Carlos Alberto dos Reis*
A Anistia Internacional, organização não-governamental presente em mais de 150 países e que possui mais de dois milhões de adeptos, publicou, recentemente, seu relatório anual intitulado “Estado de Direitos Humanos”. O Brasil é citado em razão da corrupção na política e do mau uso de verbas públicas, o que, segundo o documento, compromete a capacidade das autoridades de garantir os direitos humanos da população.
De acordo com o estudo, investigações de corrupção apontaram ligações diretas e indiretas com a falta de proteção aos direitos humanos. Também é feita menção a “amplos relatos de malversação de verbas públicas em todos os níveis do Executivo e Legislativo, algo que diminuiu a capacidade das autoridades de garantir direitos humanos fundamentais por meio de serviços sociais e aumentou a perda da confiança pública nas instituições do Estado”.
Concordo com as palavras da secretária-geral da Anistia Internacional, Irene Khan: “Do mesmo modo que o aquecimento global exige uma ação mundial baseada na cooperação internacional, a erosão dos direitos humanos somente será enfrentada por meio da solidariedade global e do respeito pelo direito internacional”.
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Paralelamente, o Senado está avaliando projeto de Lei (PLC 32/2007) do Ministério da Justiça que altera dispositivos da Lei de Licitações com o objetivo de evitar fraudes. Uma das propostas, por exemplo, proíbe de participar de licitações pessoas físicas e jurídicas que praticaram irregularidades, inclusive aquelas que migraram ou abriram outras empresas. A medida tem a finalidade de afastar de processos licitatórios diretores, gerentes ou representantes de firmas que já foram punidos por atos irregulares.
Exatamente neste momento, a última operação deflagrada pela Polícia Federal, intitulada de Navalha, deixou, mais uma vez, perplexa a sociedade e, sobretudo, os trabalhadores do setor elétrico nacional. A operação envolve, diretamente, um dos programas mais bem-sucedidos do Governo Federal, o Luz para Todos –, que prevê a universalização do acesso à energia elétrica. O plano é financiado com recursos de fundos do setor elétrico, bancados por encargos embutidos nas tarifas pagas pelos consumidores.
A Operação Navalha, cujo objetivo é desmontar uma quadrilha que fraudava licitações de obras públicas, aponta envolvimento profundo de empresários, prefeitos, um deputado distrital, um ex-governador e um ex-deputado federal. No topo do esquema estava a construtora Gautama, empresa que, supostamente, direcionava editais para fraudar licitações de obras de interesse da quadrilha e estaria infiltrada em governos municipais, estaduais e federal. Licitações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e do Programa Luz para Todos, além do Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (Dnit) e os ministérios de Minas e Energia, da Integração Nacional, das Cidades e do Planejamento, também teriam sido afetadas.
Diante do quadro que se estabeleceu, o diretor nacional do Luz para Todos, José Ribamar Santana, pediu demissão. Ele também é presidente do Conselho de Administração da Cepisa, distribuidora de energia do Piauí, envolvida nos desvios de recursos apontados pela Operação Navalha. O documento diz ainda que o superfaturamento teria contado “com a participação do diretor do programa”.
Apesar do dramático cenário que se apresenta, há sinais de esperança. Estamos assistindo à criação de condições propícias para que haja mais transparência na prestação de contas do governo à sociedade. Em diversos países, e inclui-se aí o Brasil, novos líderes e legislaturas que assumiram o poder têm nas mãos a oportunidade de corrigir as falhas daqueles que tanto deturparam o cenário político, econômico e de direitos humanos nos últimos anos.
Cabe à sociedade exigir a punição de todos os envolvidos, mas, também, retratação pública para os inocentados. Não se pode aceitar que empresas competentes e estimuladoras do desenvolvimento do país e de programas sociais, como o Luz para Todos, sejam alvo da atuação de quadrilhas que assaltam os cofres públicos, causando prejuízos irrecuperáveis ao conjunto da sociedade.
Por essa razão, o Sindicato dos Eletricitários de São Paulo sempre defendeu a indicação de pessoas oriundas dos quadros das empresas para ocupar os cargos diretivos ou coordenar os diversos programas sociais ligados à máquina pública. Não podemos mais conviver com o descaso do setor estatal.
A sociedade exige punição para os culpados e profissionalização nas administrações das companhias de economia mista. Essa é a única forma de impedir que quadrilhas, como a que foi desmontada pela operação da Polícia Federal, atravanquem o desenvolvimento brasileiro.
* Carlos Alberto dos Reis é vice-presidente do Sindicato dos Eletricitários do Estado de São Paulo.