Participei, em Brasília, do 26º Congresso das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos e procurei compartilhar minha visão sobre as perspectivas da saúde pública diante da atual crise e dos cenários para o Brasil pós-impeachment.
Depois de quase três décadas de avanços, vivemos o alvorecer da maturidade do SUS. Não há como tergiversar: o subfinanciamento coloca limites claros à expansão dos serviços e sua qualificação. Na verdade, 28 anos depois, não temos um sistema único. Temos três subsistemas: o SUS, a saúde complementar e o desembolso direto do cidadão.
Expus a equação perversa em tempos de maturidade de um sonho generoso. O choque entre direitos amplos e pouco delimitados com recursos escassos e custos crescentes indica um problema sem solução clara. Os resultados são a judicialização da saúde, as tensões trabalhistas, os problemas crônicos de qualidade, o endividamento alto dos hospitais, as intermináveis filas, os vazios assistenciais e o subdiagnóstico nas regiões pobres.
Refleti sobre as tendências de cada um desses vetores. Em relação aos direitos constitucionais, não vejo a menor hipótese de se rever a universalidade. O que é possível é refinar a legislação para dar contornos mais claros nos padrões de integralidade, distensionando o quadro crescente de judicialização. Mesmo países como Espanha, Canadá e Reino Unido deixam claro quais as fronteiras do sistema público. Alguma forma de copagamento para setores de alta renda também pode entrar em pauta.
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Revelei meu ceticismo diante da tragédia fiscal herdada do governo do PT. Como imaginar um crescimento vertiginoso do orçamento da saúde num país com um déficit nominal gravíssimo de 10% do PIB, carga tributária alta, dívida nas alturas e recessão profunda? Para sonharmos com um financiamento maior precisamos fazer o ajuste fiscal e propiciar a retomada do crescimento.
Quanto aos custos crescentes em face da transição demográfica e da inovação voraz de tecnologias, apontei a necessidade de um esforço na atenção primária para lidarmos com o envelhecimento da população e regularmos melhor a incorporação tecnológica.
As Santas Casas estão deficitárias e muito endividadas. Há que se encarar o desafio da profissionalização da gestão. Isto implica em enfrentar questões relativas à escala de produção e suas repercussões na produtividade e na qualidade. Importa construir um competente sistema de administração de custos. Requer aperfeiçoar a contratualização dando nitidez aos desequilíbrios entre custos de produção, serviços prestados e remuneração. Buscar o mix ideal entre saúde complementar e SUS e entre os diversos níveis de complexidade dos serviços. Trabalhar o carisma das Santas Casas, atraindo o subsídio comunitário e trabalho voluntário. E por último, empoderar a direção para que todos tenham um norte dentro de uma lógica institucional.
Se a realidade não permite otimismos retóricos infantis, não temos escolha: arregaçar as mangas e buscar a eficiência máxima possível diante da turbulenta crise.
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