A política não é uma ciência. Na democracia, as decisões são compartilhadas, há mecanismos de controle, freios e contrapesos. A complexidade é muito maior. Inúmeras variáveis atuam.
O aprendizado histórico vai conformando o que poderia ser uma “ciência política”, ferramenta que ergue uma série de conceitos, categorias de análise, diretrizes, tipologias e métodos de previsão. Platão, Maquiavel, Rousseau, Tocqueville, Marx, Karl Popper, Gramsci, Bobbio, e tantos outros, tentaram construir uma boa teoria sobre a dinâmica política e seus desdobramentos. Mas o jogo político é sempre surpreendente. Múltiplos vetores atuam e a resultante nem sempre obedece a padrões de racionalidade razoáveis. A demagogia e o populismo fazem parte do jogo democrático.
Uma das questões mais difíceis de lidar na arena política é a percepção dos limites orçamentários do Estado, a noção de conflito distributivo presente nas decisões sobre gastos e impostos, os constrangimentos gerados pela irresponsabilidade fiscal. Há um mito reinante de que o Estado tudo pode. Se assim fosse, tudo ficaria mais fácil. É corrente no meio político a expressão “vontade política” que seria uma varinha mágica que resolveria todos os problemas.
Nenhum governo pode acumular déficits permanentes e aumentar seu endividamento, acreditando que o céu é o limite.
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Aumentar gastos, impostos e dívida sem sustentabilidade tem consequências conhecidas. O grau de consciência sobre isto varia de país para país. Lendo a autobiografia de Obama, “Uma Terra Prometida”, percebe-se como foram longas e complexas as negociações do governo com o Congresso americano para aprovar o pacote de incentivos para enfrentar a crise de 2008 ou a ampliação de gastos para universalizar a saúde. Aqui, no Brasil, minha vivência indica que a preocupação com a responsabilidade fiscal cresceu desde o Plano Real, mas ainda é frágil. Ainda se acredita, em grande parte, que existam mágicas e que o dinheiro caí do céu.
O Brasil tem uma situação fiscal crítica. Embora, em 2021, as receitas tenham tido expressivo crescimento real graças à inflação, à recuperação do PIB, à elevação do preço das commodities e à variação do câmbio, o déficit estrutural não foi contornado e será crescente, os juros subiram e as despesas permanentes avançaram.
Mesmo diante deste quadro preocupante, o teto do gasto foi flexibilizado; há pressões estimuladas pelo próprio governo por aumentos salariais; tramita a emenda constitucional que desonera combustíveis e cria subsídios ao diesel para caminhoneiros e para o transporte urbano e amplia o vale gás, com impacto estimado em até 90 bilhões de reais por ano; fala-se na redução do IPI; existem dificuldades para votar a regulamentação do teto remuneratório, travamento das privatizações e expansão das emendas parlamentares. Sem entrar no mérito, porque várias medidas fazem sentido, o problema é que a conta não fecha. Não é possível para um país mergulhado em grave crise fiscal aumentar despesas, cortar impostos e não diminuir o tamanho do Estado.
As eleições presidenciais terão que enfrentar este dilema. À parte a demagogia e o populismo que afloram com vigor redobrado, temos que refazer o pacto fiscal, discutindo com seriedade a reforma tributária e do Estado, a reorganização do gasto público e um novo regime fiscal.
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