Às vésperas das eleições, o presidente norte-americano é envolvido em um escândalo sexual. Para desviar a atenção do escândalo, a conselheira do presidente recruta um especialista em situações de crise que decide “fabricar” uma guerra na Albânia, um pequeno país montanhoso da península Balcânica, no sudeste da Europa. Este é o enredo do filme “Mera Coincidência”, estrelado por Dustin Hoffman e Robert De Niro, que recebeu até indicações a prêmios no Oscar e no Globo de Ouro.
O filme que chegou ao Brasil em 1998 vai me permitir uma comparação com situações cada vez mais frequentes em nosso País, com o recorrente quadro de “notícias” diversionistas que se caracterizam como regulares, ora como fake news, ora como mero simulacro de falsas configurações.
O Brasil, como o resto do mundo, ver a proliferação de tais notícias mentirosas, promovidas em larga escala, e divulgadas por quem tem interesse em intensificar a construção de um universo paralelo, que nos embote a vista e nos tire a real possibilidade de perceber e debater, com consciência e profundidade, os temas realmente relevantes e de interesse da nossa gente. Não seria “mera coincidência” o nosso País “patrocinar” debates que não guardam obediência aos mais urgentes problemas da nação, como se verifica no tempo presente?
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Não seria “mera coincidência” um recorrente embate pseudo-ideológico que tenta estabelecer uma falsa dicotomia entre direita e esquerda, polarizando e buscando simplificar o debate político, esquecendo o grave quadro que o Brasil enfrenta com um cavalar déficit público, ancorado numa ineficiente e até irresponsável gestão fiscal, e sem nenhuma sinalização de política econômica que busque resolver o desesperador quadro de desemprego, de endividamento da família brasileira ou mesmo que sinalize como fundamentar políticas públicas na criação de oportunidades de trabalho para a nossa juventude.
Claro que mantemos a nossa capacidade de leitura do quadro estrutural e do quadro conjuntural do País. Mas o dispêndio de energia empregada para combater esses falsos debates, na sua maioria inócuos e irrelevantes, nos impede de trabalhar irmanados por um melhor quadro nacional. Plantaram a cizânia e seus derivados malefícios são, hoje, o mais pródigo produto das relações sociais brasileiras.
A intolerância transformou-se em commodities que alimentam uma fábrica de ódios, de diversos matizes e de uma única aplicação: servir para manter o nosso povo alheio ao debate em torno dos temas que realmente nos devem interessar e, por conseguinte, aniquilam a possibilidade de uma ação coletiva e irmanada na busca de soluções. A matéria-prima com que se burilava a “cordialidade” brasileira de há muito tempo tornou-se produto escasso, praticamente sumido das prateleiras da cidadania.
PublicidadeA cada um e a todos, cabe-nos estabelecer como meta fugir dessa ardilosa armadilha, implantada por quem não se interessa pela análise real dos problemas brasileiros, advindos de uma secular concentração de renda, de uma intocável estrutura social que reproduz, em maior ou menor escala, estruturas de princípios escravagistas que desafiam até a lei assinada no dia 13 de maio de 1888 pela princesa Isabel, denominada de Lei Áurea, e que decretava a libertação dos escravos.
Estamos às vésperas de uma eleição presidencial e alguns “escândalos” se multiplicam. Mas devemos propugnar por uma convocação cidadã em que não nos permitamos desviar milimetricamente o olhar do real quadro de nossos problemas nacionais.
Os problemas reais, repito, estão a desafiar nossa inteligência e nosso compromisso com o País. O Brasil não pode insistir na permanência de um ciclo de estagnação moral, com perdas recorrentes de auto-estima e de crença num futuro melhor.
Se conseguirmos vencer esta atual triste quadra, não será coincidência se nas próximas gerações, num curto espaço de tempo, o Brasil possa ser indicado a futuras premiações pela salutar construção de um sentimento de fraternidade e cidadania, com desenvolvimento social plantado em bases de humanismo verdadeiro.
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