Severino Motta e Edson Sardinha
Anunciadas como antídoto contra a infidelidade partidária, as novas regras para a distribuição dos cargos da Mesa Diretora e das comissões não conseguiram frear o troca-troca nos partidos neste começo de legislatura. Uma semana após o início dos trabalhos legislativos, 22 parlamentares já não estão mais nas legendas pelas quais se elegeram em outubro. De lá pra cá, outros dois senadores que estão na metade do mandato também trocaram de filiação (veja a lista completa).
Dos que estão em início de mandato, 12 trocaram a oposição por partidos que integram a coalizão do governo Lula. O restante das movimentações se deu entre siglas da própria base aliada. A corrente migratória em direção ao Palácio do Planalto deve ser reforçada, na próxima semana, com a revoada de mais quatro tucanos.
Os deputados cearenses Léo Alcântara (PSDB), Manoel Salviano (PSDB), Raimundo Gomes de Matos (PSDB) e Vicente (PSDB) só aguardam a chegada do ex-governador Lúcio Alcântara (PSDB), que está de férias em Lisboa, para desembarcarem, em conjunto, no governista PR (resultado da fusão entre PL e Prona). Caso a mudança seja concretizada, o PSDB perderá a posição de terceira maior bancada da Câmara para o PFL.
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Eleita sob o discurso da mudança e da moralidade, a nova legislatura começa os seus trabalhos reproduzindo uma prática aprofundada pela legislatura que a antecedeu. Um em cada três dos 618 deputados, entre titulares e suplentes que exerceram o mandato entre janeiro de 2003 e dezembro de 2006, trocou de partido durante o período. Ao todo, 193 deputados trocaram 285 vezes de partido, como já mostrou o Congresso em Foco (veja a lista completa).
Os encantos do PR
A caçula das legendas é a que mais tem seduzido os parlamentares. Apesar de ter feito nas urnas apenas 25 deputados (23 pelo PL e dois pelo Prona), o Partido da República já ocupa hoje 33 cadeiras na Câmara. Dos oito novos integrantes da bancada, cinco estavam nos oposicionistas PSDB, PFL e PPS.
Isso sem contar a provável filiação do grupo de Alcântara, que rompeu com o presidente nacional de seu partido, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), nas últimas eleições. Candidato derrotado à reeleição, Lúcio acusou Tasso de trabalhar pela eleição de Cid Gomes (PSB), irmão do deputado Ciro Gomes (PSB-CE). Em represália, o governador exibiu, em seu horário eleitoral, declarações elogiosas do presidente Lula à sua administração.
A bancada do PR só não é maior porque o partido decidiu expulsar, no dia da posse, o deputado Damião Feliciano (PB), que desafiou a liderança e se lançou como candidato avulso na disputa pela 2ª vice-presidência da Mesa Diretora da Câmara contra o veterano Inocêncio Oliveira (PR-PE).
O líder da bancada, deputado Luciano Castro (RR), diz que o principal atrativo da nova legenda é a oferta de diretórios regionais para os parlamentares. “Com a fusão temos de montar as novas executivas. Nós deixamos o partido sob o domínio do parlamentar [que ingressa]”, admitiu.
Com isso, a legenda garante ao parlamentar o direito de administrar os recursos do fundo partidário e o tempo de TV destinado à sigla em seu estado. “Isso tudo deixa o deputado confortável, dá mais poder de ação”, completou Luciano.
A distribuição de diretórios regionais em troca de filiações não é exclusividade do PR. A estratégia também tem engordado as fileiras dos governistas PTB e PAN. O inexpressivo Partido dos Aposentados da Nação, que elegeu apenas Cléber Verde (MA), já atraiu outros três deputados: Jurandy Loureiro (ES), Takayama (PR) e Silas Câmara (AM).
Um dos dois deputados que trocaram a oposição pelo PTB até agora, o ex-pefelista Sabino Castelo Branco (PTB-AM) mal tomou assento na Câmara e já faz planos para a sucessão municipal, em 2008. “No meu estado, o Lula tem 80% dos votos. No PFL eu ficaria sem a presidência do partido e não teria legenda para disputar a prefeitura. No PTB tenho o comando e garanto a disputa pela prefeitura”, afirmou.
O rei das mudanças
Mas quando o assunto é troca-troca partidário, ninguém tem mais conhecimento de causa do que o deputado Zequinha Marinho (PMDB-PA). Na última legislatura, Zequinha trocou seis vezes de partido e já começou o atual mandato sob nova legenda. Aliás, nova não é o termo apropriado para o caso. Afinal, essa é a terceira passagem do deputado pelo PMDB nos últimos quatro anos.
Uma das lideranças da agora reduzida bancada evangélica, o deputado alega que deixou o PSC porque “ou o parlamentar tem uma sigla forte ou fica voando”. Segundo o paraense, não existe vida fora dos grandes partidos. “O deputado fica morto”, brinca. Na avaliação dele, o Legislativo é “coadjuvante” do Executivo e, integrando a base de apoio do governo federal, o parlamentar tem mais facilidade para levar recursos de emendas para o seu estado.
Nos últimos quatro anos, Zequinha se dividiu entre outras duas passagens pelo PMDB, duas pelo PSC, uma pelo PTB e outra pelo PDT. Em dezembro do ano passado, em entrevista ao Congresso em Foco, o deputado já admitia a possibilidade de deixar o PSC, por causa das negociações da legenda com o PL e o Prona para a formação do PR. Mas garantia que não deixaria o PSC enquanto a sigla existisse. O partido, no entanto, acabou desistindo da fusão, optando por seguir sozinho (leia mais).
Tentativa frustrada
Com a experiência de quem acompanha o dia-a-dia do Congresso há mais de 20 anos, o analista político Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), considera surpreendente o ritmo da movimentação partidária neste início de legislatura.
“As mudanças se dão por motivações regionais ou nacionais. As migrações se dão sempre no sentido favorável ao governo, seja ele o federal ou o estadual”, avalia.
O diretor do Diap esperava que o troca-troca diminuísse consideravelmente este ano por causa de uma mudança feita, ainda em 2005, no regimento interno da Câmara. A partir deste ano, a distribuição dos cargos na Mesa Diretora e nas comissões passa a levar em conta o tamanho das