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Veja a íntegra da entrevista:
Congresso em Foco – A proposta apresentada hoje pelo MCCE não prevê o financiamento público exclusivo de campanha. Por quê?
A proposta prevê o financiamento público de campanha e proíbe a doação empresarial. Em 2010, só 2% das doações vieram de pessoas físicas. Ainda assim, algumas delas foram bastante altas. A tradição de doação por pessoa física no Brasil é ínfima. Mas se retirarmos, de uma hora pra outra, a doação de pessoas jurídicas, e ficarmos só com o financiamento público, a gente condena as eleições a um fracasso. A gente tem de criar a cultura da doação cidadã. Acabar com o domínio pelo poder econômico.
Qual seria o limite que cada pessoa poderia doar por candidato?
R$ 700 seria o máximo de doação por pessoa. Um valor similar ao salário mínimo. Haverá financiamento público, combinado com o financiamento individual. Qualquer doação por empresa será considerada crime e terá diversas consequências administrativas, cíveis e penais. A empresa poderá ser condenada, por exemplo, a pagar multa severa e a ficar cinco anos sem poder contratar com o poder público. A empresa que diluir recursos entre cidadãos para abastecer candidatos também incorrerá em crime.
Como as entidades que compõem o movimento chegaram a esse formato de proposta?
Fizemos um trabalho de planejamento a partir de uma pergunta: que valores gostaríamos de ressaltar? Dois pontos foram consensuais entre o que a gente gostaria de propor e uma cultura que a gente precisa respeitar. Há necessidade de fortalecer os partidos como instância programática e garantir que permaneça nas mãos do eleitor a palavra final sobre o eleito. Isso afastou a ideia da lista fechada. Acreditamos que esse modelo permite ao eleitor conhecer o partido nas eleições proporcionais (para vereador e deputado).
Pela proposta, as eleições para vereador e deputado serão divididas em turno. Como funcionará isso na prática?
No primeiro turno, serão expressos os nomes dos que concorrerão, mas a campanha será centrada no partido. O voto será partidário. Um partido vai ter de se diferenciar do outro, vai ter de mostrar suas propostas, porque é mais avançado do que o outro. Vamos tentar contribuir para que haja uma cultura partidária mais evoluída, com grupos ideológicos.
De que maneira?
A proposta permite que o número de candidatos por partido seja correspondente ao número de vagas conquistadas pela legenda no primeiro turno. E não mais em função das vagas totais. Hoje uma coligação pode lançar até duas vezes o número de vagas que estão em disputa em todo o Parlamento. Pelo nosso modelo, o partido poderá lançar o dobro de candidatos em relação às vagas conquistadas.
Há uma estimativa de qual será a redução no número de candidatos?
Se essa regra tivesse sido aplicada em 2012, teríamos 73,5% menos candidatos que tivemos. Isso vai dar mais visibilidade aos concorrentes. As pessoas vão conhecê-los melhor. Com um número menor de candidatos, será possível ter campanha mais efetiva. Parece-me uma troca justa. Cairá drasticamente o custo das campanhas. Não haverá razão para gastar como hoje. A gente quer baratear, reduzir o número de candidatos, aumentando a visibilidade deles e permitindo que os eleitores conheçam suas características. No segundo turno, o voto será totalmente individual, eles concorrerão entre si para ver quem será titular. O candidato não vai beneficiar mais ninguém, só ele mesmo. Na prática, isso acaba com o efeito Tiririca, esse expediente de lançar pessoa com grande popularidade para eleger outros candidatos.
É importante que esses dois sistemas sejam casados. Não seria possível o financiamento exclusivamente público com o modelo atual. Encontramos, assim, uma forma de viabilizar a retirada das doações de empresas.
Como a proposta pretende estimular o debate político na sociedade?
Há ainda um terceiro viés importante do projeto, que é a liberdade de expressão. Hoje temos a internet, inclusive o jornalismo, e os cidadãos amordaçados por uma legislação com característica tutelar similar à de países ditatoriais. Somos proibidos de falar. Há casos absurdos como o de uma eleitora multada em R$ 5 mil pela Justiça Eleitoral por causa de um adesivo que fez dizendo quem ela gostaria de ver na Presidência. E a liberdade de expressão, como fica? Temos blogueiros devendo mais de R$ 1 milhão por conta de sanções impostas pela Justiça Eleitoral, que não deveria tutelar o comportamento do cidadão, mas o do candidato e dos partidos. Recentemente a Justiça determinou a retirada de uma coluna inteira do José Simão por que ele fez brincadeira com o nome de uma vereadora do interior de São Paulo. Não retiraram apenas a piada, mas toda a coluna dele do ar.
Mas como o projeto ataca isso na prática?
O projeto descriminaliza condutas, retira barreiras, dá liberdade plena para tratar de política em qualquer período. Desde que não seja paga. Políticos também serão livres para falar. Hoje temos candidaturas lançadas e vivemos na hipocrisia da proibição da propaganda antecipada. Interessa aos brasileiros conversar com quem quer ocupar cargo importante. As oposições e as minorias são quem mais perde quando se amordaça o debate político, porque quem está no poder tem mais condições de exposição.
A ideia é fortalecer os partidos políticos?
Os partidos estão desrespeitados como instâncias legítimas de cunho social. Estamos cumprindo um papel que deveria ser cumprido por eles. Se os partidos tivessem instâncias programáticas, a rejeição deles não seria tão grande. Ninguém está disposto a desistir da democracia. Achamos que este momento é emblemático para mostrar como os partidos perderam a sua importância como vetores do diálogo social.
Os partidos políticos foram excluídos dos protestos que se espalharam pelo país nas últimas semanas. Isso mostra a falência do atual modelo partidário?
Nas manifestações, sequer foi aceita a participação dos partidos. O movimento não tem bandeira autoritária. As pessoas querem é mais democracia. Querem ser mais representadas. Esse projeto dialoga com esse momento do país. Houve uma coincidência. Ele não foi feito para esse momento. Está sendo feito desde fevereiro por um grupo da OAB e outras entidades do movimento. É mais que uma coincidência, é uma sinergia.
Como será o processo de coleta de assinaturas?
Nas ruas e na internet. Vamos pleitear a validação dessas assinaturas virtuais, acrescentando o título de eleitor, porque é possível auditá-las.
É a primeira vez que um projeto de lei de iniciativa popular terá assinaturas virtuais reconhecidas. Há risco de contestação?
Isso é interessante, porque hoje o Congresso está recebendo assinaturas em meio físico, mas não tem como conferir a validade de todas as assinaturas. Foi assim na Ficha Limpa, quando apresentamos 1,6 milhão de assinaturas. Já que é para ter essa dúvida, vamos montar um sistema muito melhor, em que é possível auditar. Nossa meta é alcançar 1,5 milhão de assinaturas para entregá-las, no mais tardar, no início de agosto ao Congresso. Mas a meta é superar isso aí, porque temos um propósito ambicioso. Nosso sistema eleitoral é tão ruim que não podemos nos dar ao luxo de ter mais uma eleição nos moldes atuais. Será uma tragédia para a democracia elegermos mais um Congresso sob essas regras. Vamos correr com todos os meios possíveis para que essa proposta virei lei até 4 de outubro, a tempo de vigorar nas eleições de 2014.
Já houve alguma conversa com parlamentares, sempre resistentes à reforma política, sobre essa proposta?
Por enquanto, estamos conversando com a sociedade, não com parlamentares. Precisamos levar até eles a voz da sociedade de que algo tem de mudar. Pelo que a gente tem sentido, vai dar jogo. As pessoas não agüentam mais. A questão não é partidária. É um sistema de destruição de ideologia.
Como se dá essa destruição de ideologia?
Primeiro, porque o atual modelo força a corrida econômica pelo voto. Dos 513 deputados eleitos em 2010, 369 tiveram as candidaturas mais ricas. Os números demonstram que quem tem mais dinheiro ganha a eleição. Não há igualdade na disputa. Do ponto de vista eleitoral, essas candidaturas individuais, em número imenso, em que uns disputam contra os outros, sem identificação partidária, é máquina de destruição dos partidos. Os maiores adversários estão dentro das próprias legendas. Pelo modelo proposto, haverá disputa apenas entre um pequeno grupo dentro do partido.
O senhor teme que não haja tempo necessário para aprovar essa proposta até o começo de outubro para valer nas próximas eleições?
Não dá pra usar como desculpa a questão do tempo, porque tempo é questão de prioridade. A reforma política é a maior prioridade do país. Temos de derrubar esse jargão ultrapassado de que a reforma política é a mãe de todas as reformas. Isso é tão urgente, que não adianta repetir esse mantra. Está na hora de fazer.Não podemos aceitar mais uma eleição nesse modelo. Nossa mensagem é dirigida a todos os brasileiros: de todos, queremos que só dediquem alguns segundos para verem o que está escrito no nosso site e compartilhar. Isso vai ajudar a mudar o Brasil.