Nos idos de 2006, acompanhando o noticiário da séria BBC britânica, vi a seguinte chamada sobre o nosso país: “Influência da China no Brasil preocupa os Estados Unidos”.
Literalmente, falava-se que a China estava se mostrando aos países em desenvolvimento como um “modelo alternativo para o combate à pobreza”. Anotou-se, em seguida, que “este discurso está ganhando audiência na América Latina e Washington está despachando para Beijing o secretário-adjunto de Estado para a região, Thomas Shannon, para descobrir o que está havendo”.
Sobre a missão do enviado norte-americano, assim dizia o texto: “seu objetivo é negociar uma linha precisa que a China não deve cruzar ao criar sua nova aliança estratégica com a América Latina”. Segundo declarou um representante do governo norte-americano, “nós queremos ter certeza de que nossas linhas não se cruzarão”.
Perplexo, continuei a ler a notícia: “O aumento dos negócios entre o Brasil e a China começou há menos de dois anos, após uma troca de visitas entre o presidente brasileiro e o chinês. Desde então a influência chinesa pode ser vista em todos os lugares da América Latina: petróleo, gás, ferrovias, portos, aço e – preocupantemente para os EUA – defesa”.
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A reportagem acrescentava: “Em São Paulo, já são comuns aulas do idioma chinês. E os estudantes não são apenas ensinados sobre como falar o mandarim, mas também são instruídos sobre os hábitos culturais chineses e até sobre como cantar canções chinesas”. Em seguida: “O protecionismo político de Washington sobre a América Latina data de 1823, quando o presidente James Monroe decretou que nenhuma potência estrangeira poderia ter maior influência ali do que os Estados Unidos”.
Acerca dos aspectos práticos desta política, a notícia foi clara: “Praticamente todo país da América Latina que tentou cortejar a esquerda – do Chile à Nicarágua – experimentou alguma forma de intervenção norte-americana”. Seria exagero da notícia? Penso que não. Com a palavra o congressista norte-americano Dan Burton, o qual declarou incisivamente que “devemos olhar sempre a América Latina sob o enfoque da doutrina Monroe”.
PublicidadeFiquei ainda mais curioso! Qual teria sido o resultado dessa missão norte-americana à China? A resposta, li poucas semanas depois no jornal Channel News Asia, de Cingapura, o qual trazia a seguinte declaração de um representante do governo chinês: “Não há necessidade de os Estados Unidos temerem a concorrência chinesa na América Latina”. Esse representante observou, inclusive, que os investimentos chineses na região eram de apenas US$ 4 bilhões, contra US$ 300 bilhões dos Estados Unidos. Assim, concluiu o governo da China que quaisquer temores dos EUA eram desnecessários.
Este tratamento de “quintal” dispensado ao Brasil seguramente choca-se com o sonho dos brasileiros por um país cuja grandeza seja proporcional à sua riqueza.
De toda sorte, uns bons anos se passaram. E eis que, há algum tempo, lendo o respeitado jornal The New York Times, lá estava a notícia de que, com a crise econômica que assola a economia norte-americana, “Beijing está preenchendo o vazio deixado pelos Estados Unidos na América Latina”.
Diante dessas informações e opiniões, talvez devesse o povo brasileiro se perguntar quando deixaremos de lado a economia praticamente extrativista que nos rege há quase cinco séculos a fim de que ocupemos nosso lugar de direito no cenário mundial.