Reportagem publicada nesta terça-feira no site da ONG Contas Abertas (www.contasabertas.com.br) informa que apesar de já ter completado seis anos, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), criada para tornar os gastos públicos mais transparentes, está caindo no esquecimento de algumas prefeituras. Embora a lei obrigue os municípios brasileiros a prestarem contas anualmente ao governo federal, de 2000 para cá, o número de prefeituras inadimplentes quintuplicou.
Enquanto no ano de criação da lei, apenas 74 dos 5.500 municípios brasileiros deixaram de cumprir a determinação, este ano, 390 prefeitos ainda não prestaram contas ao Tesouro Nacional dos gastos referentes a 2005.
A matéria, assinada pela jornalista Mariana Braga, esclarece que o artigo 51 da LRF, Estados e Municípios são obrigados a encaminhar ao Poder Executivo, por meio da Caixa Econômica Federal, uma prestação de contas anual sobre o uso dos recursos públicos. O prazo de entrega termina em abril para as prefeituras e em maio para os governos estaduais. Essa regra alcança todos os entes estaduais e municipais, independente de receberem ou não transferências voluntárias do governo federal.
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Quem não cumpre as determinações da LRF fica impedido de receber transferências voluntárias da União para reformas, construções de estradas, segurança pública e modernização da máquina administrativa. Fica proibido também de contratar empréstimos até que a situação seja regularizada.
Apenas as transferências referentes às áreas de saúde, educação e assistência social não sofrem bloqueio, assim como as chamadas transferências obrigatórias, como os recursos do Fundo de Participação Municipal (FPM) e do Fundo de Participação Estadual (FPE).
Além da sanção prevista na LRF, pela Lei de Crimes Fiscais, o administrador público que não cumpre a regra estará sujeito ao pagamento de multa, inabilitação e detenção de três meses a três anos.
Apesar das normas serem claras, dois municípios parecem desconhecer a legislação. Cachoeira do Arari (PA) e Espírito Santo do Oeste (RN), hoje chamado de Paraú, nunca prestaram contas de seus gastos ao governo federal desde que a lei entrou em vigor, como consta no site do próprio Tesouro Nacional.
O secretário de administração da prefeitura de Cachoeira do Arari, Vítor César de Azevedo, atribui a inadimplência do município aos problemas de corrupção que atingiram a localidade nas últimas gestões. “Alguns dos antigos prefeitos estão respondendo à Justiça Eleitoral por denúncias de fraudes, o que acabou atrasando a prestação de contas”, justifica.
Azevedo, no entanto, não sabe explicar porque a documentação referente ao ano de 2005 que já compreende a atual gestão ainda não foi entregue. “Vou conversar com o prefeito para tomarmos uma providência o quanto antes”, garante. O secretário explica que apesar de estar em dívida com o Executivo desde a criação da lei, o município continua a receber recursos federais e nunca foi cobrado pelo Tesouro Nacional. O prefeito de Paraú, Francisco de Assis Nunes, não foi localizado.
O economista e autor do livro Lei de Responsabilidade Fiscal Comentada, Edson Ronaldo Nascimento, no entanto, garante que a fiscalização feita sobre os municípios que não cumprem a LRF é rigorosa. Segundo ele, os recursos que os prefeitos dizem continuar recebendo certamente são os de caráter obrigatório, que não podem ser bloqueados. “Além disso, todos que estão em dívida, certamente, já receberam notificação do Tribunal de Contas, mas estão empurrando com a barriga”, ressalta.
Para o economista, o crescente problema da não prestação de contas dos municípios, nos últimos anos, se deve em parte à falta de preparo ou de informação de algumas prefeituras. Por isso ele defende que o treinamento do quadro técnico municipal e a promoção do chamado “controle social” são pontos que ainda precisam ser aprimorados para garantir o pleno funcionamento da lei.
Assim como outros especialistas no assunto, Nascimento também é favorável à modificação na Constituição Federal no sentido de que os faltosos deixem de receber qualquer tipo de transferência federal. “Isso tornaria mais rígida a gestão pública no Brasil, sem contar que a transparência dos gastos seria maior”, argumenta.
Embora a LRF ainda não seja cumprida por todos os prefeitos, Nascimento explica que a lei já gerou uma série de benefícios para o país. “A situação fiscal de Estados e municípios no Brasil, assim como do próprio governo federal, vem melhorando desde a edição da LRF. O ajuste nas contas públicas em nosso país vem se realizando e isso acaba influenciando no próprio risco Brasil que, na última semana, chegou ao nível mais baixo desde a sua criação”, conclui.
Mais detalhes sobre a lei
Criada durante o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, a LRF foi motivo de orgulho para o governo tucano, por estabelecer normas para uma melhor gestão dos gastos públicos. O objetivo da lei é servir como um código de conduta para os administradores públicos que passaram a obedecer as normas e limites para administrar as finanças, prestando contas sobre quanto e como gastam os recursos da sociedade.
Além da prestação de contas, a LRF proíbe estados e municípios de contraírem dívidas nos últimos oito meses de mandato que não possam ser pagas no mesmo período. Também exige que as prefeituras e governos estaduais apliquem o montante mínimo constitucional em educação e limita o gasto com pessoal, que não pode ultrapassar 60% da receita corrente líquida.