Aldemario Araujo Castro *
O constituinte originário, no texto do art. 131 da Constituição de 1988, qualificou a Advocacia-Geral da União (AGU) como uma instituição de Estado (não um órgão, autarquia ou ministério), chefiada pelo Advogado-Geral da União e baseada, para o escorreito exercício de suas competências constitucionais e legais, nos integrantes de suas carreiras jurídicas.
Atualmente, os advogados públicos federais são quase 8 (oito) mil profissionais concursados, distribuídos nas carreiras de Advogado da União, Procurador da Fazenda Nacional, Procurador Federal e Procurador do Banco Central do Brasil. A AGU, assim como o Ministério Público e a Defensoria Pública, foi afastada dos poderes clássicos do Estado e caracterizada como Função Essencial à Justiça.
São relevantíssimas as competências atribuídas à AGU e aos advogados públicos federais. No campo específico do combate à corrupção e à malversação do patrimônio público, merecem destaque as atividades de assessoria e consultoria jurídicas no controle, principalmente preventivo, de juridicidade dos atos administrativos e a propositura de ações judiciais de improbidade.
Apesar de sua importância para a sociedade e para o Estado, a AGU convive, durante décadas, com crônicas e profundas carências estruturais, de valorização de suas carreiras jurídicas e de mecanismos institucionais que evitem a sua captura ou utilização para a realização de interesses escusos de várias ordens.
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Em relação aos últimos dos aspectos mencionados, as seguintes definições, sem prejuízo de outras correlatas, precisam ser incorporadas ao ordenamento jurídico e as práticas dos mais graduados agentes públicos:
Publicidadea) escolha do advogado-geral da União mediante lista tríplice de membros das carreiras jurídicas da instituição escolhidos pelos pares;
b) eliminação, ou redução drástica, do número de cargos comissionados, utilizados em grande medida para a formação de uma cadeia de comando e obediência que tolhe a independência técnica dos membros da instituição;
c) fixação de um conjunto adequado e republicano de prerrogativas funcionais para os membros da instituição realizarem, sem receio de pressões ou perseguições, as suas nobres funções públicas;
d) transformação do Conselho Superior da instituição em efetiva instância de definição e controle das principais decisões e diretrizes de condução da gestão;
e) conferir as necessárias autonomias administrativa e financeira à AGU, inclusive com a clara definição de que não integra o Poder Executivo.
Os comportamentos dos três últimos ex-advogados-gerais da União confirmam a rigorosa necessidade do avanço institucional proposto. Essas tristes figuras, cada um a seu modo, demonstraram os malefícios decorrentes da captura ou utilização da instituição para satisfazer interesses político-partidários ou de promoção pessoal.
As declarações do último ex-AGU merecem uma consideração específica, sem nenhum juízo acerca da veracidade de suas acusações (até mesmo por falta de conhecimento dos fatos por parte deste humilde escriba). Afirma-se que a AGU foi “impedida” de realizar suas atribuições no campo da propositura de ações de improbidade administrativa contra agentes públicos flagrados nos mais vis atos de corrupção.
Uma simples pesquisa no site da AGU identificará a existência do Departamento de Patrimônio e Probidade na estrutura da Procuradoria-Geral da União com competência para, entre outras:
a) planejar, coordenar e supervisionar as atividades relativas à representação e à defesa judicial da União em matéria de patrimônio, meio ambiente, probidade e recuperação de ativos;
b) exercer a representação e a defesa judicial da União, nas causas de competência da Advocacia-Geral da União, nas demandas que tenham por objeto questões afetas à probidade administrativa e à respectiva recomposição do erário.
Na mesma linha, o site registra que “constituído em janeiro de 2009, a partir da Portaria PGU n. 15/2008, o Grupo Permanente de Atuação Proativa da AGU nasceu com a missão de buscar a recuperação judicial de valores desviados dos cofres públicos federais, a partir de constatações realizadas pelos órgãos de controle da União, como a Controladoria Geral da União, o Tribunal de Contas da União, o Departamento de Polícia Federal, dentre outros”.
Uma singela pesquisa nos mecanismos de busca na internet mostrará, ao longo dos últimos dez anos, inúmeras iniciativas da AGU, por intermédio dos advogados públicos federais do Departamento de Patrimônio e Probidade, notadamente a propositura de ações de improbidade administrativa contra agentes políticos.
Por conseguinte, para a estrita observância dos princípios republicano, da impessoalidade e da moralidade, no seio da Advocacia-Geral da União, os bloqueios institucionais antes aludidos precisam ser implementados. Assim, e só assim, a instituição e seus integrantes serão poupados de serem enredados em censuráveis projetos pessoais de exposição midiática e/ou mesquinhos anseios político-partidários.
* É mestre em Direito, procurador da Fazenda Nacional, professor da Universidade Católica de Brasília e conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (pela OAB/DF). É diretor da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais (Anafe). Site: http://www.aldemario.adv.br