Edson Sardinha
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A mulher negra que mais mandatos acumulou na história do parlamento norte-americano esteve esta semana em Brasília para falar sobre o papel dos afro-americanos na política dos Estados Unidos e a forma como eles se organizaram, há quarenta anos, para assegurar uma de suas principais conquistas, a Lei dos Direitos Civis. Na terça-feira passada (9), a democrata Cardis Collins falou por mais de uma hora à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado para um plenário com apenas três senadores. Desses, apenas o autor do requerimento para a audiência, o senador Paulo Paim (PT-RS), acompanhou toda a discussão. Além dele, passaram pelo auditório as senadoras Fátima Cleide (PT-RO) e Ideli Salvatti (PT-SC), líder do partido. O quórum só não foi mais decepcionante por causa da presença de representantes do movimento negro. Membro do Congresso norte-americano por onze mandatos consecutivos, de 1973 a 1997, Collins disse ao Congresso em Foco que é contra a reserva direta de vagas no parlamento para candidatos negros. “Somos astutos politicamente o suficiente para conquistar nossos assentos”, disse. Ela manifestou apoio à proposta que obriga os partidos a reservarem vagas para candidatos negros como um dos caminhos para se aumentar a participação política. Na avaliação dela, as ações afirmativas são um processo contínuo cuja eficácia depende da vontade popular. Com a inclusão política e social, os afro-americanos conseguiram, em 39 anos, multiplicar por dez a sua participação no Congresso Nacional. Congresso em Foco – Qual é a eficácia da política de cotas raciais? Cardiss Collins – Depende do país, do povo do país, porque é ele que tem que aceitar ou não as cotas. Eu não tenho conhecimento suficiente para dizer a respeito da situação brasileira. O Parlamento norte-americano reserva um porcentual de vagas para candidatos negros? Não há nem um assento reservado para os negros. O candidato tem de ganhar a eleição como qualquer outro. A senhora acredita que seria necessário esse tipo de reserva? Não. De jeito nenhum. Somos astutos politicamente o suficiente para conquistar nossos assentos. Entre os 594 parlamentares brasileiros, apenas 24 se declaram negros. O Estatuto da Igualdade Racial, em tramitação no Congresso, prevê que os partidos reservem 30% de suas candidaturas para negros ou pardos. A senhora considera essa sugestão interessante? É interessante para aumentar a representação da população negra, com certeza. Mas não pode ser o único caminho. Qual seria esse outro caminho? Eu não conheço a realidade do Brasil e, por isso, não posso dizer qual a melhor forma de o país aumentar a representação dos negros. Qual a limitação da política de cotas? Ela corre o risco de se tornar, com o tempo, um teto? Quando se entra, sempre se pode tirar um teto. Se há mais gente nos parlamentos estadual ou federal que possa oferecer mais legislação, aprovando mais projetos para os negros, sempre será possível elevar o teto. Há uma discussão forte nos Estados Unidos hoje como resultado de um movimento das mulheres que perdura há 40 anos, porque havia um telhado de vidro que limitava a atuação delas. Na medida em que temos mais membros mulheres deputadas, começamos a rachar um pouco esse teto. Eles podem existir, mas foram feitos para serem puxados mais pra cima. A senhora disse, durante sua exposição, que as ações afirmativas são um processo contínuo. Qual é o próximo passo nesse sentido nos Estados Unidos? O primeiro passo é manter o que já conquistamos. A cada eleição, podemos ter um presidente novo, com pontos de vista mais conservadores em relação aos que tinha aquele que o antecedeu. Com isso, algumas realizações podem ficar mais fragilizadas principalmente nas áreas econômica e social. A luta, portanto, é manter o que já temos e tentar ganhar mais, quando possível. É necessário termos em mente que, às vezes, é preciso dar um pequeno passo atrás, um outro à frente ou, então, dois para trás e só um para frente. O salto acontece quando não desistimos e continuamos tentando. |
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