirma que muitas emissoras já adotam essa reserva e TVs pequenas teriam dificuldade em cumprir as cotas. “Isso poderia engessar a produção artística e o controle também seria muito difícil. Tirei o percentual, mas mantive o espírito”, explicou o relator.
Votação
Mesmo com acordos em torno dos pontos mais polêmicos do projeto, o relator avalia que a matéria terá que passar pelo plenário da Câmara. A proposta já foi votada no Senado e, desde março do ano passado, está na comissão especial, na qual, deveria ser votada em caráter terminativo.
“Mesmo com acordos, acredito que ainda terá que passar pelo plenário. O preconceito institucional com a questão racial é muito maior do que se imagina. Quanto negros têm no Congresso, no Supremo, no governo? Dizem que não há preconceito individual, aí parece que não há preconceito racial no Brasil. Mas o preconceito institucional é ”, defendeu Antônio Roberto.
Leia aqui o relatório final do Estatuto de Igualdade Racial
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