Se na coluna passada apresentei ao leitor um mix do pensamento político de vários autores, nesta faço um balanço e um retrospecto dos melhores momentos de meus textos publicados ao longo deste ano, algo a testemunhar que livre-pensar (e escrever) ainda é possível nesses tempos ruços. Nosso site como um todo, não por acaso Prêmio Esso deste ano, é a prova viva disso. Ei-los:
“Tentando botar ordem nas ideias e as ideias no lugar, é sempre um imenso prazer para esta escriba poder discorrer sobre os ‘colunistas com filtro’ ou ‘revolucionários a favor’ ou ‘transgressores de butique’ que escrevem ‘com luvas’ (obliterando a memória das mãos) e até “com pinças” (tal o nojo e o horror à realidade, como sempre pobre, suja e feia), responsáveis pela blindagem cultural, embotamento crítico e o embaçamento crônico onipresente na grande mídia, que impede o livre pensar do homem comum de modo a transformar precisamente essa realidade tão horrível e tão pedestre.” (Pensar Delivery – janeiro/2009)
“Certa vez Hannah Arendt escreveu que pensar é intrinsecamente uma atividade anti-social e subversiva, porque é um ato que ameaça todas as versões oficiais do direito e da ordem. Por isso, tanto nos sistemas totalitários quanto naquele em que prepondera o Pensamento Único, que impõem a ‘verdade única’, pensar livremente é crime. Mas como pensar, senão livremente?” (Revisitando Hanna Arendt, junho/2009)
“Hoje encaro Sampa como o outro lado dum armistício, um lixo a céu aberto, metafórica e literalmente, um Eldorado da Caretice, uma terra de ninguém (no man’s land) que preferencialmente privilegia a boçalidade, a breguice, o amadorismo, o infantilismo, a puerilidade, a gratuidade, a superficialidade, a fatuidade, a irrelevância, a inconsistência, a incoerência, a inexperiência (o estado, institucionalmente, se tornou um Imenso Jardim da Infância, Brincando de Casinha com a grana do contribuinte. Que ainda acha bom e pede bis), a pobreza alagoana de Ivete Sangalo, Faustão, as revistas Piauí e Cult, todos os malditos fast-foods, todas essas livrarias onde não se pode fumar porque lançar um livro tornou-se apenas a uma operação comercial (ou seja, privada), não mais uma festa, uma celebração, enfim, um acontecimento, simultaneamente aplaudido & vaiado, enfim, polemizado (posto que público). Porque agora tudo o que se lança, expõe, ganha prêmio, ocorre em bienais, simpósios, jornadas, festivais, são ‘desacontecimentos’, elementos que são a cara duma falsa ‘elite’ emergente, ignorante, perversa, canalha, covarde, apoteoticamente careta. Inexistente. Claro. ‘Desacontecimentos’ se destinam a ‘despessoas’. É elementar. Voltando à política: nos sete anos de governo Lula, o PSDB paulista abraçou um projeto de poder descaradamente autoritário. Um modelo que só tem espaço para crescer pelo negativo, seja praticando uma “oposição” hipócrita, farisaica e pseudomoralista, insuflando e difundindo o medo generalizado entre a população, através do PIG way of life, que cobre praticamente qualquer assunto. Qualquer um MESMO.” (A sociedade vencida, agosto/2009).
“E essa mediocrização – resultado dum contínuo e persistente embotamento de ideias aliado ao debate de irrelevâncias – é simultânea a um processo de radicalização que não deixa espaço para diferenças, inibe o diálogo inteligente, quando não o extingue por completo. Radicalização que faz a defesa ideológica do preconceito e do privilégio e cujo objetivo é a normalização do preconceito e do privilégio.” (Pós-mediocridade, julho/2009)
“Daqui para frente, preocupado acima de tudo com seu desenvolvimento pessoal imediato, o neopequenoburguês fofo e libertário rejeitará toda perspectiva de autoemancipação coletiva, que ele enxergará como uma ameaça ‘contra a democracia e o Estado de direito’. Limitada ao modo de vida concebido superficialmente como ‘estilo de vida’, a ‘não-conformidade’ não tem mais razão de investir contra os padrões vigentes, uma vez que sua ‘transgressão’ individual, institucionalizada, subvencionada e mercantilizada participa orgulhosamente da renovação da dominação capitalista. Em contrapartida, agora que contam com a aprovação geral, os governantes podem se dar ao luxo – e o caso do governador Serra é um magnífico exemplo – de reprimir toda forma de luta, comportamento ou palavra que represente um obstáculo para essa dominação.” (Pensar Delivery – janeiro/2009)
“Mas esta é a marca registrada do nosso subcapitalismo desigual e combinado – que combina a iniquidade do atraso com a truculência do progresso. Sempre buscando representar o irrepresentável: a burguesia nacional que já não manda; o capital financeiro, que é o obstáculo ao desenvolvimento pois já se desligou de qualquer representação de classe, e cujos interesses promovem a exclusão – eis a contribuição genuinamente brasileira à práxis política global. A união ideal do Inútil ao Desagradável: estamos exportando entreguismo de ponta! O eterno gigante bobo adormecido com seu chocalho multinacional. Nosso sub-horizonte eleitoral ‘avança’ em ‘marcha a ré para trás’, sinalizando, em 2010, com o que nos espera se ocorrer o retorno ao poder ‘desses caras que não têm mais o que fazer’ (Patriotismo & Entreguismo: A Marca Registrada da Elite Brasileira, maio/2009)
“Se a Literatura é a empresa de conquista verbal da realidade, segundo Cortázar, o fato é que na raiz da identidade de povos altamente desenvolvidos está um conjunto de textos e autores notáveis. Povos e países – e ninguém mais que os anglo-americanos – são ciosíssimos de seus escritores e pensadores. A hegemonia ou dominação se dá pela imposição de uma ideologia cujo veículo é a linguagem discursiva, escrita e falada na língua do dominador.” (Palavra & Poder, fevereiro/2009)
“Afinal não sou rica, nem famosa e nem pilantra como Jacqueline Onassis. Tampouco grande dama como dona Raquel de Queiroz, de fardão e tudo. Apenas uma escritora em processo que já se expôs o suficiente e por várias Grandes Damas e Variadíssimas Grandes Vaconas: aquela que lava todas as calcinhas do mundo.” (Todas as calcinhas, julho/2009)
E há mais, há muito mais, mas acabou meu espaço. Assim, um grande 2010 para todos!
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