A direita brasileira não está unificada. Esta afirmação pode parecer absurda após a marcação em tempo recorde do julgamento do recurso de Lula pelo TRF-4. O fato é que neste momento existem várias peças sobre o tabuleiro e contas, muitas contas sendo feitas.
1 – A vítima. Nem todos comemoraram a rapidez na marcação do julgamento de Lula. Na Rede TV houve uma saia justa ao vivo. Boris “CCC” Casoy comemorou, quando pediu a opinião de Reinaldo Azevedo, este discordou no ar. Segundo o jornalista, a velocidade excepcional reforça a narrativa de perseguição. Caracteriza uma lógica discricionária típica de um estado de exceção. Formulou que “quem acha que isso é bom para derrotar a esquerda está enganado”.
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Afirmou que o melhor seria o processo seguir seu curso normal. Azevedo expressou uma preocupação real do “lado de lá”. Lula encarna o papel do retirante pobre que venceu e é perseguido pelas elites. No imaginário popular não existe político santo, mas Lula fez por eles. Na hora em que os pobres ficam mais pobres pegam quem os defende. O risco da vitimização é imenso.
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2 – Nas urnas ou na Cadeia? Qual a melhor forma de derrotar a esquerda? Ainda não existe unidade em torno de qual seria a melhor estratégia. O grupo radical, liderado pela Família Marinho com setores antinacionais da burocracia estatal, a “Aliança do Coliseu”, aposta na radicalização. Exige a condenação e prisão de Lula.
Entre a turma que lidera a reação na política o pensamento é diferente. Preferem enfraquecê-lo para tentar derrotá-lo nas urnas. Acreditam na vitimização do ex-presidente, e se apavoram com a conseqüência que isto pode ter no eleitorado, principalmente no Norte e no Nordeste. Temem que a “mão da vítima” seja capaz de eleger qualquer um, e seja a sepultura de seus algozes. O “pito” público que O Globo deu em FHC, pelo Príncipe defender derrotar Lula nas urnas, expressa esta contradição.
3 – A rede que arrasta Lula traz também peixe, camarão… Será difícil convencer a opinião pública de que se faz justiça no Brasil com Temer, Loures, malas de dinheiro, Aécio, Jucá e muitos outros soltos, e sem o STF ter condenado “ninguém” da política. Só Lula? O raciocínio é simples. Para legitimar a inabilitação, ou mesmo a prisão de Lula, outras cabeças terão que ser entregues. Do contrário, o poder judiciário colocará sua legitimidade no fogo de vez.
Quais cabeças toparão fazer companhia ao molusco da esquerda no arrastão? Por outro lado, raciocinam que se for aberto um furo, um rasgo na rede, por onde “escapa” uma lula gigante pode escapar peixe, camarão etc. Na política, a sobrevivência sempre fala mais alto. Esta dúvida está tirando o sono de muita gente em Brasília.
4 – Wal Street, poder e cobiça – Quem assistiu ao antológico filme não esquece a cena de Michael Douglas operando na Bolsa e medindo sua pressão a cada dez minutos. Daqui até o dia 24 de janeiro é assim que operarão nos bastidores os profissionais. Tentarão medir milimetricamente o passo a ser dado a cada momento. A condenação de Lula está sacramentada, a dosimetria e a condução ainda não.
A “Aliança do Coliseu” (Globo + setores antinacionais da burocracia estatal) e o bloco conservador da política travarão uma disputa surda por este primeiro desfecho. E continuarão a medir forças após o fatídico dia. Vão colocar em curso uma máquina de levantamento de números para tentar provar quem está com a razão. Prender Lula e/ou inabilitá-lo, correndo o risco de transformá-lo num mártir capaz de eleger qualquer um ou denotá-lo fragilizado nas urnas num eventual segundo turno?
5 – O diabo salva? Se os radicais vencerem, o mais provável é que Lula seja preso. Se a tese de enfrentá-lo e derrotá-lo nas urnas for vitoriosa, como operarão esta saída por dentro do aparato estatal, como autorizarão o registro da candidatura de Lula? Se este momento chegar, entrará em cena novamente um dos personagens mais controversos da república. Esculhambado por parte da esquerda, único a ter coragem de peitar a Lava Jato, Gilmar Mendes é a ponte existente entre o mundo político e o poder judiciário com a coragem que o momento exigirá. Com o TSE presidido por Fux, não existirá outro personagem capaz de colocar sua caneta numa “liminar-acordo” que viabilize Lula nas eleições.
6 – Como matar o mito? Não se mata um mito pela força. Getúlio, Mandela, Luther King e tantos outros se tornaram imortais. O “Cara” não virou “O Cara” por acaso. Para destruir o mito é preciso roubar-lhe a alma. Desconstruir sua imagem encontrando flancos na sua existência. Até aqui não lograram êxito nesta missão. Uma decisão errada, desequilibrada, pode significar a santificação do mito e uma derrota eleitoral histórica e humilhante. Qual o melhor caminho para dar conseqüência ao golpe? Esta é a dúvida que atormenta.
7- Quem será o próximo? Lula organiza e desorganiza o quadro político brasileiro. Com ele no pleito teremos Lula e o Anti-Lula. Sem ele, entraremos num cenário de grande imprevisibilidade, numa viagem em mar revolto para um destino desconhecido. Para a esquerda brasileira, no momento, não há outro caminho. Defender o direito de Lula ser candidato é a tarefa histórica que se impõe.
Com Dirceu condenado e preso novamente, Dilma deposta e Lula inabilitado e/ou preso, qual será o limite da reação? Estará consagrado o modus operandis do fechamento com uma fachada democrática. Uma “democracia sem povo.” Quem será o próximo na lista da reação? Não é hora para brincadeiras ou bravatas. O futuro da democracia brasileira está em jogo.
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