Edson Sardinha e Daniela Lima
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), está preocupado com a crise econômica mundial e seus desdobramentos políticos no Brasil. Sarney discutiu o assunto na noite da última quarta-feira (25), em encontro reservado com parlamentares e representantes de instituições financeiras, entre os quais, o presidente da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Fábio Coletti Barbosa.
Em público, os presentes negam ter participado da reunião. Mas, com a condição de não terem seus nomes divulgados, participantes admitiram que as conversas se estenderam das 22 horas até a meia-noite, durante jantar promovido em área restrita de um hotel de Brasília localizado às margens do Lago Paranoá.
Sarney ouviu muito e falou pouco. Em uma de suas raras intervenções, o peemedebista arrancou risos dos convidados ao concluir uma análise iniciada por um deputado mineiro sobre o papel do PMDB na sucessão presidencial de 2010. “Qualquer que seja o resultado, o PMDB vai ganhar a eleição”, emendou o presidente do Senado.
O senador complementou uma avaliação feita por um colega de partido de que o PMDB havia saído fortalecido das eleições municipais do ano passado, mas que precisava se movimentar para não perder a condição de protagonista da eleição presidencial.
Em sua exposição, o deputado afirmou que o PMDB é hoje um ponto de encontro entre o PSDB e o PT. “Se Serra ganhar, terá o apoio do PMDB. Se a Dilma vencer, terá o apoio do PMDB”, declarou o mineiro, ao citar os principais pré-candidatos dos dois partidos.
A avaliação entre os participantes do encontro é de que o governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), tem chances desprezíveis de ser o candidato tucano à sucessão de Lula e que, apesar das investidas do PMDB, não deixará mais o PSDB. Sarney, que em fevereiro prometeu apoio a Aécio, evitou declarar preferência por qualquer candidato à sucessão de Lula.
Participantes do encontro ventilaram o nome do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci como potencial candidato do PT caso a candidatura da ministra da Casa Civil não decole. A observação foi sucedida por um porém: as denúncias que derrubaram Palocci da Fazenda voltariam à tona e ameaçariam a eventual candidatura do hoje deputado paulista.
Sarney manifestou o desejo do Senado em ajudar o país a superar a crise econômica e concordou com a opinião dos executivos de instituições financeiras presentes de que a turbulência internacional chegou ao país antes do que se previa. A expectativa, segundo eles, era de que a crise se intensificaria no Brasil apenas no meio do ano.
Apesar de reclamarem do impacto da crise na redução do crédito e no desaparecimento de empregos, os participantes do encontro adotaram um discurso cauteloso, sem alarmismo, numa demonstração de confiança nas medidas adotadas recentemente pelo governo Lula.
Um dos principais interlocutores da reunião foi o presidente da Febraban, Fábio Barbosa. Ele citou a queda no índice do spread bancário como sinal de que a economia brasileira começa a se recuperar da crise. Na avaliação dele, a tendência de queda deve se estender pelos próximos meses. A taxa mostra a diferença entre o valor dos juros que os bancos pagam para captar dinheiro e os juros cobrados por eles ao fazer empréstimos.
Dados divulgados recentemente pelo Banco Central (BC) mostram que o spread bancário caiu de 30,5 pontos percentuais em janeiro para 29,7 pontos em fevereiro. O valor calculado na primeira quinzena de março foi ainda menor: 29 pontos porcentuais.
Durante o encontro reservado, Fábio antecipou a Sarney o que viria a dizer no dia seguinte na Comissão de Acompanhamento da Crise Financeira, do Senado. Questionado pelos senadores, o presidente da Febraban admitiu que o spread bancário brasileiro ainda é alto.
Fábio tentou justificar a taxa dizendo que diversos fatores a influenciam. Entre eles, os índices de inadimplência em créditos concedidos por instituições financeiras no Brasil. Os números registrados em janeiro deste ano são os mais altos desde maio de 2002, no caso de pessoas físicas: 8,3%, ante a marca anterior de 8,4%.
Presidente da Febraban desde 2007, Fábio Coletti Barbosa integra o Conselho de Desenvolvimento Econômico Social da Presidência da República, colegiado composto por representantes da sociedade civil e do governo. Também é membro do Conselho de Administração da Petrobras.
O paulista foi presidente do Banco Real, cargo que continuou a exerceu mesmo após a compra da instituição brasileira pelo holandês ABN Amro Bank. Desde o ano passado, Fábio preside o Grupo Santander no Brasil.
O presidente da Febraban disse que o país vive um período de “democratização do crédito” e que, se o rendimento obtido pelas instituições financeiras com o pagamento de taxas é alto, é porque o número de correntistas no Brasil também cresceu. Passou de 90 milhões para 120 milhões nos últimos dois anos.
Fábio declarou aos senadores que quatro fatores favorecem a recuperação da economia brasileira. “O primeiro é que ainda temos espaço para trabalhar a redução dos juros. Podemos também trabalhar com os depósitos compulsórios. Temos ainda reservas e o BNDES tem um bom orçamento para garantir investimentos”, avaliou.
Como era esperado, o presidente da Febraban defendeu o setor quando foi questionado sobre a alta rentabilidade alcançada pelos bancos nos últimos anos. O senador Roberto Cavalcanti (PRB-PB) chegou a citar números. “Entre 1995 e 2007 houve um crescimento de 468% da lucratividade dos bancos”, disse. Fábio tentou minimizar a cifra em sua resposta. “Essa informação [de que o setor financeiro é o mais rentável do país] não se respalda em fatos. Mas acredito que não vamos ter um país grande se não tivermos bancos grandes”, ressaltou.
A Comissão de Acompanhamento da Crise Financeira foi uma das promessas de campanha de Sarney à presidência do Senado. Na instalação do colegiado, no último dia 3, o peemedebista defendeu que os senadores extraiam dali subsídios para melhorar a atuação da Casa nas áreas de finanças e economia.
O presidente da comissão, Francisco Dornelles (PP-RJ), terá, ao todo, 45 dias para investigar as causas da crise econômico-financeira mundial, analisar as medidas já adotadas pelo Executivo e propor iniciativas para atenuar os efeitos da turbulência sobre o emprego e a produção no país. Ao assumir a presidência, Dornelles adiantou que um de seus principais desafios seria entender os motivos de o país manter taxas de juros e spread bancários tão elevadas.
A presença de deputados na reunião promovida por Sarney justifica-se. A Câmara instalou na semana passada uma comissão de acompanhamento da crise. O colegiado terá 50 dias, a contar do último dia 25, para apontar alternativas para amenizar os efeitos da crise em cinco áreas temáticas: agricultura; serviços e empregos; indústria; comércio, e sistema financeiro e mercado. Essa última será relatada por Antonio Palocci.
Deixe um comentário