Arthur Koblitz *
O Senado deve votar nesta terça-feira (5) a MP 777/17, que definirá o futuro da taxa de juros de longo prazo praticada pelo BNDES. Abordam-se a seguir algumas questões que não foram respondidas pelos defensores da reforma. Da contemplação da lista abaixo, espera-se que fique evidente a natureza aventureira dessa medida.
- A TLP significa a volta para o modelo de taxa de juros do BNDES indexada à inflação que prevaleceu até o Plano Real, quando se criou a TJLP. Um de seus propósitos era reduzir o grau de indexação da economia. Essa deixou de ser uma questão importante?
- A justificativa de maior destaque para aprovação da MP é a do custo fiscal da TJLP-BNDES. A análise exclui qualquer consideração de seus benefícios fiscais. Apenas considerando o que o BNDES pagou de impostos e dividendos para a União nos últimos 10 anos, atinge-se a cifra de R$ 153 bilhões a preços de 2016, isso corresponde a mais da metade do custo fiscal estimado pelo governo nesse mesmo período. Se somarmos a isso o impacto do apoio do BNDES sobre o setor privado e o quanto isso gera de novas receitas fiscais, é fácil mostrar que o custo fiscal líquido do sistema atual é nulo ou negativo. Onde está o argumento fiscal em defesa dessa MP? Sem ele, onde está sua urgência e relevância?
- A TLP pretende substituir a fonte de concessão de renda do BNDES, dada pelo diferencial entre TJLP e Selic, por alocações orçamentárias. Segundo os defensores da TLP isso seria mais transparente. Qual outro Banco de Desenvolvimento está sujeito a esse tipo de regra? Em termos de transparência, estamos aquém de que Banco de Desenvolvimento?
- O governo nega o simples fato de que indexar a taxa de juros de longo prazo à NTN-B aumenta sua volatilidade. Não obstante, o relator propôs, sem nenhuma motivação estabelecida em seu parecer, um mecanismo para atenuar a flutuação. Vamos aprovar uma MP sem considerar a questão de se a medida proposta resolve o problema, porque politicamente não interessa reconhecer que haverá um aumento da volatilidade?
- A MP traria “menor taxa de juros para todos”. Entretanto, do debate sobre a importância da eficácia da política monetária para explicar o patamar anomalamente alto da taxa de juros no Brasil é absolutamente inconclusivo. Segundo a insuspeita opinião de André Lara Rezende, “é incapaz de dar uma resposta convincente e definitiva para a questão”. De fato, a TJLP não tem nada a ver com o elevadíssimo patamar em que o Banco Central mantém a Selic e, portanto, sua extinção nenhum efeito trará para o propósito de reduzi-la.
- Nos 164 meses, de janeiro de 2004 a agosto de 2017, em 40 oportunidades houve um aumento da diferença entre TJLP e Selic. Desses, 34 ocorreram porque a Selic aumentou e a TJLP ficou constante. Quando a Selic aumenta, seus impactos são contrários ao investimento, tende-se a apreciar a taxa de câmbio, a represar o consumo. Aumentar a “renda” de quem investe pela diferença entre Selic e TJLP significa, nessas situações, apenas proteger o investimento. No contexto brasileiro, será danoso um mecanismo que permite essa proteção aos setores mais modernos da economia brasileira? O argumento se baseia em que essa proteção do investimento tem evitado que o combate à inflação de demanda seja mais eficaz. O investimento produtivo, assim como o consumo, é fonte de pressão sobre a capacidade produtiva existente. Se os juros sobem e o investimento não cai, menor o poder da política monetária. Mas o investimento tem um caráter dual: também é geração de nova capacidade produtiva. Do ponto de vista do combate à inflação, essa segunda função não deveria neutralizar a primeira?
Mesmo desconsiderando os argumentos acima, com o poder de determinar a taxa de longo prazo e a de curto, o atual arranjo institucional permite que a TJLP seja fixada no nível desejado pelas autoridades econômicas. Por que essas autoridades não fixam a TJLP no patamar que consideram adequado? Como pode estar sobre TJLP a responsabilidade pela falta de eficácia da política monetária?
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* É doutor em economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, é vice-presidente da Associação dos Funcionários do BNDES.