Hage: Navalha não pode ficar no "espasmo da indignação" (José Cruz/ABr)
Eduardo Militão e Sylvio Costa
A Controladoria Geral da União (CGU) está realizando um extenso mapeamento das obras executadas pela Construtora Gautama Ltda. e suas empresas coligadas em empreendimentos que usaram recursos federais, informou o ministro Jorge Hage ao Congresso em Foco. O trabalho, prevê ele, deve demorar duas semanas para ser concluído.
Jorge Hage adiantou que foram confirmadas irregularidades, até agora, em diversos convênios com estados e municípios e em uma obra federal, contratada pela Infraero: a do aeroporto de Macapá. Por decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), os pagamentos da obra estão suspensos depois que foram constatados indícios de sobrepreço.
No início do ano, a CGU começou a prestar sigilosamente à Polícia Federal um trabalho de apoio até 17 de maio, data em que a Operação Navalha prendeu 46 pessoas, a CGU colaborou sigilosamente com a Polícia Federal para esclarecer as relações que ligam autoridades federais, estaduais e municipais – além de lobistas, servidores públicos e outros personagens – aos negócios irregulares da Gautama.
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Essa integração entre a PF, a CGU e outras instituições, como o Tribunal de Contas da União (TCU), o Ministério Público e o próprio Judiciário, é apontada por Jorge Hage como uma das razões pelas quais o Brasil se vê às voltas com um “fato novo”: uma operação que “conseguiu colher provas concretas e denunciar com nome e sobrenome os envolvidos” em atos ilícitos praticados por empreiteiras. Mas o ministro acrescenta que a Gautama está longe de ser um caso único entre as grandes empresas beneficiadas por contratos públicos: “Não temos nenhuma dúvida de que esse mesmo tipo de esquema é praticado por outras empreiteiras”.
Sua esperança é que o episódio contribua para trazer outras mudanças positivas. “Espero que, desta vez, não se trate apenas de mais um espasmo de indignação, que periodicamente acontece no país e depois todo mundo esquece”, afirmou. É nesse sentido que o controlador-geral defende a adoção de diversas medidas que poderiam contribuir para reduzir a corrupção no país. Entre elas, destaca alterações no Código de Processo Penal, de modo a evitar que “bons advogados” protelem as ações criminais contra seus clientes até os réus serem salvos pelo gongo da prescrição.
Baiano, com 69 anos de idade completados no último dia 5 de maio, Jorge Hage Sobrinho tem uma longa trajetória pública. Bacharel em Direito, foi professor da Universidade Federal da Bahia (de 1967 a 1991), prefeito nomeado de Salvador (1975/1977), deputado estadual (1983/1987) e deputado federal constituinte (1987/1991), eleito pelo PMDB. Deixou a política para se dedicar à magistratura. Foi juiz de direito, no Distrito Federal, entre 1991 e 2001, quando se aposentou.
Mestre em Administração Pública e em Direito Público, foi levado para a CGU, na condição de secretário executivo, pelo também baiano Waldir Pires, em 2003. Tornou-se ministro em junho de 2006, depois que seu antecessor no cargo assumiu o Ministério da Defesa.
Leia os principais trechos da entrevista:
Parceria com a PF
Num primeiro momento, a Controladoria trabalhou junto com a polícia na fase pré-operacional [antes das prisões da Operação Navalha]. A polícia conseguiu autorização judicial para a extensão do sigilo para a CGU. A partir daí, nós passamos a receber da polícia as escutas. A partir dos trechos de escutas que se referiam a contratos, a convênios, a pagamentos, a desembolsos, íamos rastreando para saber se realmente existia aquele contrato, se existia uma obra naquele estado, naquele município, se houve desembolso naquela época referida nas conversas. Exatamente para estabelecer veracidade ou confirmar os indícios das gravações. Em relação a cada um daqueles eventos, era elaborado um relatório pela Controladoria e passado para a autoridade policial, indicando se existia realmente um convênio, qual era a origem dos recursos, se houve desembolso. Associamos, então, os nomes das pessoas mencionadas. Se efetivamente eram pessoas com determinada função, no caso de funcionários públicos no Poder Executivo. Se tinha probabilidade de ser verdadeira aquela participação daquele agente público ou daquele ator naquele processo mencionado. Esse foi o primeiro trabalho.
Mapeamento de obras
Agora, estamos com inúmeras atividades paralelas. Numa delas, estamos identificando outras obras, além daquelas identificadas a partir da operação em si, das escutas, dos documentos apreendidos e dos depoimentos dos que foram presos. Vamos dividir em três camadas. Contratos da administração federal mais autarquias e mais fundações são uma primeira camada, já identificada – ministérios, praticamente. Estatais que não usam o Siafi [sistema que registra os gastos do governo], outra. Petrobras e Infraero já identificamos que têm contrato. E a terceira camada, com os convênios com estados e municípios e contratos de repasse. Contratos de repasse são outra forma de transferência de recursos, feita através da Caixa, como instrumento de transferência e de acompanhamento desse dinheiro para aplicação por estados e municípios. No convênio, o ministério é quem celebra. Não se sabe, de forma direta, quantos contratos há com a Gautama através dessa ponta. Por isso, é trabalhoso. No caso dos contratos de repasse, a nossa expectativa é que seja menos difícil porque a própria Caixa tem a obrigação de fazer a fiscalização e o acompanhamento. Então, digamos, a coisa não fica tão fora do conhecimento de um órgão federal, como no caso do convênio. Nos contratos de repasse, como se sabe, é feita a liberação do dinheiro após cada medição, sempre a posteriori. Nós sabemos que a Caixa não tem pessoal para fiscalizar tudo diretamente. Sabemos que ela terceiriza a fiscalização em alguns casos, o que não é bom. Então, também não é tão fácil, mas não deve ser tão demorado como dos convênios propriamente ditos.
Contratos com os ministérios
São R$ 103 milhões de desembolso e R
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