Lúcio Lambranho
Em mensagem enviada ao Congresso em Foco, o relator da MP 327/06, deputado Paulo Pimenta (PT-RS), negou ter cedido às pressões da bancada ruralista para alterar o seu parecer à medida provisória que regulamenta o plantio de transgênicos em áreas próximas a unidades de conservação ambiental.
O deputado disse que não aceitará o "patrulhamento de setores que se intitulam donos do assunto e buscam desqualificar qualquer um que não pense como eles". E criticou segmentos da esquerda “que se intitulam donos da verdade e atacam no geral, sem argumentos sólidos, os que pensam diferente”. “Cuba é um dos países que mais investem em biotecnologia, tanto na agricultura como na saúde. Será que o Fidel Castro está ‘a serviço” da Monsanto?’, rebateu (veja a argumentação dos ambientalistas).
A MP 327, que tranca a pauta da Câmara desde o último sábado, está pronta para ser analisada na sessão desta quarta-feira. O relator recebeu intensas críticas por parte das bancadas do PV e do Psol e, ainda, da ala do PT ligada à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, conforme mostrou este site na edição do último dia 14 (leia a reportagem).
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Caso seja aprovada ainda este ano, a polêmica MP permitirá, entre outras coisas, o plantio de organismos geneticamente modificados em áreas próximas às unidades de conservação como áreas de proteção ambiental (APAs) e nas zonas de amortecimento (faixa de proteção) de parques nacionais.
Acolhendo sugestão da deputada Kátia Abreu (PFL-TO), uma das coordenadoras da bancada ruralista, Pimenta propôs a redução do quorum da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) para decidir sobre a comercialização de transgênicos e seus derivados. Na prática, o texto diminui de 18 para 14, dos 27 integrantes do colegiado de cientistas, o número de votos favoráveis necessários para a liberação da venda de organismos geneticamente modificados.
Por causa da mudança no texto, Pimenta recebeu críticas até de colegas de bancada, como o também deputado gaúcho petista Adão Pretto, ligado ao Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST). "Estamos entregando praticamente a segurança alimentar do país nas mãos das grandes multinacionais. Já pedimos até a troca do relator ao líder da bancada e vamos aguardar os acontecimentos", disse Adão ao Congresso em Foco.
Paulo Pimenta alega, por sua vez, que a atual exigência de dois terços para liberação comercial desses organismos tem restringido as deliberações da CTNBio. “Mesmo uma mudança na Constituição exige um quorum de 3/5 dos integrantes da Câmara e do Senado, quorum inferior aos 2/3 hoje exigidos para deliberações na CTNBio. Entendo que maioria absoluta resguarda um interesse público sem ceder às tentativas de chantagem ideológica presentes neste debate”, afirmou (veja a íntegra do parecer do relator).
Leia abaixo os principais pontos da mensagem enviada pelo relator da MP 327 ao Congresso em Foco:
Importância da MP 327
"Trata-se de uma medida necessária para regrar o plantio de OGM nas zonas próximas às áreas de conservação até que seja fixada sua zona de amortecimento e seja aprovado o seu respectivo plano de manejo. A MP supre uma lacuna e gera uma solução onde o bom senso prevalece pois resguarda os cuidados ambientais necessários sem restrições desproporcionais. Não se trata de ser contra ou a favor, pois não é um jogo de futebol ou uma disputa eleitoral o que estamos debatendo. Alguém pode ser contra ou a favor da química, da genética ou da biologia? É evidente que não. Trata-se de refletirmos a respeito da utilização de determinados conhecimentos produzidos pela humanidade. E que evidentemente, como em qualquer outra circunstância, poderá ter bom uso ou não. Qualquer tecnologia é assim, até mesmo a mais rudimentar. Uma faca na mão de um açougueiro é um instrumento de trabalho, na mão de um bandido é uma arma."
Liberação para o algodão transgênico
"O que eu fiz foi encontrar uma solução para o impasse, pois, sem esta solução, teremos que queimar as fibras produzidas em 150 mil hectares cultivados com sementes transgênicas. O Projeto de Lei de Conversão autoriza o beneficiamento e a comercialização exclusivamente da safra de 2006 e determina claramente que os caroços e sementes do algodão colhido sejam utilizados para produção de biodiesel ou destruídos nos termos do parecer técnico 587/2006 da CTNBio. Portanto, é uma medida transitória, sem entrar no mérito dos aspectos definitivos sobre o cultivo ou não do algodão transgênico no Brasil."
Redução no quorum da CTNBio
"Os parlamentares e as entidades representativas do agronegócio desejam que a composição da CTNBio seja reduzida e que as deliberações sejam por maioria simples dos presentes. Não aceitei sequer discutir mudanças na composição da CTNBio e rejeitei qualquer possibilidade de deliberações por maioria simples. Estou propondo um quorum qualificado de maioria absoluta dos membros, que é o mesmo que usamos no Congresso Nacional para um Projeto de Lei Complementar à Constituição. Mesmo uma mudança na Constituição exige um quorum de 3/5 dos integrantes da Câmara e do Senado, quorum inferior aos 2/3 hoje exigidos para deliberações na CTNBio. Entendo que maioria absoluta resguarda um interesse público sem ceder às tentativas de chantagem ideológica presentes neste debate."
"Preconceito e desinformação"
"Eu não sou daqueles que acreditam que a biotecnologia e a transgenia são a solução para todos os problemas da agricultura e da medicina. Na minha opinião, quem se diz a favor de qualquer transgênico é tão fundamentalista como quem se diz contra a priori qualquer possibilidade de utilização da engenharia genética. É impressionante como se busca, com meia dúzia de frases feitas, semear o preconceito e estimular a desinformação. Cada mudança genética é um exemplo específico que deve ser analisado em separado e aprovado ou não em função de premissas obrigatórias como a biossegurança e condicionado também por aspectos de natureza econômica, social, ambiental e, até mesmo, cultural."
Críticas à visão “stalinista” da esquerda
"A esquerda sempre foi a favor da ciência, da evolução, do conhecimento e da pesquisa. Isto é uma manipulação primária com forte viés stalinista de setores que intitulam-se donos da verdade e atacam no geral, sem argumentos sólidos, os que pensam diferente. Cuba é um dos países que mais investem em biotecnologia, tanto na agricultura como na saúde. Será que o Fidel Castro está “a serviço” da Monsanto? Por que debater transgênicos como se a soja RR fosse a única utilização possível dessa tecnologia, omitindo conscientemente tudo o que a Embrapa tem feito, as pesquisas da Fundação Oswaldo Cruz – instituição reconhecida internacionalmente pela qualidade e seriedade do trabalho desenvolvido – e o que a pesquisa nacional já desenvolveu para o feijão, batata, banana, mamão, e que poderia, certamente, ser uma importante ferramenta para a agricultura familiar? Não aceito hipocrisia nesse debate. Setores que vêm a público se manifestar a priori contra qualquer transgênico, na hora de plantar, 100% dos seus associados utilizam semente transgênica revelando uma brutal contradição entre o discurso necessário pelo receio do patrulhamento e a realidade de quem produz. São vários os petistas que pensam como eu, deputados vereadores, agricultores, cientistas que têm procurado estudar e compreender este complexo processo do qual não podemos nos omitir."
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