Tradicional em Pernambuco, o encontro de fim de ano entre a imprensa e o governador costuma render boas histórias de bastidores. Numa das mais recentes, o ex-governador Eduardo Campos, que já flertava com uma possível candidatura presidencial, falava descontraído sobre seus prováveis adversários nas urnas.
Com uma confiança que até agora contagia seus correligionários, ele não dava muito crédito à postulação do senador Aécio Neves (PSDB), que hoje tem chances reais de ser o próximo presidente da República. Lembrando da trajetória de esquerda de seu grupo político, Campos não pensava na possibilidade de marchar ao lado do tucano.
O apoio ao PSDB anunciado pela família do ex-governador - morto em acidente aéreo no dia 13 de agosto – contrasta com a cena protagonizada por Campos naquela noite de dezembro. Talvez porque o PSB pernambucano ainda não tenha se recuperado do golpe de perder sua única liderança de envergadura nacional.
Órfãos e ainda inebriados, seus principais seguidores protagonizaram o ato de apoio a Aécio, no sábado (11), atitude que soou estranha aos observadores da cena política pernambucana. Desde a morte de Campos, a maioria das decisões de seus aliados locais se baseou na resposta da pergunta: “O que Eduardo faria?”. Apesar disso, o fato é que os pessebistas pernambucanos ainda se desdobram na tentativa de agir pragmaticamente, como era característica de Campos.
A explicação para isso engloba uma série de fatores que se explicam de maneira resumida com uma frase: o projeto do PSB era bem mais personalista do que chegou a parecer. Os compromissos políticos costurados eram compromissos com a eleição de Eduardo Campos. Por isso, o apoio de parte da base partidária de Pernambuco a Aécio Neves vai na contramão de um dos principais objetivos dele: acabar com a “rinha” política nacional entre PT e PSDB.
Acrescente-se aí um ingrediente importante: foi depois que a presidente Dilma Rousseff assumiu o poder, em janeiro de 2011, que o ex-governador passou a planejar de maneira mais objetiva a sua candidatura nacional.
PublicidadeAté então, Eduardo Campos era um governador bem avaliado que recebia fartos recursos federais e despontava como bom administrador. Dilma não deu a Campos a mesma atenção dispensada pelo antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva. Após uma série de ruídos, o ex-governador decidiu romper com o PT.
Com uma vitória acachapante, Campos encerrou a hegemonia petista na Prefeitura do Recife nas eleições de 2012. No pleito deste ano, o PT foi dizimado da política local: não elegeu sequer um deputado federal.
O afastamento entre Campos e o PT ajudou a dissipar no eleitorado pernambucano parte do legado de Lula. Como a gestão de Campos ainda está fresca na cabeça do eleitor local, as bênçãos do PSB de Pernambuco a Aécio Neves têm muito mais chances de se converter em votos para o tucano do que o apoio de Lula a Dilma.
Some-se a isso Renata Campos e os filhos do ex-governador, figuras mais próximas do povo com capacidade de tornar concreta a transferência dos mais de 2,3 milhões de votos dados a Marina Silva.
No primeiro turno, Aécio Neves obteve magérrimos 284 mil votos entre os pernambucanos. O estado poderá – se confirmada a transferência de votos – ser de grande importância para a vitória do tucano.
A eleição da nova executiva do PSB evidenciou o que em Pernambuco já se sabia: era Eduardo quem sufocava as insatisfações e conduzia o partido para onde lhe parecesse mais conveniente. Em entrevista ao jornal O Globo, o governador eleito do estado e vice-presidente nacional da legenda, Paulo Câmara, já começa a dar sinais de que talvez o apoio a Aécio Neves não tenha sido ponderado como deveria.
Está embutida nessa declaração uma preocupação simples: caso Dilma Rousseff vença a disputa, como ficará o repasse de verbas federais para o estado? E como ser um governador bem avaliado como o antecessor sem as verbas da União para respaldar os projetos prometidos durante a campanha?
A vitória em Pernambuco e a manutenção da hegemonia no partido se revelam para o PSB um desafio que ficará para além das eleições. Ou até que se consiga um novo Campos/Arraes que realmente se apresente como uma liderança capaz de ditar os rumos.